Fev 28

Nacionalistas, mas pouco patriotas…

O mundo das universidades portuguesas que, muitas vezes, não se confunde com a ideia de universidade, vive dias intensos de mudança, com a tomada de posse do novo reitor-primaz, Seabra Santos, de Coimbra, que defende a necessidade de manter a universidade pública e inclusiva, enquanto escola de cultura e de cidadania, bem como o reforço da autonomia universitária, mutuamente responsabilizante: com prestação de contas por parte das instituições, mas acompanhada pela transferência do financiamento devido pelo Estado.

Por outras palavras, o tal Conselho de Reitores, apesar de continuar a ser engenheiralmente presidido, ameaça transformar-se num contrapoder face ao conformismo gaguista, nesta fase pós-veiga-simonista-maputiana da sua curta existência. Porque toda a inside information que nos chega aponta o apoiado por António Avelãs dos Nunes como o mais conservador dos reitores, ao mesmo tempo que é o mais próximo de Jerónimo de Sousa, sem qualquer paradoxo, face ao progressismo da literatura de justificação do situacionismo.

Aliás, quase todos os que circulam neste pequeno mundo observam a atitude que vai tomar o senhor ministro face a uma das mais engenheirais e british das ditas privadas, instituição que o Primeiro-Ministro bem conhece e sobre cujos meandros deve ter uma informação convicta e experimentada. Segundo consta, as parangonas recentemente geradas por palavras como gatunos, roubos e vigarices podem vir a afectar a boa intenção da criação de uma universidade dita europeia que, agregando três cadáveres adiados, parecia poder ser procriada pela engenharia de influências, com cunhas à mistura, que alguns partidocratas iriam lançar, em ligação a uma grande instituição universitária dos States, especialista em terceiromundismos.

Já na nossa dita pública, com amplos sinais de novas privatizações devoristas, outros jotas e outros betas, congregados em lista única de meia dúzia de hierarcas, dita AZ, para abranger tudo, onde todo o mundo não passa de ninguém, vão parodiando o conceito de gestão democrática, com ilustres democratas a não perceberem que o manto diáfano da legalidade pode não corresponder à verdade da legitimidade. Aconselhamos que releiam os discursos do ex-venerando Chefe de Estado depois das últimas eleições marcelistas de Outubro de 1973, a que não compareceu a oposição, quando esta nem dava ao situacionismo a mera categoria de oponível, porque um quarto de hora antes de morrer ainda estava vivo.

Há coisas que têm muita identidade e pouca memória. Espreitem-se algumas das bocas que anunciam o estudo da rede de pesquisa International Social Survey Programme, que em Portugal está integrado no programa Atitudes Sociais dos Portugueses, do ICS. Os portugueses engrandecem o passado na mesma medida em que desprezam o presente. Estão pessimistas, desconfiados. E, nas “médias de patriotismo”, numa escala de 1 a 4, Portugal fixa-se nos 2,14, contra 2,71 de média na União Europeia. Mas cerca de 92 por cento de portugueses dizem sentir orgulho na história do país. Em 42 países auscultados no âmbito desta investigação, é uma percentagem só ultrapassada nos Estados Unidos e na Venezuela. E, surpresa, os portugueses sentem-se mais orgulhosos com as suas artes e literatura do que os nacionais de países como a Irlanda, os EUA ou a Rússia.

Por outras palavras, estamos cada vez mais próximos do mundo de Bush e de Chávez, sem a sociedade civil do primeiro e sem o petróleo do segundo, mergulhados num passadismo esquizofrénico, alheio ao presente, porque nos faltam saudades de futuro. Daí o regresso ao encanto por Salazar, neste desespero por cacetes e déspotas, a que, muitas vezes, damos o nome micro-autoritário do senhor director, especialmente quando ele é brasonado e se veste num alfaiate de finórios, porque sempre podemos, muito freudianamente, fazer uma dessas viagens autistas, entre os vapores da ressaca, mesmo que, no day after, acordemos com a boca a saber a papel de música…

