Mar 31

grandes parangonas sobre a reforma do Estado

Espreito os jornais e reparo nas grandes parangonas sobre a reforma do Estado, mas preciso de ir ao portal do Governo para sair da barragem de fogo da opinião e aceder ao conhecimento da coisa emitida.  Noto que a primeira das boas intenções, a extinção de treze distritos, não passou do tinteiro, repetindo-se, no ano de 2006, o que acontecera em Ditadura Nacional pré-salazarenta , com a boa intenção de criação dasprovíncias, assente no estudo de Amorim Girão, conforme se pode ler no belo documento da época, intitulado “Reforma Administrativa”, de que o PRACE da democracia é sucessor.  O Estado-Emprego sempre temeu a desertificação de inúmeras cidades do interior que são sede de distrito. E o governo do Marquês de Pombal, de Afonso Costa e dos netos procura manter as suas extensões decretinas locais. A ideia que, logo com o primeiro parlamento eleito do liberalismo do pós-guerra civil, foi proposta por António Luís de Seabra, o Visconde que também vai ser autor do Código Civil de 1867, e, depois posta em prática pelo ministro Rodrigo da Fonseca, o célebre raposa, ainda antes do setembrismo, é um fantasma que marca os homens práticos da governança: sem distrito não há pais oficial que controle o país das realidades, para usar termos que muitos pensam de Charles Maurras, mas que, bem antes, foram usados pelo nosso Alexandre Herculano, quando falava da centralização como o vício que o demoliberalismo manteve do absolutismo.  O Estado a que chegámos continua a ser grande demais para os pequenos problemas da vida e pequeno demais para os grandes desafios do nosso tempo, como apetece parafrasear, na clássica observação de Daniel Bell. Cá por mim, preferia Mouzinho da Silveira, contra o qual se ergueram os distritos, para que pudesse implantar-se o devorismo e a metodologia da barganha de José da Silva Carvalho. Ainda ontem, num colóquio sobre a crise nacional e o desemprego dos jovens, realizado no ISCSP, onde tive, como parceiros, João César das Neves e António Filipe, ouvi o primeiro, com o habitual brilhantismo, apresentar algumas ideias que o PRACE não poderia absorver: que o Estado foi capturado pelos interesses que deveria regular, dado termos voltado aos velhos vícios corporativos; que a economia portuguesa está a produzir emprego, mas que os os portugueses não querem esses empregos; que continuamos a viver acima das nossas posses; mas que há uma boa notícia: as pessoas estão com medo e passámos para as crises típicas dos países ricos. Tal como aprendi, do meu antigo aluno, António Filipe, uma destacada voz tribunícia do PCP, a verdade do desemprego e a realidade da falta de justiça social e das flagrantes ausências de responsabilidade social de certos empresários devoristas. Por isso também denunciei, na senda de Mounier, que os problemas económicos só podem ser resolvidos com medidas económicas, mas não apenas com medidas económicas, pelo que só o recurso a factores de mobilização nacional, capazes de compreenderem que somos uns “sonhadores activos”, onde, para além dos planos tecnológicos e dos métodos tecnocráticos, importaria um plano nacional de criatividade e de educação para a responsabilidade individual e comunitária, que garantisse o nosso direito à felicidade como pessoas livres, de acordo com uma certa ideia de Portugal e do seu papel no mundo. Não me parece que o PRACE queira ir ao tal fundo da questão que tem a ver com a reconciliação do Povo com o Estado, através de um plano global de reactivação da cidadania contra o indiferentismo e a corrupção. Falta-lhe muito de ideias quanto a Portugal e a própria democracia, dado que o modelo, empacotado em fórmulas de engenharia conceitual assexuada, tanto poderia servir para a Patagónia como para um qualquer país em modernização autoritária, visando transformar uma qualquer Ruténia numa nova Singapura. Ao estilo do paper falta-lhe muito do aqui e agora das circunstâncias e outro tanto do bicho-homem movido a sonhos.

Mar 31

PRACE: falta-lhe muito do aqui e agora das circunstâncias e outro tanto do bicho-homem movido a sonhos

Ainda se desprendem os primeiros farrapos da madrugada, com a passarada em primavera por entre os primeiros rebentos e flores das árvores da vizinhança, quando, abrindo a agenda, reparo em duas efemérides do dia de hoje. Que em 1596 morria Descartes e que em 1889 era construída a Torre Eiffel, que je pense, donc je suis e que La France c’est Descartes e Paris, a torre de aço. Espreito os jornais e reparo nas grandes parangonas sobre a reforma do Estado, mas preciso de ir ao portal do Governo para sair da barragem de fogo da opinião e aceder ao conhecimento da coisa emitida.

