Fev 29

Notas sobre uma comunicação presidencial, com boas intenções….

Cavaco Silva faz comunicação directa ao país e à Europa. Critica a política europeia do directório e reflecte o consenso dos que pensam Portugal na Europa de forma racional e justa, contra a cobardia dos comandantes europeus e a chantagem das agências de ratação. Concordo com este acto de cidadania europeia e que deve mobilizar-nos para um adequado pacto de regime! Também eu quero ser europeu neste cantinho de Portugal!

A situação é tão séria que mesmo um anticavaquista primário como eu é hoje cavaquista quanto à leitura destas palavras de diálogo directo com o eleitorado.

Recordo que estas palavras de Cavaco estão em consonância com os discursos dos três ex-presidentes (Eanes, Soares e Sampaio) na passada cerimónia do 25 de Abril de 2011. Precisamos de um mínimo de consenso nacional face aos ultimatos.

“Our country—when right to be kept right; when wrong to be put right” (discurso de Carl Schurz, em 17 de Outubro de 1899). Numa conferência, dita anti-imperialista. Senador norte-americano por Wisconsin (1829-1906).

Os notários de regime, nos discursos sobre o estado a que chegámos, podem estar cheios de boas intenções, mas de boas intenções estão os discursos presidenciais bem cheios, mesmo quando, depois de terem sido bons alunos, se revoltam agora contra a cobardia, a chantagem e os condicionamentos dos directores da escola europeia.

Convinha acentuarmos que não somos da Europa do Sul, ou do Mediterrâneo. A nossa pluralidade de pertenças é dos vários Atlânticos. A do eixo atlântico que passa por Londres e foi da EFTA. A do Atlântico Norte, com os norte-americanos, que fundou a NATO. A do Atlântico crioulo que nos dá CPLP, sobretudo entre o Brasil e Luanda. E a do Atlântico que nos deu boa esperança para o Oriente e a circum-navegação. Pela Índia, pela China, pela Indonésia e até pela Rússia que desagua no Pacífico. Era bom que o projecto europeu aderisse a esta visão armilar do mundo.

Em verdade, se temos uma maioria (PSD/CDS), um governo (PSD/CDS) e um presidente (PSD/CDS), também não é mentira que essa maioria (a do PPE) governa Berlim e Paris, bem como a maioria dos integrantes da União Europeia, salvo naqueles que estão em suspensão tecnocrática da democracia, como em Atenas e Roma.

Em verdade, se temos uma maioria (PSD/CDS), um governo (PSD/CDS) e um presidente (PSD/CDS), também não é mentira que essa maioria (a do PPE) governa Berlim e Paris, bem como a maioria dos integrantes da União Europeia, salvo naqueles que estão em suspensão tecnocrática da democracia, como em Atenas e Roma.

É evidente que Portugal está em luta pela sobrevivência. E nestas ocasiões, costumamos refundar-nos. Como fizemos em 1974, perante o fim do ciclo imperial e a integração europeia. Como aconteceu em 1910, tanto na luta contra o Ultimatum, pelo patriotismo imperial que nos levou à Grande Guerra, como na luta contra a bancarrota de 1890, onde a república falhou. Agora, sem saída imperial, estamos mais sós na tradicional luta contra o défice. Mas sabemos que a história de Portugal é a história do défice.

Não tenhamos ilusão. É impossível a luta contra o situacionismo do estado a que chegámos através de uma ditadura revolucionária de governos provisõrios. Como o foram os da Regência de D. Pedro IV, de Passos Manuel (1836), dos provisórios (1910-1911) ou dos seis que nos deram a democracia (1974-1976). Agora, resta reinventar-nos sem ruptura de regime, mas com espírito regenerador.

Na Europa, temos de submeter-nos para sobreviver, mas importaria que lutássemos para viver, gerindo as dependências, mas ultrapassando a ilusão do bom aluno, como foram Cavaco e Soares. Não basta sermos bons caixeiros viajantes e exclentes delegados de propaganda médica e é pouco termos boas contas de merceeiro. Não chega a ilusão de um salazarismo democrático, porque é horrorosa qualquer ditadura das finanças.

Precisamos de órgãos de soberania que apelem a um adequado pacto de regime que reforce a maioria da aritmética parlamentar, sem blocos centrais, de direita ou de esquerda. Tal como devem os mesmos lutar por uma nova geometria de um contrato social que vá além do mero teatro da dita concertação. Com empresas, sociedade civil, igreja, forças morais e filosóficas e os próprios sindicatos, incluindo os da CGTP, para que todos as organizações não partidárias deixem de ser correias de transmissão de partidos, desde os nacionais às multinacionais suprapartidárias da Europa.

 

 

 

Fev 29

Untitled

O ritmo da austeridade é directamente proporcional ao das nomeações. Por outras palavras, a sobrevivência do Estado depende da sofreguidão dos aparelhos clientelares, naquilo a que deveríamos chamar o estadão a que chegámos. O poder em Portugalç sempre foi uma coisas que se conquista, onde a culpa é sempre do anterior conquistador.