Basta saber ler a lei do cherne, onde o Barroso anda a fazer campanha para ir desta para melhor, deixando-nos o rigor de Santana e os belos fatos de Portas, enquanto o Sampaio vai consultando constitucionalistas sobre o momento exacto da intervenção externa naquele universo onde, depois de frémitos ingentes, a montanha costuma parir ratinhos…

Fev 27

A história continua a ser o género literário mais próximo da ficção

No dia em que se anuncia novo filme sobre Maria Madalena e uma caixa tumular, onde o realizador do “Titanic” pretende ganhar dinheiro, afundando um pilar da crinstandade, reparo que as universidades privadas lusitanas continuam a produzir guiões para tragicomédias, antecipando muito do que vai suceder nas universidades ditas públicas, dado que, também nestas, continuam edificantes cenas do mesmo género, onde a história continua a ser o género literário mais próximo da ficção.

Não posso comentar a relação entre o espectáculo televisivo e os efectivos meandros da realidade, dado que não conheço o texto, o pretexto e o contexto do mais recente episódio, mas seria bem esclarecedor que os senhores jornalistas fizessem um trabalho de casa de levantamento da lista dos docentes de todas as instituições do género, bem como dos sócios das entidades em causa, anotando, menos os filhos, sobrinhos e primos dos donos do poder, e mais os ilustres políticos da partidocracia que nas mesmas dizem dar aulas ou, nas mesmas, se licenciaram, mestraram ou doutoraram.

Seria também interessante que determinassem os sócios e financiadores das coisas em “U”, com especial destaque para os patos bravos e os negócios imobiliários que com elas coincidem, antes de entrarem em eventuais teorias da conspiração e triangulações de política externa.

Acrescentem ao processo os contornos de anteriores cisões universitárias, desde que a velha Universidade Livre explodiu, procurando ligações a antigas e actuais direcções de entidades bancárias, começando pelo concelho de Lisboa, dando um salto a Loures e fazendo breve pregrinação por Oeiras e pelas ribas da ribeira do Jamor, junto à estrada onde os malhados fizeram estatelar o infante D. Miguel, quando ele corria de Queluz para Caxias.

Um delicioso drama camiliano está espera de telenovela sobre as vaidades lusitanas do “sotôr” e o eterno situacionismo dos partidocratas e bancoburocratas, com cumplicidades de pato bravo.

Fev 26

É ao entardecer que a sobriedade da coruja costuma levantar voo

Muitos sinais me dizem que muitas instituições parecem ter escolhido o seu caminho de não salvação pública e de não-ruptura, delegando os seus destinos no presente e no futuro situacionismo, para que eles conjuguem o medo e a esperança, escrevendo o capítulo final de um certo ciclo de vida em comum. Esperemos que todos tenham o êxito que nos vêm prometendo, sobretudo no programa de luta pelo emprego. Eles têm todos os poderes que querem ou quiseram, no cargo um, no cargo dois, no cargo três, no quadro quatro e aos quais até julgam que podem distribuir o acrescer das pensões, das avenças, dos subsídios e de outras prebendas. Eles são a direcção e coordenação do conselho alínea a), do conselho alínea c), da assembleia alínea d), bem como das unidades z), x), w), y), k), bem como do boletim oficial, dos programas de intercâmbio e, directa ou indirectamente, da maior parte dos processos de condução de carreirismo, consagrando a continuidade herdada dos nossos ilustres directores de colégios e centros de estágio, de quem foram próximos discípulos e de quem são miméticos semeadores, até na continuação do verbo mudar. Por outras palavras, em termos de hierarquias formais e reais, têm, na dependência, mais de metade do corpo eleitoral e podem, assim, fazer da vida uma negociação permanente, com o nome de gestão democrática. Que se plenifiquem em graça e desgraças. Julgo que seria conveniente fazerem acrescer a estes poderes, a plenitude da direcção de todos, ou quase todos, os restantes restos, para que possam conduzir os destinos de um sistema que, inequivocamente, entra naquela fase crepuscular, donde também pode emergir a Fénix. Por mim, que não gosto de cinzas nem de terra queimada, prefiro reconhecer que é ao entardecer que a sobriedade da coruja da sabedoria costuma levantar voo(die Eule der Minerva beginnt erst mit der einbrechenden Dämmerung ihren Flug, Hegel dixit, Grundlinien der Philosophie des Rechts, «Vorrede», Bd. 7, s. 9-10)

