Abr 28

A recandidatura a presidente regional de um professor da Universidade Independente

Um quarto de hora antes de morrer, este regime ainda está vivo. Só que o quarto de hora em causa pode, e vai demorar, uma década a passar, a não ser que aconteça um imprevisto, como vai acontecer, vindo de cima, ou vindo de fora. E a agonia decadentista nem sequer pode ser acelerada se alguns dos partidos existentes passarem a alvarás, emprestando siglas a movimentos de cidadãos que contratem actores de teatro para se candidatarem a líderes governamentais, mesmo que seja contra presidentes em exercício que são camaradas do mesmo partido, dado que eles até são melhores actores do mesmo teatro da trágica comédia em que nos vamos enredando.
As recentes cenas dos enredos madeirenses disputam a agenda mediática com as operações saudosistas de Santa Comba, onde um cadáver físico não adiado vai procriando manifestações, para gáudio de manifestantes e contra-manifestantes, onde uns sonham com regressos a ditaduras e outros com ditaduras do contra, quando apetece repetir o que disse o ministro, António Costa, com algum bom senso democrático: «Espanta-me o fervor noticioso em torno desse partido chamado PNR … só o Ministério Público tem legitimidade para intentar uma acção de dissolução de um partido, se entender que há motivos para isso … esse partido é um partido como o meu partido, o PS, o PSD, o CDS-PP ou o PCP. É um partido legal como os outros».

No intervalo, deu-se o regresso de Paulo Portas, com uma excelente intervenção parlamentar, ninguém reparando que durante dois anos ele apenas foi um deputado silencioso, talvez para demonstrar que eles são todos iguais, mas que há alguns mais iguais do que outros, pelo que não espanta que os representantes da nação prefiram biscates, mesmo que seja a ida aos painéis televisivos de comentarismo oficioso, onde recebem cerca de 20 euros por minuto, conforme pode ler-se no último número do “Tal & Qual”.

Voltando ao ritmo jardineiro, se achei piada à técnica do Manuel do Bexiga, com que Manuel Monteiro conseguiu um pontinho na agenda mediática, apenas confirmei o que Francisco Lucas Pires argumentou quando se demitiu do CDS de Monteiro e Portas: para se ouvirem, eles têm de berrar. Porque quando todos ralham, corremos o risco de continuar a ter caravanas situacionistas que passem, de tal maneira que Jardim até pode dizer que as trapalhadas académicas de Sócrates são um “castigo divino”, enquanto a segunda linha da biografia oficial do senhor presidente do governo regional reza que ele é licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, tendo sido professor nos ensinos técnico e secundário. É Professor Convidado da Universidade Independente de Lisboa.

Abr 27

Afinal a polícia também reprime a ilegalidade da extrema-esquerda…

Uma semana depois de Sócrates começar a respirar de alívio, os engenheiros sociais que comandam o “agenda setting” conseguiram driblar os incautos e ficaram a saber que há mais de setenta milhões de blogues indexados, que se criam diariamente mais de 120 000, que se publicam 1 500 000 entradas por dia e que 37% da blogosfera é em japonês, contra 36% em inglês e 3% em castelhano. Do português, não obtive informações. Temos menos votos na blogosfera do que a soma dos sufrágios da extrema esquerda e da extrema direita, expressos nas últimas eleições.

Voltando à nossa agenda mediática, reparo que Paulo Portas está também cada vez menos notório, face ao crescimento dos autarcas arguidos, tal como o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carmona Rodrigues, que foi notificado para ser ouvido, na próxima semana, pelo Ministério Público na qualidade de arguido.

Inesperadamente, reparámos, pelo DN, que um dia antes dos confrontos do 25 de Abril entre a polícia e anarco-libertários no Chiado, em Lisboa, já as autoridades sabiam que os manifestantes pretendiam atacar a sede do Partido Nacional Renovador (PNR) e destruir o cartaz contra a imigração colocado no Marquês de Pombal. Por outras palavras, estes da extrema-esquerda parecem ser directamente proporcionais aos da extrema-direita, para os quais o PGR disse estar atento, e muito bem.

É naturalmente saudável que se detectem estes praticantes do velho desporto do assalto às sedes dos outros e cultivar a memória do 25 de Abril é não repetirmos erros do passado recente e remoto, até porque tanto a esquerda de sempre como a direita de sempre foram vítimas da falta de adequada polícia e de adequado ministério público, quando confundíamos casos de polícia com liberdade de expressão. Já estamos mais crescidos e desde a primeira revisão constitucional que consagrámos a ideia e a prática de Estado de Direito. O ataque a Igrejas, a templos da maçonaria ou a sedes de formigas brancas por formigas pretas, ou vice-versa, inevitáveis degenerescências da sociedade aberta, são espectáculo pouco dignificante e nada de acordo com uma democracia pluralista e competitiva.

