Um ano depois, podemos reconhecer a verdade da ditadura dos factos: vivemos em protectorado, o memorando passou a ser superior à constituição, e 85% da nossa representação parlamentar subscreve o estado de excepção. Por outras palavras, a UE, com duas cabeças na troika, bem como o FMI, são uma espécie de super-estados da geo-finança e da geo-economia. E o dito bom e velho Estado, o estado a que chegámos, tem de parecer bom aluno, isto é, governança sem governo, em regime de pilotagem automática, para que os protectores lhe possam dar boa notação e troikos. Infelizmente, ficou à solta o foco colonizador das velhas companhias majestáticas, as dos privilégios da economia privada, mas sem economia de mercado, privatizando os lucros e nacionalizando os prejuízos. E sem justiça, tanto não há a mobilização da república, ou comunidade, como poderá responder-se, ao regime do governo de espertos, com esse estádio superior do indiferentismo que é a anomia. Por outras palavras, podemos deixar de ter portugueses, enquanto cidadãos individuais, autonomia da sociedade civil, instituições e empresas. Logo, o Parlamento é o espelho dessa nação sem a força viva do povo; o PS e o PSD/CDS, espelhos um do outro; e o presidente, mera bissectriz de tal paralelograma de forças. Daí, o perigo de uma democracia sem povo, se a partidocracia nos conduzir à democratura. Porque, nesta Europa a várias velocidades, sem solidariedade nem inclusão, com o modelo social declarado morto pelo presidente do BCE, poderemos ser apenas estipendiários, os que apenas trabalham sem cidadania, ou, dito de outro modo, os que precisam do cheque e não podem chocar-se muito, até porque adoram pirómanos-bombeiros, mesmo com emblema de ministros.
Daily Archives: 5 de Abril de 2012
Estado social e Alfredo da Costa
Medina Carreira foi considerado profeta da desgraça. Pode orgulhar-se. O presidente do Banco Central Europeu já o ultrapassou, ao passar a certidão verbal de óbito ao chamado modelo social europeu. Entretanto, num exercício de mera propaganda, líderes políticos lusitanos prometem ou contraprometem coisas para o ano de 2015. E ainda há quem finja acreditar.
Vítor Gaspar não é apenas um tecnocrata, mas um mestre-pensador, esse caminho a que se acede pela definição de um conceito entendido como substância, donde, depois, se desce dedutivamente, do axioma para o concreto, através de um rendilhado lógico de definições e subdefinições, hierarquicamente arrumadas e terminologicamente controladas pelo dicionário ideológico. E nem o gato do Honório o apoquenta. Logo, vale a pena ver a coisa, presa no telhado e já sem rabo.
“Vérité dans un temps, erreur dans l’autre” (Montesquieu, Lettres Persannes). Dizem que o modelo social europeu está morto. “Vérité au deçà des Pyrénées, erreur au delà. » (Pascal). Os Pirinéus não existem. Dependem das campanhas eleitorais dos que querem saltar ao Eixo.
Morreu precocemente, este ilustre médico, ao 51 anos, no ano do 5 de Outubro, um pouco antes da República. Mas o respectivo sonho foi sendo semeado e, um ano antes do Estado Novo, a maternidade de Lisboa recebia a primeira parturiente. Foram milhares e milhares os naturais da freguesia de São Sebastião da Pedreira que integraram a ideia de MAC. Um dos meus rebentos aí veio ao mundo. Ficámos hoje a saber que, dois regimes depois, o sonho tem de continuar. Viva o goês Manuel Vicente Alfredo da Costa, que deu muitos novos mundos ao mundo. Obrigado!
O relatório do FMI é tão claro como o lapso: “Grande parte do ajustamento orçamental ainda tem de ser feito nos próximos anos. E, à medida que este ajustamento for ocorrendo, e se combinar, possivelmente, com um ambiente externo mais fraco, uma recessão mais profunda do que a actualmente prevista é bem possível”.
No tempo da ditadura, havia uns cigarritos, ditos fracos, a que todos chamavam mata-ratos. Eram sem filtro e já profetizavam os tempos que correm: todos os provisórios são definitivos, definitivamente provisórios, nesta supensão dos contratos, da palavra dada e dessa pesada herança dos direitos adquiridos.
O gozo que tenho de ver a campanha antiliberal do Portugal de hoje, ainda em ideologismos de trinta anos. Espreitem isto, ilustres preconceituosos: