Abr 22

O preto afinal é branco e entre o Eu e o Outro, os pilares da ponte do tédio que vai daqui para o além

Há noites em que, infelizmente, perdemos tempo demais a ter que aturar as intervenções das figuras humanas que se querem confundir com o estadão e que assim tratam de fazer equilibrismo no trapézio vocabular deste circo, para que, no fim do espectáculo, sintamos um amargo de boca, por termos perdido tempo com um não facto.  Ontem foi esse mais do mesmo, aliás, bem doloroso, onde fomos obrigados a confirmar que o homem do leme desta nau do Estado parece já não saber pilotar o futuro, quando era seu dever a busca de um porto seguro, através do cumprimento de um ideal que nos desse rota. Afinal, Sua Excelência patenteou que já não sabe o que quer, de onde vem e para onde vai. Ora, um comandante perdido é um risco. Porque a todos nos pode fazer perder. Confesso que, depois de o ouvir, com toda a humildade de Cidadão que está abaixo do Estado, compreendi que importa voltar a ser um qualquer Homem que esteja acima destas trapalhadas do Estado. Logo, por muito que lhe custe, não o considero meu inimigo e, muito menos, meu adversário. Gostava mais de o considerar como alguém capaz de ascender à categoria de exemplo, fosse amigo ou adversário político. E não estou a ver nenhum educador, nomeadamente pai ou mãe, a dizer aos filhos que sigam o modelo do Senhor Engenheiro, embora antes, muitos dissessem aos filhos que se comportassem segundo os paradigmas de um Francisco Sá Carneiro, de um Álvaro Cunhalou de um Mário Soares. Porque, dos fracos, não reza a história. Os meninos birrentos quando chefiam qualquer coisita, gostam de escarafunchar no boneco, para ver o que ele tem dentro e até podem desfazê-lo aos pedacinhos quando não se sentem compensados em afectos visíveis pelos assistentes da cena. Nuns dias, aliam-se a uns, noutros passam a considerar como inimigos os aliados da véspera e, retalhando a república, acabam por deixar tudo em trapos, sem qualquer nexo que permita refazer a harmonia. O Senhor Engenheiro já não é apenas um problema para o PS… Sua Excelência deixou de ser um bom exemplo e, da sua conduta, já ninguém consegue extrair um exemplo que possa transformar-se em máxima universal. Ao elevar a adversários principais alguns brincalhões das golpadas politiqueiras, ele restringiu o campo da luta política a um nível que não mobiliza quem precisava de fins políticos mais altos. E fiquei triste. Explicar o Freeport porque houve uma carta anónima de um militante alcochetense do CDS que, aliás, já saiu do CDS, e insinuar que tudo se deve a manobras do actual CDS, aliado a outros dirigentes do PSD, que já não são dirigentes do PSD, é confundir dolosamente as circunstâncias. É perder o nível. Mesmo que amanhã se prove a tese das cabalas e das campanhas negras, toda a república não deveria enrodilhar-se no irracional da falta de racionalidade finalística e do friorento deste vazio de racionalidade valorativa, onde nem há ética da convicção nem ética da responsabilidade. Porque falta uma ideia de obra. Porque as manifestações de comunhão entre os cidadãos já são uma impossibilidade. Porque as regras processuais mais simples estão dependentes do carimbo discursivo de um qualquer secretário de estadão. Acredito que sua Excelência tanto não falou com o Procurador como outras excelências dependentes de de Sua Excelência confessaram que falaram com outros procuradores dezenas de vezes. Mas nenhum dos argumentos, tanto o de não ter falado como o do ter falado, serve para esclarecer esta causa que se transformou no mais ridículo dos casos que enevoa a república e que a história reduzirá a simples nota pé-de-página do mero anedótico. É a diferança que vai dos pequenos aos grandes homens de Estado. Por outras palavras, ontem, as redes, mais uma vez, trouxeram pescada, mas congelada, porque tudo antes de o ser já o era, conforme os conselhos dos consultores de imagem e dos “agenda setters”. Naturalmente, Sua Excelência não disse aquilo que disse sobre Cavaco, nem Cavaco, aquilo que disse sobre ele. Ambos falaram sobre a velha história da Patagónia e do reino do São Nunca.   Aqui e agora, na política deste quintal à beira da Europa plantado, o branco é preto, e o preto é branco, dado que a culpa está sempre nos intérpretes, nos mensageiros e não na mensagem. A culpa está nesses coitadinhos que não sabem que a retórica é sempre dolosamente equívoca. Está, por exemplo, no António Vitorino, dado que desta o Vitalino ficou só no trabalho precário e não portou a voz.