Só os autoritarismos gostam da paz dos cemitérios, tal como os totalitarismos preferem os comícios da Cuba de Fidel, ou da actual Coreia do Norte. Os primeiros dizem que quem não está expressamente contra o Chefe é a favor do Chefe. Os segundos dizem que quem não se manifesta expressamente a favor do Chefe é contra o Chefe. Julgo que é saudável a atitude do município de Santa Comba Dão, autorizando a procissão dos saudosos de Salazar, se, a seguir, também autorizar os anti-salazaristas a fazerem a sua. Qualquer proibicionismo abstracto favorece o crescimento clandestino da loucura. Apenas exijo que a polícia e o ministério público cumpram o seu dever. A vida continua e a paz exige institucionalização dos conflitos.

Abr 26

25 de Abril, sempre, contra os escribas dos sucessivos “Anais da Revolução Nacional”

Os regimes, em Portugal, caem de podre porque, muitas vezes, ultrapassam todos os prazos de validade que lhe garantiam autenticidade. Só que a apatia e o indiferentismo gerados pelas manobras da elite no poder, lançam o colectivo numa inércia cobarde, inversamente proporcional ao activismo dos oposicionistas, cujo vanguardismo, marginal face à opinião pública, resulta, precisamente, da frustração de não se sentirem, entre ela, como peixe na água.

No plano das consequências, o golpe de Estado do 25 de Abril de 1974, que Costa Gomes, no plano operacional qualificará como um acaso cómico, é uma espécie de libertação da mola desoprimida que se partiu, para utilizar-se uma expressão de Fernando Pessoa.

É que, como Salazar tinha confessado a António Ferro, o povo português é bondoso, inteligente, sofredor, dócil, hospitaleiro, trabalhador, facilmente educável, culto, mas excessivamente sentimental, com horror à disciplina, individualista sem dar por isso, falho de espírito de continuidade e de tenacidade na acção e de tempos a tempos assiste-se ao fenómeno de nascimento de certas ondas de pessimismo, dessa ânsia de deitar tudo a perder, não se sabe bem porquê, porque sim, desejo infantil de variar, de mudar, de quebrar o boneco para ver o que tem dentro.

Abril é, sobretudo, essa descompressão, inicialmente gerida por uma Junta de Salvação Nacional, donde emerge um Presidente da República, o General António de Spínola, um Governo Provisório e um Conselho de Estado, tudo em nome de um programa do MFA que promete a democracia política pluri-partidária, um desenvolvimento socializante e uma descolonização com autêntica autodeterminação das populações coloniais, admitindo-se tanto a plena independência como a própria permanência na área da soberania portuguesa. Só que o programa é rigorosamente vigiado por uma comissão coordenadora dos jovens oficiais que haviam corporizado o golpe, divididos entre os operacionais, como Otelo Saraiva de Carvalho, e os mais intelectuais, como Melo Antunes, e, além disso, há o povo inorgânico, os homens da comunicação social e da cultura também comunicacional, os restos da oposição clássica e os movimentos políticos nascidos nos crepúsculo do regime, entre estudantes e sindicalistas politizados.

Digamos que nesse dia de 1974 nos vimos livres de um regime que havia sido montado por um avô autoritário, ao estilo do pai tirano, para, depois de algumas cenas de violência familiar, chegar o tempo da geração do pai modernaço e bon vivant, muito viajado, que não tinha problemas de abrir as janelas, porque resistia às correntes de ar. Por isso é que, a certa altura, no fim da década de oitenta, os membros da família, fartos dos laxismos desse pai modernaço, que não gostava de ler dossiers e que até meteu a ideologia na gaveta, pediram ajuda a um tio austero, que nunca tinha dúvidas e raramente se enganava. E é ele que trata de pôr ordem no orçamento, pinta a casa e arranja os caminhos e as cercas do quintal. Por outras palavras, como dizia Ortega y Gasset, todas as revoluções são pós-revolucionárias. Medem-se menos pelas intenções dos primitivos revolucionários e mais pelas acções dos homens concretos que fazem a história, sem saberem que história vão fazendo. Porque, na prática, a teoria é outra…

Vai, a partir de então, viver-se a euforia. Libertam-se os presos políticos. Deixa de haver censura prévia. Regressam os exilados. Surgem à luz do dia os partidos políticos. Álvaro Cunhal atravessa a cortina de ferro e chega de avião ao aeroporto da Portela. Soares vem de Paris, de comboio, e desembarca na estação de Santa Apolónia. Cunhal emociona-se na frieza de ter que cumprir o papel de Lenine. Soares, sem papel, é demagogo, fala em democracia, mas logo clama pela necessidade do fim da guerra. Os portugueses acordam estremunhados de um sono forçado que teria quase meio século de censuras, proibições e repressões. Embriagam-se colectivamente com liberdade de expressão, liberdade de reunião, liberdade de associação. Com liberdade e libertinagem. Há comícios, manifestações de apoio e de repúdio, bem como mesas redondas que debatem o que até então haviam sido os livros proibidos, os filmes proibidos, as palavras proibidas. Todos correm à procura de um tempo que julgam perdido, sonhando viver em poucos dias o que outros povos polidos e civilizados haviam levado décadas a germinar e a consolidar.