Noto que a primeira das boas intenções, a extinção de treze distritos, não passou do tinteiro, repetindo-se, no ano de 2006, o que acontecera em Ditadura Nacional pré-salazarenta, com a boa intenção de criação das províncias, assente no estudo de Amorim Girão, conforme se pode ler no belo documento da época, intitulado “Reforma Administrativa”, de que o PRACE da democracia é sucessor.

O Estado-Emprego sempre temeu a desertificação de inúmeras cidades do interior que são sede de distrito. E o governo do Marquês de Pombal, de Afonso Costa e dos netos procura manter as suas extensões decretinas locais. A ideia que, logo com o primeiro parlamento eleito do liberalismo do pós-guerra civil, foi proposta por António Luís de Seabra, o Visconde que também vai ser autor do Código Civil de 1867, e, depois posta em prática pelo ministro Rodrigo da Fonseca, o célebre raposa, ainda antes do setembrismo, é um fantasma que marca os homens práticos da governança: sem distrito não há pais oficial que controle o país das realidades, para usar termos que muitos pensam de Charles Maurras, mas que, bem antes, foram usados pelo nosso Alexandre Herculano, quando falava da centralização como o vício que o demoliberalismo manteve do absolutismo.

O Estado a que chegámos continua a ser grande demais para os pequenos problemas da vida e pequeno demais para os grandes desafios do nosso tempo, como apetece parafrasear, na clássica observação de Daniel Bell. O PRACE parece tecnicamente escorreito e a vontade de José Sócrates, António Costa e Teixeira dos Santos um patriótico esforço de quem não teme usar os poderes que tem para o bem comum e a ideologia socialista-democrática ou social-democrata, conservadora demais para o momento de encruzilhada em que vivemos, segundo a minha perspectiva liberal. Cá por mim, preferia Mouzinho da Silveira, contra o qual se ergueram os distritos, para que pudesse implantar-se o devorismo e a metodologia da barganha de José da Silva Carvalho.

Ainda ontem, num colóquio sobre a crise nacional e o desemprego dos jovens, realizado no ISCSP, onde tive, como parceiros, João César das Neves e António Filipe, ouvi o primeiro, com o habitual brilhantismo, apresentar algumas ideias que o PRACE não poderia absorver: que o Estado foi capturado pelos interesses que deveria regular, dado termos voltado aos velhos vícios corporativos; que a economia portuguesa está a produzir emprego, mas que os os portugueses não querem esses empregos; que continuamos a viver acima das nossas posses; mas que há uma boa notícia: as pessoas estão com medo e passámos para as crises típicas dos países ricos.

Tal como aprendi, do meu antigo aluno, António Filipe, uma destacada voz tribunícia do PCP, a verdade do desemprego e a realidade da falta de justiça social e das flagrantes ausências de responsabilidade social de certos empresários devoristas. Por isso também denunciei, na senda de Mounier, que os problemas económicos só podem ser resolvidos com medidas económicas, mas não apenas com medidas económicas, pelo que só o recurso a factores de mobilização nacional, capazes de compreenderem que somos uns “sonhadores activos”, onde, para além dos planos tecnológicos e dos métodos tecnocráticos, importaria um plano nacional de criatividade e de educação para a responsabilidade individual e comunitária, que garantisse o nosso direito à felicidade como pessoas livres, de acordo com uma certa ideia de Portugal e do seu papel no mundo.

Não me parece que o PRACE queira ir ao tal fundo da questão que tem a ver com a reconciliação do Povo com o Estado, através de um plano global de reactivação da cidadania contra o indiferentismo e a corrupção. Falta-lhe muito de ideias quanto a Portugal e a própria democracia, dado que o modelo, empacotado em fórmulas de engenharia conceitual assexuada, tanto poderia servir para a Patagónia como para um qualquer país em modernização autoritária, visando transformar uma qualquer Ruténia numa nova Singapura. Ao estilo do paper falta-lhe muito do aqui e agora das circunstâncias e outro tanto do bicho-homem movido a sonhos. Pode, por isso, sossobrar, mesmo que o “action man” Sócrates consiga, nisso, conciliar-se em lealdade com o “action man” Cavaco.

