Abr 05

O fim do ciclo socrático e o pronunciamento dos banqueiros

Cavaco, finalmente, convoca Conselho extraordinário de todos os principais partidos, parceiros sociais e banqueiros para Belém, ao fim da tarde, apresentando-lhes uma carta mínima de compromisso, a que alguns chamam Pacto Sociedade Civil/Partidos.

O ciclo socrático do teatro de gestão de crises perdeu-se na presente anarquia ordenada. Só um mínimo de patriotismo científico e de humilde sentido de serviço público nos poderia ajudar o regime. Mesmo que não perca, este foi o testamento de um homem que passou. (JAM, O homem que passou, DN, hoje)

Gosto sempre de colaborar com os estudantes da minha velha universidade. A única que é sempre dos meus afectos, como comunidade das coisas que se amam. As que são centros de carreirismo podem ser sucedâneos de hierarquismos e só valem quando imitam a alma da coisa, para quem a compreende. A pátria pertence à mesma essência. Isto é, não pode ter donos (prestei depoimento ao jornal A Cabra).

O desnível a que chegámos: “Perante as declarações do senhor primeiro-ministro só posso dizer que tem um problema de natureza física, como surdez, o que não parece, ou é distraído, o que também não me parece, ou faltou à verdade. Mentiu.” Nota de um conselheiro de Estado-comentador sobre um candidato, chefe do governo.

Tão amigos que eles eram, os antigos parceiros da casta bancoburocrática…na mais recente versão da aliança da dita “esquerda moderna” (assim se autoqualificaram Cavaco e Sócartes) com a efectiva direita dos interesses (a que costuma mudar de feitor, conforme a ameaça de resultados, bem personificada no sucessivo banqueiro de todos os regimes e ciclos políticos). Porque Bancos portugueses não vão dar mais empréstimos ao Estado.

Quem não compreender que os próximos dias serão decisivos para a restauração da república, ou coisa pública, dos portugueses, pode não ser digno dos mínimos de cidadania. Crise sempre foi o espaço que antecede as decisões.

Almeida Santos, conselheiro de Estado, desmente Bagão Félix, conselheiro de Estado, também desmentido por Carlos César, conselheiro de Estado. Tudo porque Bagão desmentiu José Sócrates. Verdade além dos Pirinéus não coincide com a verdade de três responsáveis do Partido Socialista. Se todos forem falando de acordo com o partido, não há mesmo dignidade para o órgão.

Depois do pronunciamento de Carlos Santos Ferreira, ontem, hoje vai pronunciar-se Ricardo Salgado. Perante Judite de Sousa. Todos os dias, mais uma consulta nos sucessivos divã do regime.

Francisco Assis já o admite: “Se porventura a situação se degradar a ponto de termos que encontrar uma solução de ajuda externa é evidente que o deveremos sempre fazer na base de um consenso”. Um problema de simples bom senso.

O senhor banqueiro Salgado não tem nenhuma legitimidade para invocar a “unidade nacional” ou o “projecto europeu”. Tem apenas a obrigação patriótica de cumprir o seu dever como banqueiro. O poder da facção lusa da geofinança está subordinado ao poder político. E ele já demonstrou como não tem legitimidade para aí nos dar sentenças. Nem invocando o estatuto de arrependido.

 

Abr 05

Um novo Pacto Sociedade Civil/ Partidos

A democracia é cara, desde a subvenção pública aos partidos aos próprios custos dos actos eleitorais, mas só será um desperdício se não for um investimento estrutural na cidadania. Logo, as despesas na procura da vontade geral, quando cada um decide conforme fosse o todo, abdicandos dos interesses próprios que costuma manifestar em actos de sondajocracia, que apenas medem a vontade de todos e não pode ser fonte de soberania, serão insuportáveis se o sufrágio for condicionado e não atingir as raias do “fair and free”. Onde o primeiro termo é menos do que o justo, equivalendo apenas a uma exigência de não concorrência desleal, mesmo que a liberdade continue condicionada pela partidocracia vigente. Apesar de tudo, podemos chegar, como já nos aconteceu, à plenitude libertadora de um golpe de Estado sem efusão de sangue, como Karl Popper definia as mudanças democráticas. Basta que as próximas nos tragam “new deal”, um diálogo entre adversários, assente em lugares comuns que nos restaurem a coisa pública, onde o aparelho de poder se abra à sociedade civil, ultrapassando a mentalidade de sociedade de corte, onde certos escolhidos escolhem os que os escolheram, segundo o ritmo das castas, onde a farsa das eleições macrocéfalas seria algo a decepar, neste despesismo sem dor e muita música celestial em que nos vamos gastando.

Abr 05

Farpa

Chegou ao fim o ciclo dos governos minoritários e já não parece ser

possível até uma mera coligação de aritmética parlamentar absoluta.

Daí que a encenação de campanha da entrevista de Socrates tenha

continuado a exagerar, numa visão da essência da política como guerra

entre amigos e inimigos, exagerando na manha da propaganda, no engodo

da ideologia e na invocação autoritária da razão de Estado. Porque

depois do anúncio da nao recandidatura de Zapatero, do abandono da

presidencia do FDP por parte do ministro alemão dos estrangeiros, todo

o equilibrismo da Interessenpolitik em que assentou o negócio do PEC

em Berlim tornou se um vazio. O ciclo socrático do teatro de gestão de

crises perdeu-se na presente anarquia ordenada. Só um mínimo de

patriotismo científico e de humilde sentido de serviço público nos

poderia ajudar o regime. Mesmo que não perca, este foi o testamento de

um homem que passou.