Cavaco Silva faz comunicação directa ao país e à Europa. Critica a política europeia do directório e reflecte o consenso dos que pensam Portugal na Europa de forma racional e justa, contra a cobardia dos comandantes europeus e a chantagem das agências de ratação. Concordo com este acto de cidadania europeia e que deve mobilizar-nos para um adequado pacto de regime! Também eu quero ser europeu neste cantinho de Portugal!

“Our country—when right to be kept right; when wrong to be put right” (discurso de Carl Schurz, em 17 de Outubro de 1899). Numa conferência, dita anti-imperialista. Senador norte-americano por Wisconsin (1829-1906).

Os notários de regime, nos discursos sobre o estado a que chegámos, podem estar cheios de boas intenções, mas de boas intenções estão os discursos presidenciais bem cheios, mesmo quando, depois de terem sido bons alunos, se revoltam agora contra a cobardia, a chantagem e os condicionamentos dos directores da escola europeia.

 

Fev 26

A história é um género literário, subsidiário da ficção

Viagem pelo domingo. Encontro casual com um casal amigo. Pedem-me conselho. Sobre uns manuscritos de um dos maiores poetas portugueses da segunda metade do século XX. Encontraram cartas e manuscritos num sótão. Estão em boas mãos. Não sou capaz de, por enquanto, aconselhar o recurso a certas universidades. Dependem das eleições e dos micro-autoritarismos subestatais. Nem eu teria confiança nelas.

Eu tenho pena de escrever isto sobre o meu tempo. Mas não tenho dúvidas de considerar que certas instituições não têm dignidade de conservar coisas que perseguiram. E ainda mandam os perseguidores. Estou a falar de coisas de há meio século.

Qualquer registo ou publicitação desses papéis ainda pode ser considerado como falta de respeito às vacas sagradas que ainda as enxameiam de dejectos.

E como os papéis só viriam se eu desse a minha palavras, como, para os efeitos em causa, nem sequer tenho palavras, apenas calo.

A história é um género literário, subsidiário da ficção e serventuário da literatura de justificação do revisionismo histórico neo-estalinista. Este é que manda. Em muitos sítios.

Eu próprio sou mero detentor de certos legados bibliográficos e de manuscritos e, antes deste encontro, e sem saber o motivo do mesmo, tinha acabado de comunicar que o poderei deixar a um pequeno instituto associativo, por enquanto integrado numa universidade, mas com a condição de eu o poder vigiar e resolver, caso não seja cumprida a missão. Sei o que é a persiganga, o branqueamento e o apagão. Infelizmente.

Fev 23

Zeca Afonso

O poder não é uma coisa que se conquiste. Por um golpe de Estado, por uma herança, por uma doação ou até por eleições. O poder é uma relação permanente entre o aparelho de poder, os micropoderes e a chamada sociedade civil. E um regime político é a relação de um Estado, tanto do Estado-Governo como do Estado-Comunidade, com um determinado sistema de valores, uma concepção do mundo e da vida, ou uma civilização. Daí que regimes lícitos possam perder a legitimidade, mesmo que a decadência dure décadas.

Um regime decadente é mero papagaio de papel que perdeu a ligação ao chão moral da história. Mas há sinais do tempo que podem transformar-se em hinos da nova legitimidade. Tal como os Heróis do Mar que semearam a República ou as canções de Zeca Afonso que nos deram Grândola, Vila Morena. Agora somos macacos cegos, surdos e mudos. Não vemos, não ouvimos, não lemos a metapolítica desta falsa política.

Fev 21

Atenas sob vigilância apertada

O acordo foi concluído às 5 horas da manhã depois de uma maratona negocial final de 14 horas. Espera-se que o balão de oxigénio não seja consumido pelos tradicionais incêndios do que resta das árvores do berço da nossa civilização.

Fev 20

A questão grega

 

O prestígio do chamado Ocidente a nível do mundo vai depender totalmente da forma como se resolver a questão grega em Bruxelas. Se a solidariedade intra-europeia for marcada pelo egoísmo dos ricos, quem pode acreditar em cooperação? A começar pela mediterrânica. Por outras palavras, o Estado que não tiver poder financeiro pode ser obrigado a procurar outras formas de poder funcional e surgirem inesperados indisciplinadores do pretenso equilíbrio, das contas. O que era uma Palestina ou uma Líbia nos Balcãs, ainda por cima ortodoxas? O “softpower” pode ser driblado pelo “hardpower”, sobretudo em estado de necessidade.