Fev 23

Se o poder enlouque, o poder absoluto enlouquece absolutamente

Reparo que vivemos em plena ditadura do défice, herdeira daquela ditadura das finanças que levou Salazar ao poder, pelo que corremos o risco de entrarmos em regime de salazarismo democrático, nesse submeter-nos para sobreviver para aguentarmos a bolsa e a vida. O que talvez explique a angústia do principal partido da oposição que, sabedor dos ditames do programa de aplicação do défice da União Europeia, prefere que nosso governo faça o jogo do tratamento de choque e que, na hora certa, o instinto predador gere um novo líder que vá fazer a rodagem do carro ao próximo congresso da Figueira da Foz, nessa Blitzkrieg ensaiada, onde rebus sic stantibus, sempre em nome da alteração anormal das circunstâncias.

Fev 22

Da luta de classes, sem consciência de classe, ao mesquinho da mera energia das invejas igualitaristas

A alta governança deste estadão a que chegámos, onde, em casa de ilustres ferreiros, continuam a ser usados espetos de pau, ao anunciar reformas que não cumpre, vai fazendo entrar em regime de greve de zelo enormes fragmentos de um aparelho de Estado feito de pessoas, que bem poderiam ser mobilizadas pelo bem comum se, de cima, viessem exemplos daquela autoridade que vem de autor e não dos autoritarismos plagiados com encenações de Estado-Espectáculo e música verbal de celestial demagogia. E nada digo sobre a minha chafarica universitária, que essa está à espera dos decretos que mestre Mariano vai preparando para a sua comteana révolution d’en haut,com muitas promessas de ordem e progresso sobre o fim das idades da teologia e da metafísica e a gloriosa chegada de um D. Sebastião científico, Guerra Junqueiro o dixit a Raul Brandão. O tal bandarriado que não compreendeu Thomas Kuhn e persiste numparadigma dos anos setenta do século passado, quando os maoistas, trotskistas e outros alpistas ainda andavam à procura da revolução perdida, sem assumirem oagainst method dos inimigos do construtivismo, como é o meu caso, de liberalão empedrenido que vai relendo Fiore e Vico e manda esses falsos gnosticismos para o caixote de lixo da história do pensamento. Basta notar como ainda se elegem reitores, conselhos directivos e conselhos pedagógicos, um quarto de hora antes de todos estarem mortos, incluindo conselhos de reitores e reitores primazes, onde generais dependem do vanguardismo de sargentos e de muitos soldados unidos que ainda clamam jamais serem vencidos. E tudo isto num sítio onde continua eficaz a memória daquilo que Mário Sottomayor Cardia qualificou como a subversão a partir do aparelho de Estado e que até inventou um PREC feito de generais de aviário, como eram os majores graduados em generais, em benefício do regabofe do oportunismo carreirístico do salve-se quem puder, típico de um ambiente que consegue transformar a luta de classes, sem consciência de classe, nessa grande energia das petites histoires da grande história como é a rasteirinha luta de invejas, categoria que Karl Marx nunca inventariou, mas que a há, a há e até se move e move, enquanto o mundo gira e Jaime Dias roda. P.S. Já agora, agradeço a qualquer coimbrinha, ainda vivendo na terra dos mestres dos locatários de Belém, se permanece a empresa de camiões que tinha o slogan que citei em último. A sede era em frente aos Bombeiros Voluntários, na Avenida Fernão Magalhães, e este escrevente, quando era puto a caminho da escola primária de São Bartolomeu, vindo da rua fora de portas, aprendeu com ela a procura da globalização alternativa. Espero que o Professor Boaventura a leve para o museu do seu laboratório associado de ciências sociais…

Fev 22

Entrevista sobre a corrupção

  1. 1.     Portugal é um dos países da Europa que mais recorre ao pequeno tráfico de influência ou ao chamado «puxar os cordelinhos» e à «cunha. Como se pode explicar tal facto?

