Jan 02

Um governo que se quer confundir com um regime

Já tivemos maiorias uma absoluta e outra quase absoluta, a que estava apenas dependente de uma fatia de queijo, e ambas, de vitória em vitória, chegaram a uma derrota final a que deram o nome de “tabu”, ou de “pântano”. O problema é menos de aritmética,  isto é, de soma contabiliística de forças eleitorais e mais de geometria qualitativa quanto ao redesenho da mobilização pelo bem comum. Por outras palavras, não é pelo facto de se reforçar o poder que uma maioria parlamentar dá a um governo, pelas ordens dos directórios partidários, que se consegue a necessária autoridade que gera a obediência pelo consentimento.  Julgo que o situacionismo governamental, caso a crise não se agrave, vai procurar manter, até às eleições, no essencial o nível da bolsa do cidadão, porque, de outro modo, a respectiva vida estaria ameaçada. Nem que seja pelo anúncio de um aumento das expectativas do sonhar é fácil.  Por outras palavras, a crise pode não ser suficientemente forte para que o português comum afaste o governo. Basta recordar que, depois da Grande Depressão, o New Deal de Roosevelt apenas chegou cerca de um lustro depois, enquanto nós mantínhamos o gesso da ditadura das finanças salazarista que, como dizia Agostinho da Silva, nos entalou a perna em gesso durante quarenta e oito anos, apesar de ele tar ficado sã cinco anos depois… Tenho dito que o sistema político português, envelhecido e fechado na concha da partidocracia, já não se reduz ao confronto dos situacionistas, com os seus apoios, e dos oposicionistas, com as suas reivindicações. O principal “input” começa a ser o indiferentismo, queé bem pior do que a mera medição do abstencionismo, dado que se aproxima do gesto do “Zé Povinho”. Só que os governos lusitanos, principalmente em rotativismo, têm sabido durar em decadências sistémicas que às vezes duram mais de uma década. Veja-se, por exemplo, o que sucedeu à monarquia liberal, onde, depois do “Ultimatum” que a dessangrou, ainda durou duas décadas. Sem querer repetir o âmbito da análise política dos que encenam factos artificialmente políticos, nesse que é o latim com que se delicia a partidocracia, para que continue o mais do mesmo… julgo que, infelizmente, vão repetir as metodologias anteriores, elaborando teatros operacionais imaginados e consultando sondagens, porque acreditam que não haverá suficiente dramtismo para a deriva messiânica. Todos os opositores internos dos partidos da oposição, ao proclamarem a inviabilidade das respectivas lideranças estão a cair na armadilha que lhes lançou o situacionismo, cuja sondajocracia parece favorável ao governo que assim corre o risco de se confundir com o regime, só porque o sistema que ele controla o asfixia.