Não gosto de utilizar esta minha coluna de quinzenal opinião para despejo dos meus arquivos de justificação política, mas face à actual questão europeia, não posso deixar de recorrer a um texto que emiti, em Janeiro de 1995, para a Comissão de Assuntos Europeus da Assembleia da República, onde, de forma bastante europeísta, contra eurocépticos, eurocalmos e eurocratas, assumia aquilo que as propagandas do Partido Popular Europeu e do Partido Socialista Europeu continuam a considerar uma espécie de impossível lógico: a conciliação do nacionalismo com o europeísmo.
Repetindo o que então proclamei, volto a dizer que “a Europa que interessa a Portugal é a Europa que tenha uma alma, como dizia Robert Schuman. A Europa que possa recomeçar pela cultura, como acrescentava Jean Monnet.
Porque não haverá Europa se esta não for entendida como uma polis, como um conjunto de cidadãos, onde só é cidadão aquele que participa nas decisões. Mas a polis Europa só o poderá ser se se assumir como o resultado da complexidade das polei que a história gerou, como ânimo comum assente nas comunidades efectivas que a formam e conformam.
Qualquer europeísmo que caia na tentação de criar um super-Estado, uniformizado, centralizado e concentracionário, em nome de um despotismo esclarecido e utilizando a metodologia da Europa confidencial, através da elefantíase legiferante e do regulamentarismo, nada mais faz do que elevar o soberanismo absolutista à escala europeia.
Destruir o soberanismo dos Estados, mantendo-o num centro político supra-estatal é deixar entrar pelo sótão aquilo que pretendeu, em boa hora, defenestrar-se.
Só uma Europa consciente de que os problemas económicos só podem ser resolvidos por medidas económicas, mas não apenas por medidas económicas, pode ser viável e fiel ao ideal europeu.
Isto é, uma Europa que crescer a partir de um mercado único e de uma união económica e monetária, só pode ser diferente dos modelos de free trade, se assumir uma identidade política, se ascender a uma alma, se for mais cultura, mais cidadania e mais política, mas através de uma perspectiva pluralista e poliárquica.
A autonomia política dos portugueses que, desde a sua conformação medieval, esteve na vanguarda de uma construção racional do político através do consentimento comunitário, considerando que só a partir do particularismo, da diversidade e da diferença pode atingir-se o universal, não pode deixar de continuar a ser vanguarda na construção de uma Europa que queira ser unidade na diversidade”.
Os partidos que tentam monopolizar o europeísmo, abusando da respectiva posição dominante e tentando esmagar os que não alinham no respectivo oligopólio, isto é, aqueles que têm entre nós, como simples secções retalhistas, o PSD e o PS, com o PP como satélite, podem dizer que têm com eles o bem e atacar os adversários como agentes do diabo oposicionista. Que fiquem com o respectivo situacionismo político e sociológico, que repartam entre si os milionários subsídios de campanha, os quais não entram nas contabilidades nacionais do controlo do financiamento partidário.
Estes bons alunos de Jacques Delors e da eurocracia têm a ilusão da vitória só porque acreditam que dois terços dos europeus estão cada vez melhores e mais anafadinhos, enquanto pouco lhes interessa a revolta da justiça, nomeadamente daquele um terço de excluídos que constituem os novos povos mudos da Europa.
A Europa que interessa a Portugal tanto não é aquela que continua, por cá, à procura do tempo perdido, quando havia Jacques Delors, Mitterrand, Kohl, Cavaco Silva ou Mário Soares, como a mais recente defunta, aquela jovem senhora oportunista inventada pos Mr. Donald Rumsfeld, a dita “Nova Europa”, agora desaznarizada.
Julgo que talvez valha a pena estragar a paisagem situacionista e fazer como o nosso Zé Povinho diante do rotativismo: Não! Rotativismo e Bloco Central, nunca mais!