 

A Dona Maria da Cunha, prima da Senhora Dona Política e do Senhor Amor Próprio, para parafrasear a antiga, mas não antiquada “Arte de Furtar”, obra publicada anonimamente em 1652, com o subtítulo Espelho de Enganos, Teatro de Verdades, Mostrador de Horas Minguadas, Gazua Geral dos Reinos de Portugal, sempre foi dotada de sagacidade hereditária e de modéstia postiça. Criou‑se nas cortes dos grandes Principes,embrulhou‑os a todos. Logo todos falam de política,muitos compõem livros dela e no cabo nenhum a viu,nem sabe de que cor é. Porque a primeira máxima de toda a política do mundo que todos os seus preceitos encerram em dois,como temos dito, o bom para mim e o mau para vós. Ao aceitar a regra de viva quem vence. E vence quem mais pode, e quem mais pode tenha tudo por seu, porque tudo se lhe rende, neste ponto, errou o norte totalmente,porque tratou só do temporal sem pôr a mira no eterno.

 

 

 

  1. 2.     Acha que a corrupção tem crescido na sociedade portuguesa nos últimos anos — sobretudo pela mediatização de alguns casos — ou sempre houve, de forma mais escondida?

 

Corrupção vem do latim corruptio, acção de romper pelo meio, de rasgar em partes iguais, de ir ao centro da coisa e desintegrá-la. De corrumpere, tornar podre, decompor. Ela começa sempre pelo centro e visa a destruição total do ser. Diz-se de todo o processo de compra do poder, onde o comprador deseja obter parcelas do poder. Trata-se efectivamente de um roubo de poder. Como se assinalava na nossa Arte de Furtar: os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou  a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos: os outros furtam debaixo do seu risco, este sem temor nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados, estes furtam e enforcam.

 

3. Quais os instrumentos mais eficazes para combater aquele que é considerado um dos «cancros» das democracias?

 

Para Lord Acton o poder tende a corromper é o poder absoluto corrompe absolutamente. O mesmo pessimismo leva-o a dizer que se devia desconfiar do poder mais do que do vício e que a História não é uma teia trançada por mãos inocentes. Entre todas as causas que degradam e desmoralizam os homens, o poder é a mais constante e a mais activa. Entre nós, talvez seja preferível citar Alain, para quem se o poder enlouque, o poder absoluto enlouquece absolutamente.