São castelos de palavras recortadas dos manuais de um pensamento petrificado, teorias, “slogans”, fraseologias, palavras cheias de letras amontoadas à toa, discursos, palavras cruzadas, num qualquer xadrez sem regras. De madrugada chegara o sonho há tanto esperado, a hora da liberdade, o país da emoção, finalmente recuperado. Abril ressoa a nevoeiro feito aurora, é a revolução de um Portugal mais inteiro, com justiça, com primavera, com nação de corpo vivo. E para muitos, até Spínola se assume como o condestável da lusitana antiga liberdade, ao sinal do antes quebrar que torcer, nesse dia que parece de ressurreição, onde soldados nos dão crenças, horas de sonho, com liberdade e com pão. Quebrando as algemas da tirania, parece que regressa o Portugal marinheiros, dos heróis do mar, do nobre povo, da nação valente e imortal, gritando às armas, às armas da libertação, sobre o silêncio das praias desertas com direito a azuis infinitos. Quase parece que voltam o Quinto Império, as baladas de Bandarra, a Mensagem de Pessoa, as profecias de Vieira, a luz vencendo a bruma, com Camões regressando, numa mão a espada, na outra, a pena. Porque ainda ontem era o triste dedilhar das guitarras, quartos escuros em mansardas e as janelas saudosas sobre os telhados de uma cidade morta, a lua escondida, por trás das chaminés, restos de chuva nas ruas e alguém escondido, à luz dos candeeiros, enchendo folhas brancas de palavras negras, palavras que só ele um dia poderia ler. Agora, a rádio vai trazendo novas de liberdade, diz que os tiranos foram libertados e canta liberdade em hino nacional, tudo parecendo voltar a ser o Portugal-missão. O desencanto seguirá dentro de semanas.

O capitão Salgueiro Maia, em pleno Largo do Carmo, de megafone em punho, anuncia o fim de alguma coisa que qualifica como o Estado a que chegámos. Marcello Caetano quer entregar o poder a Spínola para que não caia na rua, manda Pedro Feytor Pinto ter com Maia, mas este diz que é preciso pedir autorização ao PC, isto é, ao posto de comando do MFA, instalado no quartel da Pontinha, onde funciona a coordenação da movimentação golpista. Feytor Pinto ainda pergunta: quem manda aqui? Respondem-lhe que mandamos todos. Questiona, depois, sobre quem é o mais graduado, mas a resposta de Marques Júnior, Manuel Monge, Otelo, Pinto Soares e Vítor Alves é simples: somos todos capitães.

Contraditoriamente, a Junta de Salvação Nacional retoma o golpismo institucional do reviralho, bem como o próprio sentido hierarquista, como havia sido expresso pela Abrilada de 1961. Mas o movimento dos capitães, em nome da legitimidade revolucionária, acaba por dominar um equilíbrio instável entre esses dois pólos, chegando-se a uma espécie de solução de compromisso, como acontece quando os capitães e majores se transformam em brigadeiros e generais arvorados, enquanto durasse a situação transitória do processo revolucionário em curso. Mas, nos interstícios da inexperiência política, começam a predominar os partisans das células de alcatifa, com que o PCP oleara os mecanismos das chefias militares e com quem Costa Gomes sabe dialogar.

Só que, na rua, a extrema-esquerda, decide lançar o grito de nem mais um soldado para as colónias, clamando contra o exército colonial-fascista, incendiando um rastilho que vai levar à inevitável quebra de comando de um país que, apesar de pensar-se em festa, continua em guerra. E, no teatro das operações, algumas tropas logo começam a abandonar os aquartelamentos e a dirigir-se para os principais centros de concentração urbana, desertificando a quadrícula do interior e desguarnecendo as fronteiras da Guiné, de Angola e de Moçambique. Misturando-se a inevitável quebra de vontade de combater com alguns sentimentos anti-coloniais, gera-se a principal contradição do processo, dado que as forças no terreno não podem esperar pela decisão do comando do processo. O ambiente de vivório e foguetório propaga-se até àqueles que estão destinados a conter a guerrilha e as tropas portuguesas começam a confraternizar com os antigos adversários.