Mar 30

Sidónio, República Velha, saudades de outro Gago que era Coutinho, FCT e burrocracias da burocracia

A manhã se vai levantando, espreito as efemérides da agenda, fico a saber que Reagan foi neste dia baleado em Washington (1981), reparo que em pleno sidonismo foi fundado um novo partido, o Partido Nacional Republicano, que ia de Egas Moniz a Machado Santos, mas que ficou dependente de um homem e logo de uma bala sem ser perdida ou de uma constipação mal tratada. Noto também que um ano depois já em pós-sidonismo, depois da República Nova se ter extinto, regressava-se À República Velha, com o governo de Domingos Pereira, neste mesmo dia, o tal gabinete que, para resolver a crise do pós-guerra fez emitir o mais gordo “Diário do Governo” da história do país, com milhentos decretos nomeando milhentos funcionários que mostraram fidelidade ao regime, antes de Sócrates, o tal que continua República Velha, anunciar hoje o seu PRACE que vai reavaliar 120 serviços e 75 000 funcionários.

Vale-nos que, em plena República Velha, neste mesmo dia de 1922, com subsídio do então ministério da ciência um tal Gago que era Coutinho e um tal Sacadura que era Cabral ousaram voltar a dar-nos sonho, iniciando a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, que é sítio para onde deveríamos voltar a navegar, com muita ciência, não apenas de fotocópia importada, mas também se invenção. Jugo que o Gago de então não teve que aceder ao “site” da FCT nem que ouvir os discursos do Heitor, o parecer prévio do Reitor Primaz ou os preconceitos ideológicos dos que co-escreveram livros com o Heitor. Tinha a tal mais valia do que sabia criar e sabia que o sonho comandava a vida. E não dependia dos despachos arbitrários e decretinos dos políticos que acedem ao trono do científico para poderem decretar quem não é científico entre os pares “out of area”, mas dependentes da superburocracia dos avaliadores, avaliólogos, palradores e sentenciadores que confundem opinião com conhecimento e ideologia da vindicta com metodologia, só porque têm cara de Professor Pardal e ar de lente da velha Coimbra que já não há e que foi meu berço de vida e escola, mesmo que penas venham de Campo de Ourique.

Por mim que só sei que nada sei, apenas confirmo que ontem durante horas, para poder dizer que era orientador de uma candidata a bolseira perdi horas a ter que meter no tal “site” da afundação dados que obrigatoriamente o mesmo Estado tem, pelos “curricula” apresentados em provas públicas de doutoramento, associado, agregado, catedrático e relatórios quinquenais obrigatoriamente entregues em CDRom e tudo ao mesmo senhor Estado dito simplex, mas que ainda não sabe o que é um “link” ou um “copy/paste”. Curiosamente, a minha ficha já lá estava, apenas com o número incompleto do meu BI, quando me pediram para participar num outro projecto que tinha adequadas cunhas do presidente da FCT e de outros hierarcas do regime. Para uns, umas simples linhas, para os enteados, uma fila lentíssima de pequenos dados, todos já disponíveis noutras gavetas do mesmo estadão. Viva o simplex desta otomana administração de espertos, onde manda o Senhor Ninguém de uma burrocracia que diz ser contra a burocracia.

Claro que tentei dizer ao tal “site” o que aqui estou dizendo, com os nomes todos, questionando se poderia enviar o CDRom com os tais dados que tenho de escrever, dezenas de vezes por ano, por cada passo que dou, mas o tal “site” é tão estúpido que rejeitava sempre este simples grito dum pobre súbdito do “simplex”. Mas se não cumprisse, no prazo indicado, os ditames destes formulários, a minha orientanda sofria as consequências e tive de sofrer, das tripas, coração, contendo-me para não usar do curto-circuito da cunha. Aliás, da última vez que tive de estar presente perante peritos estrangeiros, para defender um projecto, reparei que eu era o único entre várias candidaturas apresentadas.

Ao meu lado, estava outro projecto dirigido por um deputado aposentado que nem sequer pôs os pés nessa prova e obteve logo tudo o que pedia, como o podem demonstrar as belíssimas fotografias de turismo científico que ainda hoje estão expostas no gabinete dos variados funcionários administrativos que os acompanharam a longínquas paragens de pesquisa, com sol e palmeiras. Que venha o simplex, rapidamente e em força. Para que historiadores medievais e banqueiros aposentados não tenham que dar opiniões científicas rejeitadoras de projectos de geoliteracia apresentados por catedráticos de geoliteracia só porque não seguiam os ditamos do catedrático doutor em corredores do poder que foi catedrático quase vinte anos antes de se doutorar!