Fev 21

No dia do manifesto de Marx e Engels

No dia do manifesto de Marx e Engels, importa recordar que o Portugal político é o país mais à esquerda da Europa, dado que a esquerda dominante é socialista democrático e a oposição liderante de direita é social-democrata. Isto é, tanto a esquerda como a direita ainda continuam marxistas, não-leninistas, mas revisionistas. No rigor da ideologia e da história, esta é uma afirmação correcta, embora politicamente incorrecta.  Porque ninguém pode negar que o PPD fundacional admitia a inspiração marxista, que o PS era claramente marxista e que até o CDS de Freitas apresentava projectos de constituição em nome do socialismo humanista. Porque ninguém pode negar que a própria JSD chegou a adoptar “A Internacional” como hino da organização, quando fazia congressos com os retratos de Marx e Engels na parede. Porque ninguém pode negar que o PSD retirou o marxismo do programa bem depois do PS de Constâncio o ter concretizado, copiando ambos o que o SPD tinha feito no Congresso de Bad-Godesberg de 1959. Coisas bem mais substanciais do que a habitual historieta que põe Durão Barroso como jovem maoísta do MRPP antes de passar para presidente da Comissão Europeia, com prévia passagem pelo centro de desmarxização universal, anti-Bin Laden, da universidade de Georgetown, onde precedeu Nuno Severiano Teixeira.  Talvez até ainda possa ser até mais correcto: Portugal político é o país mais hipócrita do mundo. Porque fez partidos de cima para baixo. E só sobreviveram os que saltaram para o cavalo do poder governamental na ditadura revolucionária dos governos provisórios (PCP, PS e PPD), ou o que teve assente no Conselho de Estado da altura (CDS). Assim se repetiu o salazarismo, que também criou o partido único da União Nacional por resolução do conselho de ministros: Tal como o partido democrata-cristão do Centro Católico Português foi instituído por deliberação da conferência episcopal em 1917. Somos obedientes, reverentes e obrigados, filhos da Inquisição, do devorismo e do partido único de Afonso Costa. Isto é, temos medo do Estado.  E depois de 1974, porque era moda, fizemos democracia com partidos onde os dirigentes estavam à esquerda dos militantes e os militantes à esquerda dos votantes, com imensos fantasmas de direita e imensos preconceitos de esquerda. Felizmente, fomos escrevendo direito por linhas tortas e fazendo história sem processo histórico, porque não é a história que faz o homem, mas o homem que faz a história, mesmo sem saber que história vai fazendo. Por isso é que Marx merece o meu respeito. Viveu como pensou e não pensou como viveu. Marx ainda está vivo. Nixon e Caetano já morreram. Contudo, sempre preferi o partido de Alexis de Tocqueville e de Alexandre Herculano. De Leonardo Coimbra. E de Agostinho da Silva. Não alinho nos grupos revisionistas que transformaram antigos ministros de Salazar e Caetano em inspiradores ou neo-ministros. Viva Marx que nunca foi marxista!

Fev 21

Em busca do paraíso, com algum empirismo e muita aventura

Regresso, quarta-feira de cinzas, depois de alguns dias de Entrudo, onde nada se podia dizer que não fosse carnavalício. Nem sequer podíamos comentar a demissão de Alberto João Jardim no Funchal, a fim de referendar a respectiva revolta contra o colonialismo socialista de Lisboa e encavacar o Palácio de Belém. E seria arriscado comentar a saída de José Miguel Júdice do PSD ou os últimos programas da RTP sobre os “grandes portugueses”, agora que Paulo Portas ameaça falar sobre a situação interna do CDS e Pedro Santana Lopes assiste embeiçadamente revoltado à dissolução da sua equipa autárquica.

É por isso que, ao viajar por alguns blogues da não-esquerda, reparo que começa a emergir uma nova direita, onde há vários artigos de fé. O primeiro é o ter estado com o “não” ao referendo sobre a IVG, porque se proclama que o “sim” era de esquerda. O segundo é aceitarmos que, depois de António Ferro, o novo profeta daquele salazarismo que já existia antes de Salazar é o recente concurso televisivo e os brilhantes documentários que os sustentam. O terceiro é atacar José Miguel Júdice que, mais uma vez, sai do rebanho.

Como não sigo estes três mandamentos da nova coisa, peço que me tirem da lista dos pretensos membros da direita lusitana, embora declare que não é por isso que vou para a esquerda. Fico bem como radical do centro e volto a gostar da atitude do meu antigo líder dos tempos estudantis de Coimbra, o Zé Miguel, tendo ainda mais saudades de outro heterodoxo desses momentos de transição, o Francisco Lucas Pires, dois dos que falharam numa aliança que teria sido necessária para que não vivermos entre Cavaco, Ribeiro e Castro e Marques Mendes, tal como poderemos vir a viver entre Cavaco, Paulo Portas ou Pedro Santana Lopes.

