Abr 12

O tempo beneditino do professor

Há um portugalório exotérico, oficioso, patriotorreca, o dos que decretam estórias de cima para baixo, cuspindo no microfone, com pena de já não poderem mandar os dissidentes para a fogueira. Mas há outro, aquele que apenas se vai descobrindo e que resiste, como este:
O meu reino, largo e vago,
Tem um rouxinol e um lado
E constelações no céu:
Tem um barco, um passaporte,
Quatro celtas, um Judeu.

O tempo beneditino do professor nada tem a ver com o curto-prazo dos maquivélicos detentores de um poder que precisa de ser pactado pelas pequenas e médias oligarquias das assembleias das pequenas e médias oligarquias. Os mandarins passam, as obras trabalham-se.

Há um nome sentenciado em 1 de Agosto de 1938, cujo nome está dentro do meu. Uma pequena revolta local contra o poder estabelecido, o espírito da Patuleia e da Revolta do Grelo das gentes de que sou mera consequência. Os foros e costumes que defendiam eram umas regras medievais sobre regas e louvados, contra a interferência do estadão e das espingardas da GNR. Uma questão de ADN.

Regra de ouro, o que é? É assim como o diálogo entre Patolas e Ventoinha, dos velhos Parodiantes: “Sim, Chefe! Contrariado mas vou!”. Para que o presidente Cavaco siga o discurso que fez em Florença contra a actual política europeia. Para que Mário Soares continue a dizer o que muito bem tem dito ao dizer mal. Para que um ex-ministro democrata-cristão dos estrangeiros dos socialistas denuncie o casal Merkozy. Isto é, para que o discurso da bota não bata com a perdigota. E tudo se reduza aos anti-europeístas do costume, como outrora rematou D. Policarpo.

Fui durante um anito lectivo, já há no outro século, gestor de uma cátedra Jean Monnet, numa universidade pública. Acreditava. Era preciso acreditar. Mas depois de algum esforço, de patriótica obediência, depois dessas reuniões de caça-subsídio e turismo científico, lá nas eurocracias do negócio euro-universitário, mais propício a ex-ministros, ouvi de outro catedrático lusitano, bem mais velho, e dos pioneiros na matéria, aquilo que, depois, pratiquei imediatamente: “estou farto do rolo compressor!”. Continuo europeísta, mas contra este situacionismo europeu.

Convinha repetir o óbvio: a grande culpa do nosso endividamento desorçamentado está na engenharia financeira que as regras europeias nos obrigaram a praticar, copiando os grandes, para que se fingisse que não era verdade aquilo que todos sabiam que era uma mentira. Os critérios formais da maastrichtomania são uma das principais causas do presente desastre, com que os irmãos-inimigos do bloqueio do centrão nos enredaram. Não acredito em bombeiros pirómanos.