Tal como aconteceu em Janeiro de 2004, volto a proclamar: confesso que fiz greve. Continuo como insindicalizável, liberal e de direita, mas opto por reagir contra esse símbolo do poder que é a ex-sindicalista e directora-regional de educação do norte e todos os restantes repetidores do domínio burocrático do ninguém. Repito o que, sobre a greve de 2004, escrevi: O que nos falta é uma adequada cultura de Estado de Direito, capaz de eliminar, pela raiz, os “tumores” dos micro-autoritarismos ministeriais, secretariais e sub-estatais, onde inúmeros bonzos, ministeriais e autárquicos … continuam o absolutismo, dizendo que tem valor de lei tudo aquilo quanto vociferam, sob o nome de ordens, e não estando dependentes da ordem geral e abstracta que dão aos subordinados. O que faz falta, não é animar a malta, é um pedacinho de patriotismo científico. Assinei o livrinho de termos, autorizando o registo nominativo do meu acto de greve, apesar de o considerar inconstitucional. Reparei que alguns colegas muito à esquerda não aderiram, uns por razões financeiras e outros com a pilática desculpa de hoje não terem aulas. E lá tive que dizer a um ilustre situacionista que assumia, em coerência, a minha atitude, repetindo o fiz em 2004 com um governo de não-esquerda. Cá para dentro de mim, apenas recordei que, além de ter sido um activista de comissões de trabalhadores anti-PCP, lá em 1976, também fui, na época, candidato à direcção do primeiro sindicato da função pública e fundador de um sindicato da UGT que ainda hoje mexe e que, aliás, me convidou para participar num seminário no próximo mês de Outubro. O tipo que me verberou, ilustre PS de hoje, andava então pela UDP… O senhor ministro das finanças ganhou o gosto pelo microfone e pelo palco mediático. Comentou a greve, à boa maneira de um capataz do patrão Estado, mas não deixou de dizer que a culpa pela exigência de dados nominais sobre os grevistas, bem como a obrigação de comunicação fiscal das doações entre familiares cabe exclusivamente aos serviços da sua administração directa, isto é, à sua direcção-geral não sei quantos, que tem o director-geral em dias de fim e que, portanto, até pode ser diabolizado por quem há pouco tempo o santificava. Pilatos não faria melhor discurso. Aliás, essa “pura iniciativa da administração” não iliba o ministro que é o responsável directo por essa mesma administração, para as coisas boas e para as coisas más. Mesmo depois de, há meses, o próprio primeiro-ministro ser interpelado directamente sobre uma dessas matérias na televisão, negando o que afinal existia.
Monthly Archives: Maio 2007
Bolonha, quando havia uma corporação de estudantes e professores, apoiada pelos reis e homens bons das cidades, ao serviço da república
A herança absolutista que nos enregela continua a considerar que público é aquilo que vem, muito verticalmente, de cima para baixo, de sua alteza o estadão para a planície unidimensional dos súbditos. Em segundo lugar, a mesma herança colectivista e antiliberal também confunde o privado com o lucro, tal como atribui ao concordatário o monopólio do místico e do espiritual. Em terceiro lugar, interpreta o regime constitucional do Estado de Direito, de acordo com a mentalidade regulamentarista do princípio da legalidade. Esta instituição plurissecular chamada universidade, que já existia antes de haver Estado, enreda-se na política de sigilo do estadão e não consegue que se invente um estatuto adeuado à sua natureza, para a situar no seu verdadeiro lugar: aquilo que, muito à maneira anglo-americana se chama sociedade civil e que, entre nós, se deveria dizer o sector comunitário, que não tem de ser público nem privado, mas uma ideia de obra, um sistema de autonomia, onde as regras vêm de baixo para cima, e a inevitável manifestação de comunhão entre os respectivos membros. Quando Bolonha, a do século XIII, espalhou o processo de restauração da academia de Platão e do liceu de Aristóteles por toda a Europa, ainda não havia Maquiavel, o inventor do Estado, nem