Mar 29

Paris. Mariana, bandalhos, bárbaros e francos

Repórteres televisivos lusitanos, que ainda há semanas falavam no regresso do Maio 68, qualificam, hoje, certos desordeiros que aproveitam as manifestações de Paris como vândalos, eles que são descendentes de norte-africanos e centro-africanos que os mesmos vândalos, vindos da bárbara e civilizada Europa do Norte, invadiram, os tais a que nós costumamos dar a corruptela de “bandalhos”, quando afinal somos todos bastardos daqueles bárbaros francos e visigóticos, os tais que, depois de invadirem, por dentro e por acordo, o Império, encabeçaram a plurissecular resistência a mouros e otomanos. Compreendo que alguns meus amigos saúdem, nas manifestações, o belo e despido mito da Mariana, à Delacroix, dado que, por companheirismo antigo, querem os filhos da SFIO no poder. Coisa que aliás noto com alguma simpatia, até porque, estando nostalgicamente próximo dos gaullistas de ontem, detesto esta direita galicista dos fidalgotes, com muitos candidatos a delfins que se vão cordialmente golpeando, como Chirac tramou Chaban-Delmas e Valéry, o próprio De Gaulle, sem terem qualquer princípio que lhes dê “une certaine idée” de França e de Europa. Apenas disputam lugares gestionários de uma coisa que eles não construíram. Os tais “bandalhos” não são os disciplinados socialistas, comunistas e sindicalistas que se manifestam pela continuidade do “État-Providence” e não podemos continuar a usar aquele romantismo retroactivo que nos embaciava as lentes com que confundíamos este presente armadilhado com a juventude perdida. Os polícias da mangueirada preventiva também são filhos da mesma geração confusa, onde não falta até certo deputado europeu, cujo nome não propagandeio, mas que, ainda recentemente, confessou os seus desvios pedófilos, para não falarmos nas memórias de leveza de outras drogas duras, com que alguns faziam o pretenso “make love, not war”, para que olvidássemos que foram os resistentes da “Libération” que acabaram derrotados em Dien Bien Phu e na OAS. Os culpados desta anarquia ordenada não são os tais “bandalhos” do “banlieu”, que, encapuçados, vão aproveitando o vazio de sonho, ideias e esperança, para roubarem e agredirem. Somos todos Pilatos, mesmo quando nos disfarçamos em ideologismos. Até eu, que continuo pelas margens da direita liberal, começo a preferir os mitterrandistas de Fabius a retomarem o “rôle” da Europa, da tal que precisa do “oui par le non” para sair da encruzilhada, através de um baralhar e dar de novo.

Mar 29

Marcelo, ponte da feijoada, bacalhau e desastre da Ponte das Barcas

Neste dia do ano de 1996, Marcelo Rebelo de Sousa era eleito líder do PSD. Depois, veio Paulo Portas, mais Sampaio, mais Moderna, mais Barroso, mais Santana, mais e menos. Hoje é conselheiro de Estado. Com muitos sapos engolidos. E comentários televisivos.

Neste dia, no ano de 1998, era inaugurada a ponte Vasco da Gama, cheirando ainda a feijoada e a um produto que lavaria loiça, quando ainda se vivia em vacas semigordas de monetarismo keynesiano e gestão de subsídios que nos prometiam agricultura a pataco e reino dos céus com doze estrelas.

Neste dia, do ano de 1809, Portugal sentia o sabor dos balanços da balança da Europa, quando, em nova invasão dos franceses, acontecia na travessia do rio Douro, na ribeira do Porto, o desastre da Ponte das Barcas. Somos um povo antigo na dor e, hoje, meio vazio no desencanto, entre o “simplex” e a viagem de Freitas ao Canadá, que é país que só apareceu depois de por lá andarmos a pescar o fiel amigo. Boa sorte, senhor ministro! Hoje ainda estou no remanso orgulhoso de mais um voo das águias.

Mar 28

Sociedade de Corte. Estado de graça

Quem duvidasse do estado de graça do presente ciclo de coabitação do regime poderia, ontem, se tivesse o dom da ubiquidade, ter desfeito as respectivas dúvidas, ao fim da tarde, indo ao lançamento dos livros de duas personalidades do PS: o embaixador Seixas da Costa, sempre potencial ministro dos estrangeiros, e o secretário de Estado José Conde Rodrigues, sempre em diálogo com os chamados operadores judiciários. Por dever de antigo professor tive que preferir este último, não podendo comparecer no Centro Cultural de Belém, junto do antigo aluno e actual professor do ISCSP, o nosso embaixador em Brasília. Já li naturalmente “A Política sem Dogma”, à procura do liberalismo de esquerda, onde concluí que, se me fiasse na argumentação, já nem eu poderia ser de direita. Senti que, nos “halls” da Católica, sob a biblioteca de António Sardinha, estavam juntas todas as altas esferas pensantes do situacionismo. E o bailado provocou-me um daqueles sorrisos típicos dos observadores radicais, diante dos armadilhados terrenos da barganha, onde me foi dado ver um conselheiro de Cavaco em ameno triângulo com um ex-conselheiro de Soares e um presente conselheiro do Senhor Duque de Bragança, mas onde senti a falta de ilustres hierarcas do Grande Oriente Lusitano, apesar de não faltarem hieracarcas de outras ordens menos regulares, mas ditas regulares. A minha radical presença gerou, naturalmente, civilizadíssimos cumprimentos de quem se interrogou sobre a minha discreta participação no acto, demonstrando como nem sequer em diagonal deve ter passado os olhos pelo texto apresentado. Quero, em primeiro lugar, agradecer ao autor as referências que me concedeu, evocando textos meus do século passado, alguns dos quais ainda nem sequer saíram do limbo da sebenta, quando, no velho palácio da Junqueira, trocávamos ideias antes e depois das aulas de um mestrado, donde fui obrigado a afastar-me, quando ilustríssimos inspiradores tal inspiraram, entre sussurros conselheirais e bancárias jantaradas, naqueles salamaleques típicos dos ineficazes assassinatos morais, quando a adjectivação diabolizante da teoria da conspiração não se adequa ao visado, que não é “opus”, “copus”, avental ou sacrista, como poderia constar da ficha das velhas ou novas pides, cujo quadriculado, pré-cibernético, não consegue conter a raiva dos homens livres. Por isso sorrio quando recebo “inputs” de estratégia indirecta sobre a alta azáfama que reina entre os meus vizinhos conselheirais do Palácio Cor de Rosa, na sua profissional e quotidiana leitura da jornalada e, talvez, da blogagem, catando os inúmeros recados analíticos que podem ter como objectivo o “bunker” principal da actual coligação. Mesmo o que, hoje, o semanário “O Diabo” transcreve das minhas palavras sobre o CDS e o PSD apenas quer dizer o que soltamente penso, mesmo que erre. Se consultarem no arquivo oficial a minha ficha da DGS, verificarão que sempre estive no mesmo sítio axiológico-político. As circunstâncias da conveniência e da oportunidade dos carreirismos é que se modificaram radicalmente, menos para quem faz contabilidade de ascensões e quedas. Sempre tive como máxima ambição política ser exactamente aquilo que sou e, neste tempo de homens lúcidos, tendo a lucidez de ser ingénuo, quando digo efectivamente aquilo que penso, engano sempre os que pensam que os outros dizem aquilo que não pensam, ou que vivem uma vida escondida face àquilo que proclamam. Por mim, continuo a tentar viver como penso e, por isso, não posso efectivamente ter de pensar como vivo. Até assino sempre o que quero comunicar. Mesmo em blogue.

Mar 28

Algumas notas sobre o diga trezentos e três, pouco simplexes e muito complexo-burocratilófilas, segundo as ciências que Gago considera ocultas

Duas comemoração há hoje a assinalar: primeiro, a de 1967, quando a Igreja Católica precebeu que chegou a globalização e o papa Paulo VI emitiu a encíclica “Populorum Progressio”; em segundo lugar, a de 1977, quando o Portugal pós-revolucionário e soarista solicitou a adesão às então CECA, CEE e CEEA, dado que a de 1835, a morte de D. Augusto, o primeiro marido de D. Maria II, apenas tem a ver com a nossa inserção na balança da Europa, dado que o dito consorte precedeu o segundo consorte, D. Fernando e ambos foram dados à jovem rainha de acordo com a influência da nossa potência directora, nos termos do tratado da quádrupla aliança de Abril de 1834. O primeiro era francês, da França dos Orleães; o segundo era alemão, mas dependente da rainha Vitória e da potência britânica e da sua subsecção continental, o rei Leopoldo de Bruxelas, que era o único belga que então existia, como ele próprio dizia.

Anteontem, ontem e hoje já a situação era complexa e não simples nem simplex. Porque a complexidade sempre foi uma forma particular de agrupamento de elementos, diferente da agregação. Esta é uma reunião de elementos não combinados, enquanto a complexidade é uma heterogeniedade organizada, ligando os elementos num conjunto com um raio determinado, ligando os vários elementos entre si. Sem consultar o MIT ou um dos muitos assessores que Mariano Gago costuma despachar para vender nas universidades o espírito de Bolonha, sei, segundo Henri Lepage que esta “teoria dos sistemas complexos” regidos por “mecanismos de auto‑organização que respondem a flutuações aleatórias” está próxima de alguns teóricos da química molecular que defendem a existência de “processos de crescente complexificação, conducentes a ordens espontâneas, permanentemente reposta em causa, mas que, por sua vez, levam à constituição de ordens sempre mais complexas.

E isto porque a ideia estática de uma ordem universal imutável é cada vez mais contestada por uma filosofia dinâmica da desordem e da entropia, também ela fundamentada na ideia neo‑darwiniana de uma selecção natural de sistemas de propriedades estruturantes (Morin)”.

Com efeito, só a agregação, enquanto uma reunião de elementos não combinados é que é simples. Logo, uma máquina administrativa, enquanto a complexidade, é uma heterogeniedade organizada. É o preciso contrário daquilo que é simples. É o que caracteriza os sistemas abertos, em confronto com os sistemas fechados. Aqueles que são regidos por mecanismos de auto-organização, que respondem a flutuações aleatórias e que têm processos de crescente complexificação, conduzindo a ordens cada vez mais espontâneas.

Deste modo, cada nova ordem traz consigo novos desafios, donde surgem novas ordens ainda mais complexas. A complexidade diz respeito aos todos, às totalidades que não são simples justaposição de elementos simples, diz respeito aos todos centrados sobre si mesmos. A especificidade está na energia radial ou interna das coisas humanas, dessa anti-entropia que atravessa o mundo físico e o faz subir para o improvável. É esse poder que têm os seres vivos para a regeneração e para a multiplicação. Essa forma de energia que lança para cima e para dentro, para estados cada vez mais complexos e mais centrados. Essa forma de energia que liga os corpúsculos de centro a centro, de consciência a consciência sempre no sentido do improvável.

E nisso, os seres vivos divergem da lei da degradação da energia marcante no mundo físico, onde domina a entropia, aquela quantidade de energia que, sendo gasta numa mudança, se torna irrecuperável pelo sistema e fica para sempre na zona do desperdício. A entropia tende para a involução e para o nivelamento de conjuntos corpusculares marcados pela probabilidade, por esse jogo nivelador e homogeneizador que conduz à morte da matéria. Ela não passa de uma energia tangencial, mensurável.

Não sei se a ilustre criadora do simplex e colaboradora do “blogue” de Vital Moreira e Ana Gomes terá explicado ao Primeiro Ministro que burocracia veio doo francês bureaucratie, termo inventado por Gournay, na primeira metade do século XVIII. E que tal corresponde ao tipo ideal de uma organização formal da sociedade, caracterizada pela legitimação hierárquica da autoridade, com poderes e responsabilidades atribuídas a funcionários que ocupam posições numa determinada hierarquia marcada pelo direito à carreira. Onde cada posição tem objectivos previamente fixados e há uma codificação de todas as regras de conduta que tratam da organização como um todo, onde há ordens comunicadas por escrito.

Porque, segundo Weber, uma das características do Estado Moderno, um conjunto de pessoas marcadas pela competência e não pela fidelidade. O Estado Moderno seria, acima de tudo, um Estado Racional marcado pelo surgimento de uma administração burocrática. E isto porque em todos os domínios (Estado, Igreja, exército, partido, empresa económica, grupo de interesses,associação, fundação,etc.), o desenvolvimento das formas modernas de agrupamento identifica‑se muito simplesmente com o desenvolvimento e com a progressão constante da administração burocrática: o nascimento desta é, por assim dizer, o esporo do Estado ocidental moderno.

Por outras palavras, a burocracia racional é, pois, uma ditadura do funcionário. Apoia‑se na crença na legalidade de ordens estatuídas e dos direitos de mando dos chamados por essas ordenações a exercer a autoridade. Tem uma impersonalidade formalista, consistindo numa dominação graças ao saber que destrói os antigos sistemas de legitimação. Assim, o saber e a ideologia passam a ser os principais pontos de apoio do Estado.

Uma burocracia que também se tornou possível pelo aparecimento de uma economia monetarista que permitiu ao Estado passar a pagar com regularidade aos seus funcionários, abandonando‑se o anterior pagamento em espécie, por exemplo, através do aluguer da função de cobrador de impostos.

Segundo Weber, tem a ver com a acção racional referente a fins (Zweckrational), onde os indivíduos são capazes tanto de definir objectivos como de avaliar os meios mais adequados para a realização desses objectivos, uma acção social marcada pela moral de responsabilidade, onde o valor predominante seria a competência. Aqui já nos situaríamos no campo do Estado racional-normativo ou do Estado-razão, onde domina a acção burocrática, aquela que faz nascer o poder burocrático, o poder especializado na elaboração do formalismo legal e na conservação da lei escrita e dos seus regulamentos, onde dominam a publicização, a legalização e a burocracia.

Mar 28

Cenas da permanecente sociedade de corte, neste reino que já não há

Quem duvidasse do estado de graça do presente ciclo de coabitação do regime poderia, ontem, se tivesse o dom da ubiquidade, ter desfeito as respectivas dúvidas, ao fim da tarde, indo ao lançamento dos livros de duas personalidades do PS: o embaixador Seixas da Costa, sempre potencial ministro dos estrangeiros, e o secretário de Estado José Conde Rodrigues, sempre em diálogo com os chamados operadores judiciários. Por dever de antigo professor tive que preferir este último, não podendo comparecer no Centro Cultural de Belém, junto do antigo aluno e actual professor do ISCSP, o nosso embaixador em Brasília. Já li naturalmente “A Política sem Dogma”, à procura do liberalismo de esquerda, onde concluí que, se me fiasse na argumentação, já nem eu poderia ser de direita.

Senti que, nos “halls” da Católica, sob a biblioteca de António Sardinha, estavam juntas todas as altas esferas pensantes do situacionismo. E o bailado provocou-me um daqueles sorrisos típicos dos observadores radicais, diante dos armadilhados terrenos da barganha, onde me foi dado ver um conselheiro de Cavaco em ameno triângulo com um ex-conselheiro de Soares e um presente conselheiro do Senhor Duque de Bragança, mas onde senti a falta de ilustres hierarcas do Grande Oriente Lusitano, apesar de não faltarem hieracarcas de outras ordens menos regulares, mas ditas regulares. A minha radical presença gerou, naturalmente, civilizadíssimos cumprimentos de quem se interrogou sobre a minha discreta participação no acto, demonstrando como nem sequer em diagonal deve ter passado os olhos pelo texto apresentado.

 

Quero, em primeiro lugar, agradecer ao autor as referências que me concedeu, evocando textos meus do século passado, alguns dos quais ainda nem sequer saíram do limbo da sebenta, quando, no velho palácio da Junqueira, trocávamos ideias antes e depois das aulas de um mestrado, donde fui obrigado a afastar-me, quando ilustríssimos inspiradores tal inspiraram, entre sussurros conselheirais e bancárias jantaradas, naqueles salamaleques típicos dos ineficazes assassinatos morais, quando a adjectivação diabolizante da teoria da conspiração não se adequa ao visado, que não é “opus”, “copus”, avental ou sacrista, como poderia constar da ficha das velhas ou novas pides, cujo quadriculado, pré-cibernético, não consegue conter a raiva dos homens livres.

Por isso sorrio quando recebo “inputs” de estratégia indirecta sobre a alta azáfama que reina entre os meus vizinhos conselheirais do Palácio Cor de Rosa, na sua profissional e quotidiana leitura da jornalada e, talvez, da blogagem, catando os inúmeros recados analíticos que podem ter como objectivo o “bunker” principal da actual coligação. Mesmo o que, hoje, o semanário “O Diabo” transcreve das minhas palavras sobre o CDS e o PSD apenas quer dizer o que soltamente penso, mesmo que erre.

Se consultarem no arquivo oficial a minha ficha da DGS, verificarão que sempre estive no mesmo sítio axiológico-político. As circunstâncias da conveniência e da oportunidade dos carreirismos é que se modificaram radicalmente, menos para quem faz contabilidade de ascensões e quedas. Sempre tive como máxima ambição política ser exactamente aquilo que sou e, neste tempo de homens lúcidos, tendo a lucidez de ser ingénuo, quando digo efectivamente aquilo que penso, engano sempre os que pensam que os outros dizem aquilo que não pensam, ou que vivem uma vida escondida face àquilo que proclamam. Por mim, continuo a tentar viver como penso e, por isso, não posso efectivamente ter de pensar como vivo. Até assino sempre o que quero comunicar. Mesmo em blogue.

Mar 27

Entre o neofeudalismo e a anarquia ordenada, nesta centralização dita desconcentradora e regionalizadora

Parece que o tal Estado a que chegámos, dito moderno e burocrático, sabendo que é centralista e concentracionário em demasia, pretende ir para a Meia Maratona do fingimento fingir que a dita é maior do que a Légua da Póvoa. Vai daí, descobriu que só é novo aquilo que se esqueceu e tratou de repescar uma ideia que o ministro da presidência do salazarismo, um tal Marcello Caetano  , lançou nos anos cinquenta do século XX, o “slogan” da reforma administrativa, que tem servido de discurso de justificação para a criação de uma gigantesca burocracia anti-burocrática e de uma centralista tecnocracia dita desconcentradora, numa linha de cumplicidade entre o PSD e PS que vão chamando à coisa Modernização Administrativa e Reforma do Estado, umas vezes com Secretariados, à maneira do defunto “Secretariado técnico da presidência do conselho de ministros”, o pai dos planeamentistas, outras, com Ministros como o foi o Alberto Martins. Por mim, prefiro notar que a gigantesca burocracia mental dita desburocratizadora, perdida em manuais de desenvolvimentismo keynesiano ou pós-marxista, parece equivaler à centralização dita regionalizadora, numa dessas habituais usurpações conceituais daqueles discursos justificadores do poder nominativo, onde o verbo substitui o acto. Tudo se parece aliás com o jacobinismo centralista da comissão apátrida, sita em Bruxelas, que prostituiu o belo conceito de federalismo, nesse propositado nominalismo confusionista, onde os detentores do poder continuam a passear impunemente o próprio monopólio da palavra, assente nos quilos de papel produzidos pelos chamados técnicos. E a tal coisa a que chamam reforma usurpa a própria inteligência, quando, manipulando o subsídio distribuído entre os favoritos das sucessivas cortes, se acaba por estrangular o próprio pensamento livre que, devendo estar nas universidades, acaba por ser esmagado pelo decretino estadual da avaliação, nesses meandros de um “Big Brother” que sempre foi inimigo dos homens livres, nomeadamente pela estadualização do próprio mecenato. O corporativismo semeado estadualmente por Salazar , através da tímida criação de duas ordens profissionais, ameaça transformar o neofeudalismo em regra de um salve-se quem puder, num país onde há cada vez mais pés e cada vez menos botas.

Mar 25

Do meu quintal em Lisboa…

Manhã de sábado, estremunhado, entre as novas que nos prometem a possibilidade de a ETA poder suspender o último foco terrorista da nossa península e a prisão de polícias e chefes de polícia que eram ladrões, para que o senhor Estado possa assemelhar-se a uma pessoa de bem, até para que o combate ao terrorismo deixe de ser feito pelo terrorismo de Estado e o combate aos ladrões por um Estado Ladrão, conforme tem sido praticado pela santa aliança de neo-maquiavélicos, ditos realistas, e corruptos, ditos democratas, quando não passam de simples devoristas, a quem os donos da comunicação social chamam, para fazerem discursos contra a corrupção.

Noto, nas efemérides, que, neste dia, tanto foram lançadas as bases do nosso Partido Republicano, em 1876, mais de um ano depois de o Partido Socialista ter sido fundado, como em 1957 foi assinado o Tratado de Roma, fundador da CEE e da CEEA que, juntando-se à CECA, constituirão as três comunidades que serviram de fundamento à actual UE. Reparo no presente, passado e futuro estado de coisas do projecto europeu, neste OPNI (objecto político não identificado) que é federação às segundas, quartas e sextas, clamando pela integração, e confederação, às terças e quintas, clamando pela cooperação, para que, ao fim de semana seja atlantista ao sábado e vaticanista no dia do senhor. Considero, contudo, que esta péssima Europa é bem menos péssima do que a não-Europa. E reparo que os jornais portugueses tratam da cimeira de Bruxelas como assunto que faz parte da secção de política internacional.

O meu quintal em Lisboa está ao mesmo tempo em Lisboa, em Portugal e na Europa. O bom regionalismo é amá-lo por ele estar na Europa. Mas quando chego a este regionalismo, sou já português, e já não penso no meu quintal (Fernando Pessoa)