Os inúmeros projectos político-partidários obedecem quase todos ao mesmo ritual. Em dois ou três meses há que fazer o que noutros países levou décadas. E tudo num ambiente de slogans
No dia 1 de Maio, multidões invadem as ruas e as praças e os cravos vermelhos consolidam-se como símbolo de um tempo novo, ao som dos discursos de Mário Soares e Álvaro Cunhal. O povo explode em manifestação organizada pelo espectáculo das palavras de ordem, com um Zé povinho a vestir-se de mariana reivindicativa, confundindo a revolução com uma grande festa. Cunhal e Soares tentam liderar o movimento de rua e juntam-se no antigo Estádio da FNAT, em Lisboa. Soares volta ao verbalismo demagógico e clama roucamente contra o governo fascista e colonialista de Marcelo Caetano, dizendo que foi hoje e aqui que destruímos o fascismo, arengando contra o baronato político-corporativo e os agentes do imperialismo estrangeiro. Cunhal, mais calculista, julgando repetir Lenine e o livro do processo histórico, fala na revolução do 25 de Abril e apela para a unidade da classe operária e das forças democráticas, clamando contra a guerra. E, num gesto ensaiado, termina o discurso abraçado a um marinheiro e a um soldado, desprezando a tal unidade antifascista das forças democráticas. Pereira de Moura fica ao lado e de lado. A transmissão em directo do espectáculo do povo unido começa engasgada nessa cena de palco, bem ensaiada. É uma liberdade condicionada e rigorosamente vigiada pelo aparelho militar revolucionário. Fartávamo-nos de opiniões, de opiniões de muitos outros, que não é a opinião que cada um tinha, mas a opinião que convinha e que todos fingiam ter, mesmo quando não a tinham. Porque todos temiam quem eram, donde tinham vindo ou para onde iam. Porque todos tentavam ser o equilíbrio das aparências que a hipocrisia social impunha.

Às quatro da tarde do dia 9 de Setembro de 1836 desembarcam no Terreiro do Paço, os deputados oposicionistas do Douro e da Beira, vindos no vapor Napier. São esperados por uma manifestação de cerca de 6 000 pessoas, num ambiente de vivório e foguetório, animado por bandas de música.

Cerca das nove da noite batalhões da Guarda Municipal concentram-se na Praça do Príncipe Real (então Patriarcal Queimada) e, com a populaça, os insurgentes dirigem-se ao Rossio onde dão vivas à Constituição de 1822. Pouco antes em Espanha (12 de Agosto), uma revolta em Madrid tinha obrigado Maria Cristina a repor a Constituição de Cádis de 1812. Tropas do Governo, chamadas para reprimir a sedição, logo confraternizam com os revoltosos. Uma deputação destes entrega um ultimato à rainha nas Necessidades, sendo escolhido, para a liderar, face à recusa de Sá da Bandeira, o conde de Lumiares. Na reivindicação apresentada à Rainha, redigida por Soares Caldeira, consta a imediata proclamação da constituição de 1820 com as modificações que as cortes constituintes julgarem por bem fazer-lhe. O Conselho de Estado sugere à rainha que se submeta às movimentações e às oito da manhã já desfilam os vencedores com louros nas espingardas, depois das hortênsias de 1832 e dos cravos de 1974.

Saldanha regressa a Lisboa, vindo de Roma, sendo esperado e saudado por uma multidão de cerca de seis mil pessoas, com vivório, foguetório e bandas de música (4 de Julho de 1865).

Na noite de 26 de Janeiro de 1914, Afonso Costa promove cortejo de apoio aos democráticos, com o tradicional vivório e foguetório, onde não faltam filarmónicas e um balão à veneziana; a manifestação é dispersa por oposicionistas com cenas de pugilato no Rossio. Bandos de formigas pretas chegam a cercar o jornal O Mundo. Segue-se manifestação oposicionista nocturna, do Largo de Camões para Belém, organizada por Machado Santos, Júlio Martins, Carlos da Maia e Rocha Martins, onde se exige a queda de Afonso Costa, amnistia para todos os presos políticos e reabertura das associações sindicais encerradas. Entram na manifestação sindicalistas armados de archotes, a partir da Avenida 24 de Julho. Almeida e Camacho recusam participar e os comerciantes de Lisboa não fecham as portas.

Gomes da Costa toma posse como Ministro da Guerra e interino das Colónias, juntamente com Felisberto Pedrosa, nomeado no dia anterior (7 de Junho de 1826). Continuam sem ocupação os lugares de ministro das finanças, devido à renúncia de Salazar, bem como o do comércio e comunicações. No mesmo dia, Parada da Vitória na Avenida da República, com 15 000 homens. Assiste o corpo diplomático. Rocha Martins confessa que, nesse dia, estando perto de Sinel de Cordes, durante o desfile lhe diz: que bem que fica o Gomes da Costa a cavalo. Sinel, entre risadas dos que assistem à cena, responde: oxalá se aguente muito tempo no selim.

A besta continuou a cavalgar-nos durante meio século, devido aos sucessivos escribas dos Anais da Revolução Nacional.

Abr 25

Pedimos desculpa por esta interrupção, o 25 de Abril segue dentro de momentos

Confesso que tanto não fui à inauguração do túnel do Marquês, como também não participei no desfile comemorativo, por não haver discurso do Gato Fedorento. Estive ontem a comemorar mil oitocentos e vinte. Mas não posso deixar de me congratular com o discurso do PSD contra o controlo da comunicação social por parte do PS, depois da renomeação de Pinto Balsemão como dono da SIC.