Bodin, o inventor da soberania. Havia uma corporação de estudantes e professores, apoiada pelos reis e homens bons das cidades, ao serviço da república. Não havia ainda despotismo ministerial, partidocracia, nem centralismo governamental ou parlamentar, com o seu direito administrativo, de absolutista marca, incluindo a da democracia absolutista. Eu tenho saudades de futuro. E, em termos universitários, sou mesmo corporativista, isto é, pelo corporativismo pluralista, federalista e de associação, inimigo do corporativismo de Estado do salazarismo, que estragou a palavra e me obriga a falar em anglo-americano, reclamando para a universidade a autonomia da sociedade civil. Logo, não podia haver uma universidade dita privada, maioritariamente detida por um autarquia local, onde o presidente, com menos de catorze de licenciatura, era o presidente da direcção, alimentado sem vencimento, mas com gasolina, refeições e senhas de presença, enquanto acumulava com as funções de presidente da assembleia da mesma autarquia, tornando-se depois o futuro presidente do partido que tinha a maioria na mesma chafarica. A advogada que logo avençou seria também a vice-presidente do seu partido. O autarca com quem estava aliado seria afastado do respectivo partido quando se zangou com o chefe. Julgo que não será aconselhável deixar que esta classe política monopolize a discussão sobre a matéria.
Neste ambiente inquisitorial, onde a história pode voltar a ser o género literário mais próximo da ficção
Continuo a integrar o partido de el-rei D. Dinis, como me ensinou mestre Agostinho, lá na Travessa do Abarracamento de Peniche, entre gatinhos e sinais templários, com algum lume da profecia e muito mais lume da razão. Mas não tenho pergaminhos espirituais suficientes para tal missão. Como jurista de base e mau cristão, sou cartesiano e laicista demais para poder dialogar com o infinito e, além disso, potencial vítima de um qualquer hierarca decretino em excesso de zelo, que bem pode mandar um dos seus espiões ler estas linhas, para imediata denunciação de ouvida junto do senhor director, ou da senhora inspectora, neste ambiente onde a história continua a ser o género literário mais próximo da ficção. Ao contrário dos que julgam que estou a fazer ironia, tenho de confessar publicamente que já fui vítima deste inquisitorialismo de trazer por casa, quando me processaram com toda a lícita desonestidade. Vale-nos que ainda há activistas do Espírito Santo e uma ampla maioria de socialistas liberdadeiros, com quem lutei pela liberdade, quando muitos cristãos-novos do actual partido da rosa ainda eram idiotas úteis dos nossos totalitarismos e autoritarismos. Hoje não passam de burocratas executores do salazarismo permanecente. Nem sequer foram promovidos a intelectuários, apesar de orgânicos.
Não deixemos que a máquina estatal, paga pelo suor dos contribuintes, se fragmente em neofeudalismos partidocráticos
Não vale a pena alinhar em certos delírios oposicionistas que, tomando como pretexto as “gaffes” e gafarias que ensombram o executivo, acabam por entrar no ritmo da caricatura propagandística. Os vícios do centralismo e do autoritarismo são uma possibilidade que pode afectar um qualquer detentor do poder. Também eu temo este agigantar do poder de ninguém, típico do comunismo burocrático, onde o clamor público do direito à indignação apenas consegue parangonas e ritmo contestatário de telejornal quando a pretensa vítima, dizem que a sexta, é um ex-deputado. Porque os vícios do micro-autoritarismo subestatal podem continuar a ser os anónimos cidadãos que não conseguem furar o bloqueio desta democratura de silêncios. Já Montesquieu observava que quem detém um qualquer pedaço do mesmo poder tende a abusar do poder que dispõe. Por isso, apontava para a clássica balança receita da separação e divisão do poder e dos poderes, pelo estabelecimento de um sistema de pesos e contrapesos, de poderes e contrapoderes, onde, para cada acelerador, se deveria estabelecer um travão, naquilo