Fev 16

Há mudanças necessárias em Portugal

Há mudanças necessárias em Portugal que se fazem em menos de uma semana. Bastam meia dúzia de decretos, à Mouzinho da Silveira. Como foi no governo da Regência de D. Pedro, no Governo Provisório da I República e nos seis governos provisórios de Abril. Desde que não voltem os devoristas e que reforme quem sabe e pode viver como pensa. O que falta é coragem e um mínimo de patriotismo científico, capaz de nos livrar da permanente conspiração, reaccionária ou revolucionária, de avós e netos, com a geração da ditadura da incompetência como intermediária. Os bonzos não o conseguirão, mesmo que recrutem os endireitas e os canhotos do costume.

Uma coisa é a “révolution d’en haut”, a decretina, vagamente despótica, que se diz iluminada, outra o finge que muda para continuar tudo na mesma, com música celestial e discursos de fazerem chorar as pedras da calçada. Outra é mudar mesmo. Há quem não deixe, porque, em nome do poder pelo poder, o conquistou, o vai gerindo clientelarmente e não quer sair de cima nem fazer, ou saber. O feudalismo só acaba quando se extirpam as raízes da bandocracia, bem como as formas doces de compra do poder, extinguindo as pequenas cortes das guerrazinhas de homenzinhos que se julgam eternos, só porque os serviçais todos os dias os engraxam.

O conluio de patos bravos, banca e partidocracia, explorando o desejo de cada português ser proprietário de uma casinha não só nos endividou como agravou a hipótese de um mercado mínimo de arrendamentos prediais. O congelamento dura há mais de cem anos, uma herança da I República que o salazarismo manteve e o abriríamos reforçou. Logo, não há hipótese de qualquer regresso a um mercado que nunca houve, sem a instauração de condições que o permitam. Entre os remediados, vítimas da gleba hipotecária e os pobres, ameaçados pela fome, há todos os sinais de potenciais revoltas do desespero que pode tornar-se no calcanhar do presente Aquiles.

Os náufragos agarram-se todos aos restos de tábua, mas arrastarão na corrente os palermas que continuam a confundir o poder com a autoridade. Esta só a tem quem é autor. Não quem é mero actor ou simples auditor.

Portugal está doente. E todos os dias, em todos os grandes jornais do mundo dos grandes, há quem, não nos conhecendo, faça diagnósticos e aponte terapêuticas, para que aqueles que nos desgovernam há décadas continuem cata-ventos, delegados de propaganda médica, caixeiros viajantes e vendedores de banha da cobra. O único remédio para a cura é livrar-nos de tais curandeiros.

Fev 15

Farpas

Ouvi ontem o sotaque beirão de um homem certo num lugar errado. Um excelente juiz que o sistema obrigou a aventuras mediáticas onde é fácil determinarmos que não foi com ele que ocorreram as coisas que ele disse ter iniciado. Eu preferia um servidor público que, a nove meses do respectivo limite de idade, não fizesse epitáfios nem mandasse recados para os grupos de pressão que o minimizam como situado nas circunstâncias. Por outras palavras, este não é o estilo do necessário herói que a república precisa no lugar. Precisamos de um eu e não de um ego, rodeado de outros egos e egas…

A vontade de poder, o amor do poder e o poder pelo poder, a dois ou três anos do limite dito da idade, em quem tem angústia pela finitude e faz dos cargos uma história que quer contar aos netos, ou antevê uma perpetuidade dentro da coisa num outro cargo pode levar a que os jogos que ele controla saiam todos endogamicamente viciados, sobretudo quando encheu a coisa de amigaços, clientes, cunhados e jovens viúvos ou viúvas, todos donos da casa desesperados. O contribuinte é que paga e a instituição dita pública corre o risco de assim ser clandestinamente privatizada. O filme está, neste momento, a correr em muitas e variadas salas desta decadência com muitas troikas…

Adoro aquela retórica que se diz contra a retórica, uma retórica tão boa que até parece não ser retórica, onde a palavra, puxando a palavra, finge que faz acção. Porque, entre a teoria e a prática, tudo é praticamente teórico, quando não é teoricamente prático. Há séculos que nos enrodilhamos nesta armadilha de sermão, para que, dizendo eu que faço, possa ficar no vértice do argumento de autoridade, dizendo, do outro, que ele não presta, porque não faz, quando, muitas vezes, quem tem o poder, isto é, o monopólio da palavra, apenas a usa para não deixar o outro concorrer e, portanto, fazer. O bom saber, caso não seja fazer, é papagaio de papel. Há muitos operacionais do situacionismo que adoram transformar os conceitos em preceitos.

Se ninguém morre se a Grécia sair do euro é porque, um quarto de hora antes de morrermos, já estamos todos mortos, mesmo que digamos sermos “encore vivants”. Pobre Europa semovente, para que Merkel, Sarkozy e o restante PPE não percam eleições.

Um determinado senhor pede que eu seja erradicado de uma associação de que não faço parte. Agradeço o esforço, mas a sítios que ele pensa ser dono, sou costume ir por convite, precisamente para ele não me erradicar. Um problema de hospitalidade e de boa educação. Ou melhor, de berço.