Esperemos que a próxima inauguração do aeroporto da Ota tenha mais consensualidade, dado que circula a notícia de restauração do Conselho Superior das Obras Públicas, constituída por todos os professores catedráticos de engenharia civil que não têm empresas de consultadoria e que se dedicarão a dar fundamento técnico a decisões políticas desse teor. Nada de estranhar, portanto, quanto aos meus não comentários sobre as eleições timorenses e francesas, da mesma forma como ainda não tenho opinião sobre a repressão ao movimento Falun Gong por parte de Pequim. Pedimos desculpa por esta interrupção, o 25 de Abril segue dentro de momentos.

Abr 23

O plágio da era pós-ideológica e o fim do beatério democristão, com fins de semana em Odemira

Nova semana, vida velha, depois de Mário Soares já criarfactos políticos, depois de Portas vencer Ribeiro e Castro, depois de Santana Lopes ameaçar regressos, depois de Manuel Monteiro dissertar sobre o que deve ser a direita, depois de Sarkosi e de Royal, entre o “sonho francês” e o “patriotismo republicano”. Hoje fixo-me em Portas. Porque 5 642 pessoas o escolheram como novo líder de um novo ciclo velho, face ao renovado PP que volta a deixar de ser CDS. Isto é, o ritmo das directas partidárias está cada vez mais parecido com o fulgor eleitoral dos grandes clubes de futebol, onde até asclaques juvenis são a maioria dos sócios.

Portas reassume assim um estrelato idêntico ao de Pinto da Costa, Luís Filipe Vieira ou Soares Franco, sem necessidade de passar pelo exame das discursatas e golpadas de corredor dos velhos congressos, com as suas barganhas de notáveis de província, à espera de um lugarzinho nas listas para deputados. Em vez de um fim de semana com mil militantes num hotel de três estrelas, eis que, dos ditos 44 000 000 inscritos, apenas uma visita às urnas de cartão de 7 563 votantes. Por outras palavras, um dos cinco maiores partidos portugueses mostra assim, perante a opinião pública a sua efectiva dimensão de paróquia, principalmente quando abandona os níveis metafisicamente representativos e se dissolve num populismo sem espectáculo de luzes e balõezinhos.

Daí que tenha perdido brilho o discurso dito de vitória, onde se proclama o “espírito de conquista” e a promessa de construção de “um grande partido de centro-direita”. Daí que só alguns guardadores de slogans tenham reparado que a novidade de Portas seja uma repetição de um tópico emitido, há um quarto de século, pelo social-democrata sueco, Olof Palme, sobre a era pós-ideológica. Coisa compreensível depois da derrota dos católicos no referendo do aborto e do esmagamento do beatério democrata-cristão de Zé Ribeiro e Castro, apesar dos entusiásticos apoios recebidos da ala hindu e de certos neoconservadores.

Logo, Portas prefere os conceitos indeterminados e a cláusula geral de um vazio doutrinário, mas sem ousar um apelo à costela liberal. Fica-se pela encruzilhada de uma personalização do star system e pela repetição doagenda setting, rivalizando com Maria José Nogueira Pinto na mobilização blogueira dos neocons e neolibs da revista Atlântico e dos blogues satélites. Zé Castro ficará no combate pela boa ideia de Europa, citando Bento XVI e caminhando, como homem só, pelas ruas desertas de Odemira. Só que, na TVI, já não manda o Zé Eduardo nem a Manela, mas um cardeal republicano, laico, hispanista e socialista, enquanto a SIC tem problemas de facturação e apoiará, invitavelmente, o próximo estrelato do PSD. Nada de novo, na frente Sudoeste deste flanco do europês, onde manda cada vez menos a Conferência Episcopal Portuguesa, já sem direito ao seu Centro Católico Português.

Abr 20

De como o capital pode ter pátria.

Um segurança de discotecas foi o único dos 10 elementos de extrema-direita, detidos quarta-feira pela Polícia Judiciária, suspeitos de discriminação racial, a ficar em prisão preventiva. Em vez de extrema-direita, alguns jornais põem claques de futebol, como poderiam pôrportugueses que gostam de dizer que são brancos, racialistas e identitários. Isto é, foi tudo tão bombásticoquanto a conferência de imprensa da UnI protagonizada por militantes do PS, embora nenhum assessor da PJ ou do MP tenha previamente declarado tal. O submundo dos espectáculos de música pimba e folclore de extremistas de direita ou de esquerda subiu episodicamente ao palco.  E é nas contracurvas e meandros deste ritmo que emerge a figura de Pina Moura a suceder a Anadia no comando de um dos principais fazedores de valores e de notícias de uma Lusitânia onde já uma vez perdeu o partido de Febo Moniz. O antigo bispo que nos andava a dar hispânica electricidade, parece agora mudar de energia cardinalícia, indo competir com Balsemão, no comando da rede do chamado quarto poder. Esperemos que continue marxista-estalinista e que pratique o velho esquema segundo o qual o capital não tem pátria… Por essa e por outras é que aqui na minha aldeia de Belém, hoje somos todos belenenses, sonhando que pode ser desta que iremos mais uma vez dar uma volta à estátua de Afonso de Albuquerque. O Doutor Cavaco, que é nosso vizinho mais recente, que fique a saber que no jardim diante do seu palácio, há um banquinho de pedra sagrada onde foi fundado o clube cá do bairro e que esse é lugar de romaria desta pequena minoria dos adeptos do Matateu, do Zé Pereira e do Vicente, pelo que daqui mando o meu sentido abraço ao ajudense Helder Costa, meu colega e resistente de sempre, bem como ao jovem Pedro Guedes, sempre fiel ao seu reduto.