que, outrora, Cavaco Silva qualificou como forças do bloqueio. Julgo que as recentes crises têm a ver com a nossa falta de cultura pluralista, que tanto tem afectado o absolutismo do despotismo ministerial, como certo absolutismo democrático que lhe sucedeu. Onde, em vez de um rei absoluto, se colocou a absoluta abstracção do povo. Com efeito, o chamado povo, como tal, nunca esteve nem estará no poder, dado que quem efectivamente o gere são os chamados representantes, como se dizia o antigo rei absoluto ou como se dizem, actualmente, os deputados eleitos e os governantes que aqueles sufragam. Acontece apenas que estes representantes, directos ou indirectos, dependem do sistema de canalização que os elevou ao palco do estadão democrático. Isto é, dependem de duas formidáveis máquinas que podem desfocar a relação directa com o eleitorado. A montante estão os oligárquicos mecanismos da partidocracia. A jusante, os verticalistas processos dos aparelhos da administração do chamado Estado. E tudo se agrava quando se elimina o sistema de competência e de carreira do velho conceito weberiano de burocracia racional-normativa e se faz um curto-circuito da partidocracia para a burocracia, com a criação dos tais jobs for the boys and girls, nomeadamente com directores-gerais da confiança política, ou pessoal, dos senhores ministros. Porque se transporta para jusante a poluição existente a montante. Logo, uma qualquer ministerial figura, marcada pela partidocracia, não pode lavar as mãos como Pilatos por um acto de um seu director-geral, nomeado segundo o critério da confiança política. Não pode invocar a autonomia institucional de uma qualquer direcção-regional, dado que o vértice é imediatamente responsável por tudo quanto emerge na fileira dos directamente dependentes. Não lhe é possível dizer, de acordo com o princípio da subsidiariedade, que uma entidade de ordem superior não pode interferir na esfera de autonomia de um seu directo inferior. Esse modelo funciona quando há um complexo de esferas autónomas em razão da sua natureza, onde a que tem menos espaço na hierarquia nem por isso perde a plenitude da sua independência, nas matérias em que tem competência própria. O director-regional nomeado por razões de confiança política é tão indistinto quanto o adjunto ou o chefe de gabinte de Sua Excelência. Pertence à zona do não-pessoal-de-carreira, sendo passível de instalação e remoção pelas vagas do “spoil system”. Os sinais de despotismo de um só podem conduzir ao extremo oposto do despotismo de todos, também embrulhado nos mesmos mecanismos delatórios, com denunciações de ouvida, demagogia e populismo, os habituais prelúdios dos césares de multidões, nessa espiral de vindictas a que só pode atalhar-se pelos cumprimentos dos conselhos de Montesquieu, conforme a cultura do Estado de Direito. Porque se apenas mantivermos o verniz do Estado de Legalidade, nem Bordalo Pinheiro poderia editar o seu “António Maria”, havendo sempre candidatos a juiz Veiga, com os consequentes moscas do Intendente e bufos da PIDE. Não deixemos que a máquina estatal, paga pelo suor dos contribuintes, se fragmente em neofeudalismos partidocráticos.
Isto é uma espécie de país, com música de Marques Mendes e letra de Mário Lino
O presidente do município de Oeiras congratulou-se, ontem, em Lisboa, com o logótipo “Flor Azul”, que será a imagem de marca da próxima presidência portuguesa da União Europeia, num acto que disseram simbolizar o arranque do exercício semestral. Coisa que foi ministerialmente qualificada como “um símbolo da imagem de modernidade que Portugal assumiu no contexto europeu”. Não consta que a autoria da dita flor caiba a um celebrado artigo de Clara Pinto Correia, nem que a mesma seja acompanhada pela musiqueta que abre o programa dos Gato Fedorento. Também ninguém refere se Isaltino Morais vai processar a União Europeia sobre tal usurpação imaginativa. Apenas observo que não vale a pena inventar o que já está inventado nem descobrir o que já está descoberto.