Por mim, que entre os cinco, apenas digo que venha o Diabo e escolha, prefiro continuar a tratar das minhas macieiras, que não incluem as teses de Franco Nogueira sobre o autoritarismo, com filmes realizados por António Lopes Ribeiro, ou a literatura de justificação sobre o caceteirismo e a cedência à Santa Aliança, mesmo que se chame República Imperial. Apesar da minha simpatia pela Maria da Fonte e pela Patuleia, prefiro reler as Trovas de Bandarra, para ganhar inspiração para novas cartas de achamento, em busca do paraíso, com algum empirismo e muita aventura. Apesar de conservador nunca cedi aos “tories”, prefiro desembarcar com John Locke nas praias do Pampelido, perto do Mindelo, e ousar reflectir sobre o PREC à maneira de Burke e de Hayek.

Fev 16

Da Renovação Democrática ao soarismo presidencial

Apesar de ultrapassarmos os noventa e cinco por cento de cidadãos que se dizem católicos, os chamados católicos praticantes não passam de 25% e, destes, ainda há uma fatia significativa que já não obedece aos apelos da hierarquia, quando se trata de votos em referendos. Aliás, julgo que, na prática, só há 5% de gente da esquerda praticante e outros tantos da direita, também praticante, ficando os restantes dependentes, não da manipulação da opinião pública, mas do que lhes interessa em termos de manha. Porque, entre a nossa mistura criativa de pragamatismo e aventura, o pragmatismo acaba por superar o sentido de aventura e quase todos reconhecem que a maioria dos portugueses à solta foi emigrando ao longo dos tempos. E o desencanto continua se passarmos para os temas mobilizadores dos blogues, onde grande parte dos meus amigos discute Salazar , por causa de um concurso televisivo que o coloca como o melhor português de sempre, enquanto outro concurso, da estação rival, o atira para o preciso inverso. Mas nada posso dizer sobre o programa onde o meu amigo e colega Jaime Nogueira Pinto, com toda a coerência, defendeu o ditador, porque não quis mesmo ver a coisa, para não me irritar com o brilhante apologeta de uma figura que, muito liberalmente, detesto e contra a qual tenho muitos fantasmas e outros tantos preconceitos, até pelo que aconteceu a alguns avoengos meus, presos e condenados num processo político a que um tribunal militar especial deu guarida. Prefiro notar esta explosão de Salazar inhos que vai proliferando à esquerda e à direita, em plena democracia geneticamente anti-salazarista, neste regresso ao ambiente mental salazarento, para dizer que me apetecia ser mesmo um português à solta e continuar a procurar Portugal fora de Portugal. Temo apenas que regressemos à tal Salazar quia de que falava Hipólito Raposo, que era monárquico e tudo: A Salazar quia é um regime de constrangimento que oprime a vida do espírito em Portugal, provocando a dissolução moral que diariamente vamos assistindo. Porque a II República do Estado Novo foi a eternização do provisório, algo de ilógico, onde reina uma ordem à maneira sepulcral dos cemitérios (Alberto Monsaraz, também monárquico). Porque Salazar e o regimecometeram o monstruoso erro psicológico de quererem governar este povo com… método geométrico, coercitivo e glaciar, levando a uma rotura no parentesco dos portugueses (Afonso Lopes Vieira, idem). Um governo autoritário, que vive à custa do silêncio dos adversários e nega os direitos do cidadão pode impor-se num país de escravos, nunca a um povo que teve de lutar com extremos de bravura para fundar a sua independência e expandir-se no mundo. Nada de um português do velho cerne pode perdoar do que reduzirem-nos à condição de menor (Jaime Cortesão, republicano e democrata). Julgo que foi liquidado o ambiente de confiança e de respeito pela palavra dada, o que, de acordo com a soberana avaliação individual, me coarcta a possibilidade de assumir, pela realização consensual, a capacidade de sonho, onde a ideia de obra, as regras de processo e as manifestações de comunhão geraram a ilusão de regresso à clássica via da teoria institucional, assumida pelos institucionalistas que acreditam que as criaturas se libertam dos criadores e sabem que “os cemitérios estão cheios de pessoas insusbstituíveis”. Talvez importe permitir que a crueza da realidade se manifeste, para confirmar que chegámos a um momento de encruzilhada, onde só podem actuar e liderar aqueles que põem a ética da responsabilidade acima da ética da convicção, conforme os modelos da politiqueira razão de Estado, isto é, os que consideram como meramente instrumentais os princípios clássicos das instituições, conforme acima sumariei. Entrámos definitivamente no habitual modelo das “guerrazinhas de homenzinhos” e mulherzinhas, para parafrasear Eça, onde todos perderemos, incluindo os vencedores, dado que continuamos a flutuar ao sabor de discursos celestialmente demagógicos dos que, até agora, têm mantido esta confusão entre o poder e o saber, onde todos podem inventar lendas e narrativas, nesses factos que não se confundem com a interpretação dos factos, dado que domina um ambiente de desconfiança, feudalização e quebra da ideia de autoridade, onde esta vem de autor e não dos autoritarismos burocráticos, incluindo os electivos. Isto é, estão abertas as portas à bagunça e aos inevitáveis “césares de multidões”, mesmo que seja um movimento de massas de pretensas elites. E seria melhor acabar com o medo, fazer casar a honra com a inteligência. Porque tentar superar a crise com a criação de ligações de encomendação feudal ou propostas de troca de serviços protectivos é apenas adiar o inevitável processo de “out of control”, propício à inevitável ingerência de potências estranhas à nossa autonomia. Todas as frases que nos hão-de salvar já estão todas escritas, há muitos candidatos a salvadores, mas, na pátria, continua a falta de razão e de emoção, de entusiasmo e pensamento, de ciência e pedagogia, de honra e de inteligência, das tais emergências da lei da complexidade crescente que permitam salvar mesmo a pátria, mantendo a democrática institucionalização dos conflitos e as consequentes convergências e divergências das coisas vivas e dos sistemas abertos.

