Há uma certa comunhão de coisas que se amam, nomeadamente uma certa ideia de Portugal, que impõe sujarmos as mãos no risco do combate pelos valores, sem sectarismo e sem a habitual sucessão dos congreganismos. E mesmo os ortodoxos têm a angústia de não conseguirem ser, com nome próprio, ortodoxamente heterodoxos. Por outras palavras, os sucessores da pátria de Vieira só têm a ortodoxia da heterodoxia, a fé da heresia criativa e o dogma do antidogmatismo. “Le refus de la politique militante, le privilège absolu concédé à la littérature, la liberté de l’allure, le style comme une éthique, la continuité d’une recherche” não pode ceder aos congreganismos e aos seus irmãos-inimigos anticongreganistas, meu caro “Je mantiendrai”. E nós que, em termos de carimbo, estamos em aparentes campos inimigos, sabemos que somos irmãos naquilo que vai além das confrarias. Até porque nos cabe a missão de servir, sem procuraramos aquelas honrarias que matam a honra e aqueles academismos que matam a universidade. Porque ainda há quem, sendo jovem, quer continuar a viver como pensa, sem pensar sequer como depois vai viver. E é para essas correntes que nos ultrapassam que temos o dever de servir as instituições que têm ideia de obra, regras de Estado de Direito e manifestações de comunhão. Claro que o meu companheiro me acusa de milenarista, tal como eu o poderia acusar de seres mais católico do que cristão, como diria Comte, nesta pátria onde os ortodoxos acabam, quase todos, como o ex-anarquista, ex-republicano e futuro monarquista autoritário, Alfredo Pimenta, a sofrerem notas pastorais do Cardeal Cerejeira, onde cada um deles vai lendo a última pé-de-página do manual daqueles inquisidores que levaram Filipe II a ter que mandar o Santo Ofício condenar o padreca, autor daquele sermão que, do púlpito, pediu mais absolutismo para o filho de Carlos V. Só que, aqui e agora, não vale a pena discutir o sexo dos anjos, quando a cidade já está sitiada nas suas entranhas. Se eu tivesse influência, nomear-te-ia para, ontem, fazeres um discurso sobre o nosso irmão Vieira, o do quinto-império, neste tempo de bebedeira dos poderes sem autoridade e dos autoritários empaturrados em salamaleques.
Fev
06