Santana Lopes acusa Marques Mendes de práticas nazis. Marques Mendes diz que Mário Lino não está bom da cabeça. E o ex-deputado Charrua é que vai suspenso. Almeida Santos fala em ataques terroristas que acertam nas pontes sobre o Tejo, enquanto D. Afonso Henriques, liberto do túmulo, diz que ainda tem suficientes mocas de Fafe para dar cabo do canastro a todos os comandantes de terra seca que nos estão a levar ao fundo. Por outras palavras, se a política portuguesa cabe toda num velho palco do Parque Mayer, protestamos vigorosamente contra alguns desses mais exaltados que querem internar os respectivos colegas no Júlio de Matos, no Sobral Cid e no Miguel Bombarda. Rir é o melhor remédio.
O imaginário da geração que traduziu em calão o Maio 68 ainda não compreendeu que todas as revoluções são pós-revolucionárias
Tenho passado os dias a rever a primeira parte de um relatório sobre metodologias da ciência política que apresentei para concurso público, no século passado, no ano de 1996. Só uma década depois é que ele sairá dos prelos, principalmente para demonstrar como em Portugal qualquer esforço no sentido de se obter o consentimento dos que pensam de forma racional e justa não consegue solidificar uma opinião comum, capaz de influenciar os homens livres.
Com efeito, o jogo dos grupos de pressão e dos grupos de interesse, nessa manipulação de uma gerontocracia, entretida com a literatura de justificação do poder que alcançou e com o consequente revisionismo histórico, leva a que os restos de universidade que ainda resistem caiam na esparrela das chouriçadas, alimentadas por elementos colonizadores, vindos da partidocracia, das catacumbas da buracratite ou das empresas onde são empregados, usando a universidade para cartão de visitas.
É com a angústia do desencanto que revejo palavras e ideias de uma época em que ainda tinha esperança na instituição fundada há vinte e cinco séculos por Platão. Vejo agora que o desencanto é cada vez mais pressionante. Mesmo as eventuais boas intenções do ministro Gago e dos seus compagnons de route se preparam para manter esta instabilidade estatutária, em que costumamos ser férteis, repetindo o erro jacobino de Veiga Simão, que fez uma reforma pombalista para a não executar, desculpando-se sempre com a circunstância de a criatura se ter liberto do criador.
Agora, todos os universitários, os que esperam o prometido pacote decretino do senhor ministro, que quase nos obriga a louvaminhar os novos amanhãs que cantam, sabem, de experiência sofrida, que esse impulso reformista vai ser sucessivamente barganhado em instabilidades e eventuais vazios de poder, até porque este ministro, muito provavelmente, não será o executor da peça com que doirará as respectivas memórias. O conceito indeterminado da bolonhesa, a criação de fundações, as campanhas eleitorais para as curadorias e as reitorias, a dependência de todos os aparelhos dos critérios mínimos de excelência, etc. , redundarão na inevitável guerra de todos contra todos, onde acabarão por gerar uma luta pela sobrevivência no emprego, com a consequente feudalização de um processo que deveria ter uma ideia de obra, claro cumprimento das regras processuais e manifestações de comunhão entre os membros da instituição.
A Universidade que sobreviveu à Ditadura, ao PREC e à pós-revolução corre o risco de não aguentar os muitos aprendizes de feiticeiro que ainda não compreenderam que o feitiço se volta sempre contra o desencadeador da tempestade. Julgo que qualquer revolucionário frustrado não consegue, a partir da respectiva frustração, assumir a necessária reforma de uma entidade que caiu nas teias de grupos de pressão e de grupos de interesse. O imaginário da geração que traduziu em calão o Maio 68 ainda não compreendeu que todas as revoluções são pós-revolucionárias e que quer fazer de anjo acaba por se tornar, muitas vezes, num bestial que, depressa, passa à categoria de demónio.
Não é a Gago que me refiro. Mesmo que o remodelassem, isso não impediria que fossem contidas as forças de destruição que as respectivas boas intenções desencadearam e que acabarão por fazer prevalecer os fagmentários interesses das muitas árvores que não têm o sentido da floresta. Não tardará muito que entidades com interesses financeiros acabem por aproveitar esta oportunidade de res nullius, para aqui instalarem a racionalidade importada de um novo ensino superior verdadeiramente privado e lucrativo, a que se acolherão os consumidores defraudados pela falta de qualidade da chouriçada que se avizinha, dado que nem sequer podemos recorrar à ASAE e à DECO, porque os produtores da fraude continuam a abusar da respectiva posição dominante no mercado da publicidade enganosa.
Vou continuar a rever o meu trabalho, ao ritmo de memórias futuras. Pelo menos, ficará nos arquivos de quem o ler, quando a investigação científica voltar a ser dos investigadores e as aulas, dadas por professores que fazem do ensino a sua primeira paixão e não um trampolim para as respectivas vaidades ou jogos de infuências e tráfico de poder.
O décimo segundo candidato: “não queremos ver Lisboa a arder”
Reparo, através do registo dos motores de busca, que este blogue foi muito visitado por aqui ter transcrito uma frase atribuída ao rei D. Carlos e que, em parte, fez parte do alegado insulto do ex-deputado Charrua ao Estadão. Apenas respiro de alívio depois de tomar conhecimento dos recados do presidente Cavaco, do meio-termo assumido por Sócrates e da boa prestação televisiva de ontem de Jorge Coelho sobre a matéria. E bem poderia enumerar o que, em privado, mas em pleno edifício público, ouvi de altos hierarcas do Partido Socialista, num assunto que não deve servir para conflitos entre oposicionistas e socialistas, mas antes para que eliminemos todas as dúvidas sobre o ar livre em que todos queremos continuar a viver.
Prefiro rever a bela prestação do ministro Mário Lino na Ordem dos Economistas, dado que aquela do não há gente, escolas, hospitais, comércio, onde não há indústria nem hotéis, com cancerígenos ataques aos pulmões, falta de um braço e de uma perna, foi outro dos habituais exageros do ex-bloguista em figura humana, que teve o condão de nos despertar uma dessas saudáveis gargalhadas, à imagem e semelhança da que deveria findar com o episódio Charrua. Com ministros destes, não há, felizmente, bananas que coincidam com sacanas. Nesta terra da boa gente que ainda resta, até eu sou capaz de apoiar o partido da Ota, se me continuarem a convencer com risadas e argumentos racionais e a não confundirem a opção com tiradas iberistas.
Aliás, basta reparar como as candidaturas à autarquia dos alfacinhas de gema e clara já atingem esse símbolo da plenitude que é o número dos trabalhos de Hércules e dos meses do ano, isto é, tantos quantas as estrelas da bandeira da Europa que, por acaso, era a do Quinto Império, conforme a descrição do Padre António Vieira. A plenitude lisbonense está assim condenada a dar à luz um destes ratinhos: António Costa, Manuel Monteiro, Telmo Correia, Garcia Pereira, Pinto Coelho, Câmara Pereira, Fernando Negrão, Ruben de Carvalho, Sá Fernandes, Carmona Rodrigues, Helena Roseta e o último que será o primeiro. Até porque talvez todos convidem Maria José Nogueira Pinto para embaixadora da saudade capitaleira.
Mais mobilizadoras parecem ser as ilustres figuras dos mandatários e das comissões de honra e de apoio, pelo que corremos o risco de haver comícios, colóquios e almoçaradas com a presença de Afonso de Albuquerque, Febo Moniz, Rosa Araújo, Elias Garcia, Duarte Pacheco e Fernando Santos e Castro, lado a lado com Karl Popper, Karl Marx, Mao, Mussolini ou Che Guevara, todos falando através da Pomba Gira que, nos intervalos, com o apoio do firme e hirto Professor Alexandrino, fará interpretações de Amália Rodrigues, Max e Alfredo Marceneiro, depois da recente mensagem que recebeu do além da própria princesa Diana. Porque tudo isto é triste, tudo isto é fado…
Apenas me apetece furar alguns segredos e, através deste meio, anunciar que o décimo segundo candidato à autarquia lisbonense é, nada mais, nada menos, do que o senhor Pinto da Costa que, na próxima sexta-feira, anunciará a novidade, na Casa do Dragão, que tem a sua sede no restaurante da Assembleia da República. O manifesto tem sido preparado em segredo por alguns ilustres poetas da nossa praça, tendo como título: “Não queremos ver Lisboa a arder”.
Aliás, entre os vereadores propostos pela lista, consta o senhor Emplastro, para o pelouro da mobilidade, sendo seguras as informações que apontam, para a comissão de honra, os nomes de Luís Filipe Vieira, Soares Franco e Alberto João Jardim e para Belmiro de Azevedo e Henrique Granadeiro, como mandatários financeiros.
Consta também que o arquitecto Siza Vieira é o autor do projecto que permite instalar o novo aeroporto na ilha do Bugio, enquanto Manoel de Oliveira se ofereceu para elaborar os tempos de antena. Pedro Santana Lopes, que terá obtido, quase em silêncio, um doutoramento em arquitectura e engenharia civil pela universidade Platoon de Bali, apresentará o projecto de novo túnel para travessia do Tejo.
Espera-se pela presença entusiástica dos senhores presidentes da câmara de Oeiras, Gondomar e Felgueiras, enquanto um ilustre eclesiástico abençoará o lançamento do primeiro carril do novo metro de superfície entre a Estação do Rossio e o novo santuário da Cova de Iria. Dizem também as más línguas que António Costa, num derradeiro esforço, teve um encontro discreto com Fernando Seara e Dias Ferreira, num bar da Segunda Circular, ameaçando com um grande buzinão, contra esta finta de génio, que baralhará todas as contas das próximas eleições.
A sociedade aberta e o absolutismo inquisitorial das mentalidades fechadas
Confesso nunca ter sido um dilecto admirador de Diogo Freitas do Amaral. Mas, no day after à respectiva saída de funções docentes no ensino público, dado que vai continuar a dar aulas no sistema concordatário, não posso deixar de o saudar e de louvar a respectiva luta pela regionalização. Registo também as ilustres presenças no auditório, para telejornal filmar.
Emocionou-me particularmente a presença do seu antecessor na presidência de um certo partido, que, sem contar as peripécias relacionais com o dito e as respectivas viúvas, declarou, de forma eloquente: não dou notas, mas saliento a última mensagem importante que deixou e que completa o seu legado de professor. Já José Sócrates lembrou após a última aula de Freitas que criou com ele uma cumplicidade especial com o livro ‘Sociedade Aberta’, do filósofo Karl Popper.
Por isso, prefiro salientar as declarações do constitucionalista Jorge Miranda ao DN, sobre as consequências pouco popperianas registadas no universo kafkiano de importantes segmentos do actual aparelho subestatal: “houve um delator, o que é uma coisa profundamente triste”, “o princípio constitucional da liberdade de expressão não pode ser posto em causa dentro da administração pública”. E, acrescenta, “se houve injúria ou difamação, a questão tem de ser resolvida em tribunal e nunca por via administrativa”. Chega ao ponto de dizer que “quem deveria ser demitido era a directora a regional”.
Por cá, com mais um fadista a candidatar-se a Lisboa e com fundamentais reportagens televisivas dos almoços de Costa e Negrão, com ilustres comensais e notáveis, neste regime, onde os mandatários servem para disfarçar a pobreza dos que se candidatam ao formal mando, eu tivesse ido peregrinar um texto que emiti em 8 de Novembro de 1989, titulado A Sociedade Aberta numa Estante Fechada:
Karl Raimund Popper, hoje com cerca de noventa anos, constitui, sem dúvida, um dos principais patriarcas intelectuais deste nosso tempo ocidental pós-marxista. Contudo, a respectiva obra, desde a Logik der Forschung, publicada em Viena, em 1935, só há poucos anos é que transbordou do universo cultural anglo-saxónico, passando também a marcar os países latinos, principalmente depois das traduções francesas da sua principal bibliografia.
Também em Portugal o popperismo chegou em força, na década de oitenta, influenciando, inevitavelmente, o nosso insípido movimento de doutrinas políticas, com destaque para a aproximação liberal de Lucas Pires, para as descobertas intelectuais do Clube da Esquerda Liberal, de João Carlos Espada, ancorado no soarismo, a Pacheco Pereira, um dos intelectuais orgânicos do cavaquismo.
Apesar de tanto atraso, Popper também tem sido um dos semeadores da nossa tímida liberalização e, embora poucos o tenham introspectivado, muitos consideram-no como um elemento da moda, uma espécie de sinal exterior de intelectualidade, que se utiliza para desgarradas citações.
Acontece que noutro dia, ao visitar a biblioteca do antigo serviço público da propaganda e da censura, deparei com a primeira edição da fundamental obra do filósofo: The Open Society and its Ennemies, publicada em Londres no ano de viragem de 1945. Uma obra que apesar de uma razoável edição brasileira, ainda não foi, infelizmente publicada em Portugal.
O exemplar da Sociedade Aberta, apesar de, na referida biblioteca, ficar à mão de semear, estava coberto por poeira com algumas décadas. Arrumado, catalogado e indexado, o livro em causa jaz numa estante fechada. Se furou o bloqueio do autoritarismo português naquele pós-guerra, se não foi retirado da possibilidade de consulta, ficou, assim, por inércia, incomunicável, à espera que outros ventos da história o viessem libertar da poeira do esquecimento.
Na verdade, Portugal é um pouco como este acaso. Deixamos entrar a semente da sociedade aberta, mas preferimos encaderná-la, asfixiando-a numa redoma. Se somos lestos à adaptar epidermicamente novas ideias, sobretudo quando as mesmas assumem a agressividade da moda, depois, não as adoptamos em profundidade, como elemento fecundante das nossas circunstâncias.
Deixamos as ideias originais nas estantes da erudição e apenas as utilizamos indirectamente através de dicionários de citações. Não as deixamos crescer por dentro de nós, dialecticamente. Que o digam os ventos da sociedade aberta que por todo o mundo circulam!
Se estivermos atentos aos discursos políticos do poder e de algumas oposições, poderemos concluir que todos estão irmanados na mesma doença maniqueísta, que continua a considerar verdade aquilo que é contrário ao erro e erro aquilo que é contrário à verdade, numa concordância tácita com o modelo do absolutismo inquisitorial.
Europa, viva o sim pelo não! Obrigado, Charles de Gaulle…
Todos os povos da Europa entoaram na madrugada de ontem um enorme hino de alívio, porque os seus ilustres representantes cupulares, na cimeira de Bruxelas, conseguiram um desses acordos, onde todos concordaram no que estiveram, estão e estarão em desacordo. Até considero justos os elogios de bom aluno que já recebeu do professor-presidente. Contudo, não posso deixar de notar que, noutros traseiros do regime, acontecem paradoxos, como os morosos oito anos que levaram a uma acusação de corrupção sobre o tratamento de águas ambientais na Beira Interior, ou ao pingar diário de mais acusações sobre actuais e passados presidentes de clubes de futebol. Não vou gastar hoje meu latim neste normal de haver anormais, até porque nas duas viagens ferroviárias que fiz ao Norte li semanários políticos em demasia e fiquei enjoado com tantos solavancos deste pensamento dominante que vai lavando as cabecinhas das chamadas classes A e B, este portuguesmente correcto que usa e abusa dos nossos destinos. Reparei apenas como em época de exames surgem coloridos anúncios universitários, públicos e privados, com muitas publicidade enganosa de agências especializadas em figurantes e figurões, prometendo futuros radiosos e chouriçadas do costume, assim contribuindo para o engrossar dos proletários intelectuais, gerados por este falso planeamentismo que está a transformar o que deviam ser universidades em hipermercados com muitas caixas registadoras de propinas. Apenas noto que estou farto dos falsos gestores que transformam venerandas instituições em manobras de péssimo “marketing”, onde se usa a técnica daquela terra queimada de qualquer invasor, para o beneficiário, depois, andar a pedir melhor emprego noutras paragens. Volto à Europa, recordando até que, na noite de sexta-feira, a debati com socialistas do Porto, onde voltei a ser nacionalista, federalista e liberal, sem qualquer choradinho sobre a resistência de um “Welfare State”, onde todos podem obter o cartão europeu de utente dos serviços públicos de saúde, fazendo bicha numa qualquer loja de cidadão. Porque, em pleno euro, sem ser por culpa do euro, a minha bolsa minguou e nem sequer me permite ir comprar caramelos a Badajoz. Ainda bem que chegámos a acordo sobre o que estámos em desacordo, coisa que é bem melhor do que darmos música celestial a gongóricos textos que ninguém quer comunitariamente receber, quando não há suficientes símbolos que transformem a Europa numa comunidade de amor, numa ideia e num valor pelo quais valha a pena morrer como cidadãos. O erro dos comandantes do convencionalismo foi o de instrumentalizarem os belos símbolos da nossa “nation des nations” numa tecnocratice, especialmente quando começaram a dizer que a participação directa dos povos era menos legítima do que a decisão dos mesmos povos que indirectamente os canalizou como eurocratas. Esses que, no segredo das cimeiras e dos corredores das mesmas, negoceiam nossos destinos, em nome de falsas legitimidades que os levam a considerar-se como superiores à vontade geral de todos e cada um de nós, os homens comuns. Ainda bem que, na recente cimeira europolaca, triunfou o método da cooperação política, essa herança gaullista do “oui par le non”, como tão bem a qualificou Maurice Duverger. Pelo menos, alguns europeístas como eu, sempre podem perder a carga demonizante de herético, com que eram qualificado pelos “yes, minister” dos bismarckianos, habsburgos e napoleónicos, atirando-nos para a nebulosa do anti-europeísmo ou do euro-cepticismo, categorias inventadas pela engenharia inquisitorial da burocracia e dos seus anexos de intelectuários, avençados ou subsidiados para colóquios sobre o futuro da Europa, com muitos censores de serviço, dependentes das gavetas de fundos dos patrocinadores.
Quem verbera governantes pratica actos de indisciplina, com irreverente e grave conduta, revelando impossibilidade de adaptação às funções docentes
Tenho muito orgulho em ser funcionário público, ter um “ofício”, ser “vicarium”, estar integrado numa instituição e servir uma ideia. Começo a ter vergonha de estar na função pública deste Estado a que chegámos. E quase todos os dias me apetece ir ao meu aforro e publicar, do meu bolso, um grande anúncio num jornal de grande circulação, pedindo que me dêem emprego para aquilo que sei fazer, longe destas castas capitaleiras e partidocráticas que assaltaram os aparelhos, onde o lastro inquisitorial e pidesco nos asfixia, especialmente com o recente regresso às denunciações de ouvida, com colegas e com chefezinhos a aceitarem as vilanias e a difundirem bufarias. Por hoje não falo no caso do funcionário que fez comentários jocosos sobre o senhor primeiro-ministro. Nem de mais recentes actos de persiganga noutros locais. Nem sequer temo que, do Partido Socialista, tenham desaparecido os liberdadeiros. Esses que andam distraídos com tanta azáfama e nem reparam nos estalinistas não reciclados que se infiltraram nos meandros dessa velha e fundamental casa da resistência à opressão. Eu pensava que tais peças faziam parte do pretérito imperfeito e não do presente incerto que nos asfixia e nos começa a proibir as necessárias saudades de futuro. Os vermes regressaram em força, carimbados com a categoria de especialistas em contra-subversão e análise de informação, reclamando até o legado do tal ministro salazarento e saneador, por interposto ajudante. A democracia dos homens livres vai apodrecendo e não convém que o PS se deixe cabralizar pelos novos zés dos cónegos que nele pedem tachos. Pela Santa Liberdade, pelejar até morrer!