Abr 19

Polícias de ideias, nunca mais!

Apenas estamos a assistir à tradução em calão de movimentos exógenos, como consequência da própria integração europeia, invocando-se nacionalismos estrangeirados, contrários à ecologia da pátria portuguesa e até ao próprio ideário do autoritarismo salazarista, que proibiu os nacionais-sindicalistas e mandou a PIDE em 1945 caçar os nazis que aqui se encontravam exilados. Salazar nunca perdoou o que eles fizeram ao seu companheiro de ideias austríaco, Dolfuss. Não podemos tratar, como questão ideológica, um simples caso de polícia e eventuais crimes de uso de arma ilegal ou de discriminação racial. A polícia deste Estado de Direito deve continuar a tradição que levou Otelo à prisão, não por ele ser esquerdista, mas por associação criminosa, de que foi amnistiado, com um juiz que era camarada ideológico dele a cumprir o seu dever. Aliás, mesmo hoje, pode haver um juiz de convicções fascistas que persiga criminosos, não por eles serem fascistas, mas por serem criminosos. A ETA em Espanha é perseguida, não por ser socialista revolucionária, ou independentista, mas por ser terrorista. Já não está em vigor o conceito sovietista de contra-revolucionário, com direito a ingresso no Gulag, ou o conceito hitleriano de Gegenreich, com bilhete para o exílio ou para o campo de concentração. A sociedade pluralista e aberta do actual Estado de Direito assenta em valores que têm como adversários a intolerância, o fanatismo e a ignorância, mas nem por isso pode proibir ideias que defendam a intolerância, o fanatismo e a ignorância. Porque houve ilustres filósofos e pensadores adeptos do totalitarismo no século XX e seria estúpido passá-los pelo silêncio. Porque a sociedade demoliberal costuma reciclar os seus inimigos. Os do século XIX, dos socialistas ao clericalismo, passaram a sociais-democratas e a democratas-cristãos, e trataram de ser os principais gestores do modelo depois de 1945. Para, nos finais do século XX, antigos comunistas se converterem ao pluralismo (veja-se o PDS italiano e os nossos ex-PCP e ex-MRPP), ou antigos neofascistas passarem a pós-fascistas (veja-se o caso de Fini e de analogias lusitanas do mesmo teor) , ambos como ilustres ministros de governos do pluralismo democrático na Europa Ocidental. Seria estúpido que caíssemos nas armadilhas de certoscaça-fascistas, para quem um extrema-direita até pode ser um conservador maçon como Churchill, o tal que liquidou o nazi-fascismo, ou um integrista teológico como Karol, depois João Paulo II, que derrubou os muros. Os segredos da liberdade têm que ser geridos pelos liberdadeiros e não pelos herdeiros da Inquisição ou dos moscas do Intendente.

Abr 18

UnI, UPAC, desgastes, e a eterna metamorfose dos donos do poder

Porque, entre nós, continua a viver-se intensamente o conflito entre o velho partido dos fidalgos, do intendente Pina Manique, e o menos velho, mas já idoso, partido dos funcionários, com saudades de Sebastião José. Com o primeiro a querer desencadear a habitual Viradeira. Com o segundo a querer servir a revolução institucional, herdeira das marquesadas. Com os dois, esperando a chegada de el rei Junot e o posterior devorismo. De um lado, a lógica dos privilégios herdados, dita defesa dos direitos adquiridos, onde, por usucapião, se garantem anteriores latrocínios que os sucessivos situacionismos legalizaram, quando promoveram a aliança casamenteira entre os velhos e os novos ricos, para que Proudhon viesse proclamar que toda a propriedade é um roubo. Prefiro deter-me nas Universidades lusitanas, as tais que resistem à custa de estudantes sem o Secundário, de acordo com o modelo que permite entrar no Ensino Superior a quem tenha mais de 23 anos. Já há instituições onde mais de metade das vagas são preenchidas com estes alunos. Do outro, a ilusão racional-normativa do partido dos funcionários, logo traída por esse eterno estado de transição dos “jobs for the boys”, dependente da mesa do orçamento, onde os buracões da lei permitem que doutorandos expulsos por plágio se doutorem na raia de Espanha e aqui entrem com mero registo automático, para bem daquela constituição europeia que obriga a um júri de equivalências para um doutor vindo de Harvard ou da USP, mas o dispensa para uma universidade privada da Letónia. Daí este místico conceito de universidades privadas, plataformas do conúbio e da barganha entre a partidocracia, os patos bravos e a fábrica de títulos para a nova fidalguia doutoreira e engenheiral, onde o Estado vai lavando as mãos como Pilatos, permitindo o negocismo e o laxismo. Sempre a metamorfose dos donos do poder, lendo muitos papéis, muitos papéis que vãotapando o sol da verdade com a peneira de um processualismo, onde os sacristães perderam o sentido dos gestos. Não precisamos de nomear a Maria José Morgado inspectora geral do ensino superior. Basta um vicentino juiz da Beira, que se assuma como Sancho Pança do bom senso, para que venha uma sentença justa que faça fraude ao legalismo em nome da verdade e da equidade, para que o povo confie no Estado que deve voltar a ser pessoa de bem. Alguém que diga que é tão grave a compra de poder, dita corrupção pelo Código Penal, quanto a compra da inteligência, do saber e da ciência, pela eliminação desse misto de intelectual e de serventuário, a que Gilberto Freyre deu o belo nome de intelectuário. Será que o ministro vai afinal gaguejar? Será que a UPAC vai mesmo descobrir o Brasil e furar a eterna política de sigilo? Será que depois da defenestração vai entrar, pela porta grande do palacete das vaidades, o que foi mandado para a lixeira do pátio através do espectáculo transmitido em directo a partir do varandim? Será que nenhum Pêro Vaz de Caminha vai escrever a nova carta de achamento de esqueletos no sótão?

Abr 17

In our time, political speech and writing are largely the defence of the indefensible

Em dia de não haver espectaculares notícias sobre a ponta visível desse “iceberg” da crise universitária, dito UnI mais engenhocas, passo os olhos pela memória dos professores e pensadores saneados pelas fúrias construtivistas dos novos regimes, quando eles ainda tinham a ilusão de transportar, pelo decretino soberanista, o camartelo dos “amanhãs que cantam” e tratavam de destruir as fachadas e as fundações das respectivas heranças, esquecidos que estavam da circunstância de todas as revoluções serem pós-revolucionárias. Assinalo os zé agostinho de macedo de todos os tempos, das contra-revoluções aos prec, e tudo simbolizo com um José Acúrsio das Neves a morrer numa choça. Power is not a means, ist an end. One does not establish a dictaorship in order to safeguard a revolution; one makes the revolution in order to establish the dictatorship (George Orwell). Temo que continuemos a mudar com o furor dos caceteiros e dos pingos de cêra, a escavacarem a inteligência, onde há sempre um Frei Fortunato dito de São Boaventura a presidir a uma comissão de avaliação, para o estabelecimento de um novo compêndio único, ad usum das unhas rapaces de um qualquer cardeal Cunha , assente no seu antro. Temo que, no exílio, na prisão ou na morte cívica, tenhamos que continuar a comer o pão amargo da liberdade, só porque os regeneradores não querem aproximar-se da vontade de sermos independentes nessa balança da gestão de dependências que sempre foi a balança da EuropaWar is peace. Freedom is slavery. Ignorance is strenght (George Orwell). Julgo que é possível cicatrizarmos muitas dessas feridas e estabelecermos um novo sentido de bem comum, se não cairmos nas tentações magnicidas, ou nas ilusões salvíficas. Já há trinta anos que não há memória de persiganga e saneamentos, com fradescos, caceteiros e sargentadas. O que agora temos é a cruenta verdade de não ser verdade o discurso sobre a sociedade de certificadas qualificações, comparatistas avaliações, justos “benchmarkings”, honestos “outsourcings” e reais “e-learning” e “e-government”. In our time, political speech and writing are largely the defence of the indefensible (George Orwell). Ainda estamos a tempo de mobilizações para o bem comum e de retirarmos os melhores do activismo abstencionista, limpando as trapalhadas reformistas e partidocráticas onde nos enredaram. Nestas matérias, eu já vi muitos porcos a andarem de bicicleta e não estranharei se deparar com seguidores de Amparo Cuevas, aliados a psicopatas militantes, elaborando planos de limpeza dos escombros de um sistema definitivamente abalado na sua credibilidade. All animals are equal but some animals are more equal than others (George Orwell). Precisamos apenas de juntar pontas de meada, mesmo que se façam rupturas relativamente a este crescente desencanto, onde todos lêem os mesmos manuais de procedimentos, onde todos se deixam deglutir por este ritmo, comandado por um novo “big brother” desta “animal farm”, onde todos somos iguais, mas onde só uma pequena minoria de privilegiados é mais igual do que a maioria dos outros, isto é, dos que continuam em desespero, na anomia da história dos vencidos, sem direito à revolta. Who controls the past controls the future: who controls the present controls the past(George Orwell). O próprio D. Sebastião científico que nos prometia os “amanhãs que cantam” também chegou ao seu próprio “fim da história”. Quando é que nos deixamos de sectários colectivismos morais? The Catholic and the Communist are alike in assuming that an opponent cannot be both honest and intelligent (George Orwell).

Abr 16

O poder enlouquece, o poder absoluto enlouquece absolutamente

Depois de ler as avaliações dos Professores Doutores Diogo Freitas do Amaral e Marcelo Rebelo de Sousa sobre prova oral do Engenheiro José Sócrates, podemos, finalmente, seguir o conselho do Senhor Presidente da República e tratar os problemas do país, dado que, atendendo à notícia hoje publicada pelo DN sobre a distribuição de títulos na Assembleia da República, onde apenas há onze doutorados, a esmagadora maioria dos actuais deputados lusitanos não poderia legalmente ser tratada por “sôtores”, mas apenas por “senhores licenciados”, de acordo com os rigores da lei vigente. Isto é, a esmagadora maioria dos representantes da nação, tal como a dos professores que temos, usurpa um título, dado que todos eles apenas têm licença para continuação dos estudos, de acordo com a etimologia e a designação institucional do canudo. O poder enlouquece, o poder absoluto enlouquece absolutamente (Alain).

Infelizmente, o fundo da questão continua a fugir-nos da lupa da investigação e quase me apetece contar uma história real, em que participei, quando um ilustre político em funções me chamou ao respectivo gabinete de poder, solicitando-me que o ajudasse, na presença, aliás, de um terceiro, seu colega de função, a escrever uma carta de exoneração, porque tinha um ilustre colaborador, de outro partido, que deveria ser preso em flagrante, por actos de corrupção. Ajudei-o naturalmente. Mas, no fim da labuta, perguntei-lhe se ele já tinha comunicado a coisa ao respectivo chefe de partido. Ele respondeu-me que não, porque o dito estava no estrangeiro e só voltaria dentro de dias. Power tends to corrupt and absolute power corrupts absolutely (Lord Acton).

A carta foi escrita. O chefe regressou e a carta não foi enviada. O corrupto continua impune. O tal meu amigo continua nas mesmas funções. E o referido chefe continua a brilhar ainda mais. Todos eles são considerados exemplos de bons e extraordinários políticos e enchem-nos os olhos e os ouvidos de discursos sobre a moralidade política. À excepção do tal colaborador corrupto, onde aparecem cada vez mais sinais de que, mais dia, menos dia, será apanhado. It has been said that power tends to corrupt, but that loss of power tends to corrupt absolutely (John Ruskin).

Esse político, meu amigo, talvez por remorso, nunca mais me contactou. Continuo a considerar que ele é honesto, mas tratei de o incluir na categoria dos incorruptíveis que sobrevivem pela boa gestão de corruptos que sabem fazer. Dos que chegam ao fim do dia e fazem o respectivo exame de consciência, concluindo que, por acção e omissão, ao somarem as colunas do bem e do mal, reparararam que a balança pendeu para a primeira opção. Corruption, the most infallible symptom of constitutional liberty (Edward Gibbon).

Tenho a certeza que esse tal político meu amigo, se lhe dessem o estatuto de arrependido, poderia, ao pôr a boca no trombone, desvendar as teias e os apitos que alimentam esta rede de canalhocracia em que estamos envolvidos, dado que uma pequena minoria de corruptos está a estragar a imagem de uma maioria de políticos honestos, que são deglutidos pelos inferno das boas intenções. É a isto que chamo sistema e que se transformou num mostrengo. Flattery corrupts both the receiver and the giver (Burke).

Acrescento que nada há de novidade debaixo do sol da sociedade aberta e pluralista. Mesmo na história de anteriores regimes políticos portugueses, esta degenerescência sempre aconteceu, tanto na monarquia liberal como na Primeira República. Mas hoje, há um aparelho de leis e de magistrados como, anteriormente, não existia, pelo que é, no mínimo, pisarmos as raias da incompetência, deixarmos que a degradação continue. Among a people generally corrupt, liberty cannot long exist (Burke).

E lá volto à azáfama das aulas, onde a recepção da bolonhesa ameaça muita massa mal cozida e bastante carne picada de duvidosa proveniência. Valem-nos os molhos, ingredientes, especiarias e outros condimentos que disfarçam a realidade. Basta fazer contas: onde antigamente havia quatro anos de licenciatura, dois de mestrado e outros tantos de doutoramento, há agora três, no primeiro grau, um, no segundo, e eventual chouriçada no terceiro. Por outras palavras, graças à concorrência e à mobilidade, grande parte das escolas pode cumprir o primeiro grau, mas já não atingirá o segundo, pelo que os orçamentos de Estado assistirão à redução dos cogumelos, sem terem que declarar entidades em degradação pedagógica ou que atender às sugestões das comissões de avaliação.

Se eu pudesse influenciar quem manda, em vez de lavar as mãos como Pilatos e de ser vítima da celestial demagogia dos profissionais do reformismo, aconselhava um pouco mais de patriotismo científico e uma adequada estratégia, para a gestão dos recursos escassos. Na minha área, por exemplo, seguia o modelo francês de concentração de esforços no ensino superior público, independentemente dos interesses dos concordatários e dos que andam na procura do lucro. Por outras palavras, tinha bom senso…