Quando se instalou a instabilidade do provisório que espera os sinais da voz daquele tradicional dono decretino que vai emitir uma “révolution d’en haut”, pode acontecer que a transição transforme o mesmo provisório em definitivo, aumentando o pantanal dos provisórios definitivos e dos definitivos provisórios, onde, não havendo rei nem lei, despertem os pequenos césares de multidões que, entoando a música da orquestra do Titanic, não nos deixem detectar o choque desta chapa veiga-simonista, muito prequiana e pós-revolucionária, com o “iceberg”. Se já vislumbramos a parte visível desse bloco de gelo, continuamos a não conhecer as profundezas do leviatânico monstro e são poucos os botes salva-vidas disponíveis. Entretanto, já saíram da toca os muitos ratos e os seus habituais tocadores de flauta que foram aos arquivos da sua “forma mentis” totalitária e voltaram a entoar as pautas da extrema-direita e da extrema-esquerda, regressando os toque de caixa dos saneamentos, com os consequentes subsistemas de medo, não a caminho da revolução, mas do rancho da empregomania. Quase todos parecem esquecer-se dos clientes, isto é, dos jovens que foram apanhados pelas ratoeiras destes carreirismos e que, infelizmente, voltaram a viver como cobaias em laboratórios de vaidades, onde, em vez da luta de classes, se manifesta indecorosamente essa energia da história chamada inveja, com o consequente desespero da nova encomendação feudal. Por isso, repito a história que há dias ouvi, de um desses caçadores de cabeças que, depachado do centro da Europa, costuma vir a Lisboa fazer recrutamento de técnicos e de cérebros. Dizia ele que Portugal, neste momento, é um terreno de eleição, porque consegue levar os melhores que, aqui, não entram nos recrutamentos dominados pela cunhocracia e os “jobs for the boys” da partidocracia e do amiguismo fidalgote, castífero e capitaleiro. Acontece apenas que a aplicação ao terreno social do belo princípio da igualdade de oportunidades, a nível do sistema de ensino, corre o risco de regredir, para gáudio de um situacionismo, cada vez mais enredado na tradicional ditadura da incompetência, onde regressam os ventos da vindicta e da persiganga.