Viva o bom senso, abaixo o contra senso

“Quinze a cinco”, não foi o resultado da vitória do Benfica no Dubai ou do brilharete do meu vizinho Atlético no estádio do Dragão, mas o que muitos pensam ser a pescada do antes de o ser já o ter sido, como parece ser o timbre dos novos e pulpitulares “grandes educadores do proletariado”, na campanha do referendo sobre a IVG. Sobre a matéria, prefiro subscrever, na íntegra, o seguinte comentário: Ao que parece este fim de semana, depois de passarem as festas e de começarem os saldos, abriu em força a campanha dos movimentos cívicos pró e contra aborto.

Saltam os argumentos de peso metafísico do género, quando começa a vida e a quem pertence o corpo da mulher; de peso económico do género, quanto custa ao SNSaúde um aborto versus quanto custa tratar as sequelas de um aborto clandestino, quanto custa abortar numa clinica privada em Portugal e quanto custa em Badajoz; de peso psicológico do género, uma mulher que aborta terá depressões e tendências suicidas, uma mulher que não aborta nem poderá ter condições para ter depressões.

Todos os argumentos são válidos mas a verdade é que existe uma lei que não é cumprida. Por isso, ou se a cumpre ou se a revoga, sob pena de qualquer um de nós poder invocar que cometeu um crime mas que não deve ir preso porque aquela lei também não deve ser cumprida. Este não é o único caso de leis que existem e que não são cumpridas mas este é um dos mais flagrantes.

Existem muitos actos que condeno moralmente e me chocam profundamente enquanto ser humano mas não defendo a sua criminalização. Por não querer que ninguém aborte mas por não querer que ninguém vá preso por abortar, a escolha é só uma.

Concordo, em plenitude. Como disse Sócrates, o primeiro, o de Platão e não o Pinto de Sousa, quando se recusou a fugir à execução da sentença de morte que lhe havia sido determinada pelos órgãos competentes da cidade : crês, porventura, que uma “polis” pode subsistir e deixar de ser afundar, se as sentenças proferidas nos seus tribunais não tiverem valor algum e puderem ser invalidadas e tornadas inúteis pelos cidadãos?

Quando os adeptos do “não” dizem que vale a pena este apodrecimento da legalidade e dos fundamentos do Estado de Direito, proclamando que deve manter-se o que está porque a lei vigente não é aplicada pelos mecanismos de administração da justiça, só porque não há mulheres condenadas, eles estão a desmentir-se a si mesmos

 

Eles estão a dizer que há uma lei positiva que foi revogada pelo desuso. Que perdeu a vigência porque deixou de ter a adesão valorativa da comunidade a que se destina, através da interferência do momento valorativo no momento da vigência e da eficácia.

Julgo que chegou a hora de voltarmos a dar justiça e direito a este segmento da lei, adequando-a à vida. Fazer isto na IVG pode ser o começo de um processo que faça da lei uma profissão de fé da religião secular do Estado de Direito. Porque também o deveríamos praticar na evasão fiscal e noutras áreas críticas do nosso viver colectivo. Dizer sim é termos a humildade da cidadania.

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