Fev 16

Contra a salazarquia, os salazarinhos e o salazarentismo

Anteontem, fui convidado, por sugestão de Baptista Bastos, para, no RCP, dar o meu testemunho sobre a falta de auto-estima dos portugueses, onde, utilizando os números do recente inquérito social europeu, lá observei as nossas contradições, entre o teoricamente prático e o praticamente teórico, onde, na prática, a teoria é outra.

Apesar de ultrapassarmos os noventa e cinco por cento de cidadãos que se dizem católicos, os chamados católicos praticantes não passam de 25% e, destes, ainda há uma fatia significativa que já não obedece aos apelos da hierarquia, quando se trata de votos em referendos. Aliás, julgo que, na prática, só há 5% de gente da esquerda praticante e outros tantos da direita, também praticante, ficando os restantes dependentes, não da manipulação da opinião pública, mas do que lhes interessa em termos de manha. Porque, entre a nossa mistura criativa de pragamatismo e aventura, o pragmatismo acaba por superar o sentido de aventura e quase todos reconhecem que a maioria dos portugueses à solta foi emigrando ao longo dos tempos.

 

Basta passar os olhos para as grandes parangonas de hoje, entalados que estamos entre um Fontão da autarquia da capital, que era arguido há um mês, mas não o dizia, e o jogo do gato e do rato entre Maria José Morgado e o senhor Pinto da Costa. E o desencanto continua se passarmos para os temas mobilizadores dos blogues, onde grande parte dos meus amigos discute Salazar, por causa de um concurso televisivo que o coloca como o melhor português de sempre, enquanto outro concurso, da estação rival, o atira para o preciso inverso.

Mas nada posso dizer sobre o programa onde o meu amigo e colega Jaime Nogueira Pinto, com toda a coerência, defendeu o ditador, porque não quis mesmo ver a coisa, para não me irritar com o brilhante apologeta de uma figura que, muito liberalmente, detesto e contra a qual tenho muitos fantasmas e outros tantos preconceitos, até pelo que aconteceu a alguns avoengos meus, presos e condenados num processo político a que um tribunal militar especial deu guarida.

