Jan 21

O melhor de qualquer campanha eleitoral

O melhor de qualquer campanha eleitoral sempre esteve na circunstância de nos podermos relembrar do mais aliciante da democracia: o podermos fazer um golpe de Estado sem efusão de sangue, através do bom uso do poder de sufrágio. Mas, como antes de qualquer mudança (“perestroika”) tem de haver transparência (“glasnot”), eis que muitos não sabem lutar adequadamente contra a corrupção e o indiferentismo que continuam a sitiar a cidadania, impedindo que a honra volte a casar-se com a inteligência, para que possamos viver como pensamos. E assim nos enredamos em sucessivas campanhas negras onde quem atira pedradas aos telhados de vidro do vizinho acaba com os seus estilhaçados. Pior do que isso: em vez da defunta luta de classes, tiraram do caixote de lixo da história as velhas técnicas inquisitoriais, dos moscas e do bufos, em nome daquele maquiavelismo que admite todos os meios para que se alcancem quaisquer bons fins, onde tenha razão quem vence. Talvez tal literatura de justificação não tenha reparado que quem parece ter razão, no curto prazo, mesmo que se sirva de uma má moral, pode acabar por também a perder no médio, assim se confirmando que tal expediente também é uma péssima política. Mesmo que, longo prazo, estejamos todos mortos. Daí que vencer também possa equivaler ao ser vencido Se o vencedor da sondajocracia coincidir com o vencedor da democracia, confirma-se que mantém “potestas” e vai continuar a viver no palácio do “guarda-patos”, mas desconfia-se que perdeu “auctoritas”, porque a confiança pública na veneranda figura ficou mais triste. Francisco Lopes justifica a respectiva região demarcada e impõe que a UNESCO declare o nosso nonagenário partido bolchequive património cultural da humanidade, apesar de as festas do Avante serem posteriores a outras peregrinações de outra fé. É tudo uma questão de respeitável metafísica. Para além do candidato sombra, o que rejeita a urna, a melhor campanha é a da sociedade civil. Não as notícias sobre o assassinato de Nova Iorque ou o pedido de demissão de um presidente da futebolítica, mas os comícios dos movimentos escolas-SOS e dos defensores do Ramal da Lousã Para além do candidato sombra, o que rejeita a urna, a melhor campanha é a da sociedade civil. Não as notícias sobre o assassinato de Nova Iorque ou o pedido de demissão de um presidente da futebolítica, mas os comícios dos movimentos escolas-SOS e dos defensores do Ramal da Lousã O jogo eleitoral vai enfrentar novas circunstâncias. Um Estado que perdeu soberania no plano externo (moeda, ranking, compra da dívida) e a deixou esvair no plano interno, com o crescendo do indiferentismo e da corrupção e deixando fragmentar-se por vários Estados dentro do Estado. As sondagens nunca erram nas medições. Apenas não sabem medir coisas curvas e volumes sólidos e gasosos. Nem sequer a dimensão da senhora dona Abstenção, a provável vencedora das eleições de domingo. Os restantes candidatos apenas se distribuem pelos votos validamente expressos É honesto reconhecer que todos temos telhados de vidro. Não é desonesto exigir que os bons exemplos venham de cima. Malhas que o mostrengo tece. Mas o príncipe está sujeito à própria lei que edita. E nem tudo o que o príncipe diz tem valor de lei. Em 1975, vingámo-nos de Kerenski e da honra manchada dos girondinos e mancheviques. Com o grupo dos Nove, o PS, o PPD e o CDS, o apoio da Igreja, aliada à Maçonaria, e a força das ruas, sem circos ambulantes… Até Machado Santos se coligou com Paiva Couceiro e Amália cantou Alegre… Sou deste partido e votarei domingo em coerência. Também gostaria de votar na segunda volta. Nem que seja em Machado Santos, desde que este ressuscite. O que não impediu Salazar de, posteriormente, estabelecer que, na Constituição a plebiscitar, as abstenções contariam como voto a favor. Tudo muito republicamente para nos tramar. Na primeira e na segunda, já que, na terceira, o povo, através dos partidos e dos homens bons, impediu as intenções bolcheviques. Por acaso, em 1911, o decreto eleitoral da 1ª República declarava como expressamente eleita, sem ida às urnas, a lista que o poder provisório emitia. O velho Partido Socialista, o de 1875, estragou a festa e concorreu, mas apenas nalguns círculos. Teve apenas uns milharzitos de votos, mas salvou a honra do pluralismo. Para os devidos efeitos, já se anuncia, com a TVI roubando a caixa ao Expresso, que, na presente revisão constitucional, os principais partidos já acordaram no seguinte artigo 1º: “Portugal é uma república semi-soberana, com base no ranking e em regime de sondajocracia e muito respeitinho”. Decreto suprapresidencial que acaba de ser emitido, com artigo único: “Tendo em vista a contenção de custos e os resultados unânimes dos barómetros e sondagens, os portugueses ficam dispensados da maçada de ir à urna, sendo aclamado por unanimidade quem está acima dos partidos e dos próprios portugueses. Amen!”.