 
Prefiro notar esta explosão de salazarinhos que vai proliferando à esquerda e à direita, em plena democracia geneticamente anti-salazarista, neste regresso ao ambiente mental salazarento, para dizer que me apetecia ser mesmo um português à solta e continuar a procurar Portugal fora de Portugal. Temo apenas que regressemos à tal salazarquia de que falava Hipólito Raposo, que era monárquico e tudo: A salazarquia é um regime de constrangimento que oprime a vida do espírito em Portugal, provocando a dissolução moral que diariamente vamos assistindo.

Porque a II República do Estado Novo foi a eternização do provisório, algo de ilógico, onde reina uma ordem à maneira sepulcral dos cemitérios (Alberto Monsaraz, também monárquico). Porque Salazar e o regime cometeram o monstruoso erro psicológico de quererem governar este povo com… método geométrico, coercitivo e glaciar, levando a uma rotura no parentesco dos portugueses (Afonso Lopes Vieira, idem).

Um governo autoritário, que vive à custa do silêncio dos adversários e nega os direitos do cidadão pode impor-se num país de escravos, nunca a um povo que teve de lutar com extremos de bravura para fundar a sua independência e expandir-se no mundo. Nada de um português do velho cerne pode perdoar do que reduzirem-nos à condição de menor (Jaime Cortesão, republicano e democrata).

Julgo que foi liquidado o ambiente de confiança e de respeito pela palavra dada, o que, de acordo com a soberana avaliação individual, me coarcta a possibilidade de assumir, pela realização consensual, a capacidade de sonho, onde a ideia de obra, as regras de processo e as manifestações de comunhão geraram a ilusão de regresso à clássica via da teoria institucional, assumida pelos institucionalistas que acreditam que as criaturas se libertam dos criadores e sabem que “os cemitérios estão cheios de pessoas insusbstituíveis”.

 

Talvez importe permitir que a crueza da realidade se manifeste, para confirmar que chegámos a um momento de encruzilhada, onde só podem actuar e liderar aqueles que põem a ética da responsabilidade acima da ética da convicção, conforme os modelos da politiqueira razão de Estado, isto é, os que consideram como meramente instrumentais os princípios clássicos das instituições, conforme acima sumariei.

Entrámos definitivamente no habitual modelo das “guerrazinhas de homenzinhos” e mulherzinhas, para parafrasear Eça, onde todos perderemos, incluindo os vencedores, dado que continuamos a flutuar ao sabor de discursos celestialmente demagógicos dos que, até agora, têm mantido esta confusão entre o poder e o saber, onde todos podem inventar lendas e narrativas, nesses factos que não se confundem com a interpretação dos factos, dado que domina um ambiente de desconfiança, feudalização e quebra da ideia de autoridade, onde esta vem de autor e não dos autoritarismos burocráticos, incluindo os electivos.

Isto é, estão abertas as portas à bagunça e aos inevitáveis “césares de multidões”, mesmo que seja um movimento de massas de pretensas elites. E seria melhor acabar com o medo, fazer casar a honra com a inteligência. Porque tentar superar a crise com a criação de ligações de encomendação feudal ou propostas de troca de serviços protectivos é apenas adiar o inevitável processo de “out of control”, propício à inevitável ingerência de potências estranhas à nossa autonomia.

Todas as frases que nos hão-de salvar já estão todas escritas, há muitos candidatos a salvadores, mas, na pátria, continua a falta de razão e de emoção, de entusiasmo e pensamento, de ciência e pedagogia, de honra e de inteligência, das tais emergências da lei da complexidade crescente que permitam salvar mesmo a pátria, mantendo a democrática institucionalização dos conflitos e as consequentes convergências e divergências das coisas vivas e dos sistemas abertos.