Radical do centro, liberal e nacionalista

Nestes sábados que, há anos, ainda eram de São Expresso, em bipolarização com São Semanário, cá pelas fragas da serra, longe de Aveiro e longe de Lisboa, antes que sejamos submersos pelas nótícias sobre a próxima eleição papal, vou ficando a saber que somos o país da Europa com mais advogados “per capita”, para podermos ter a justiça mais morosa do mesmo espaço, tal como somos o que mais gasta em educação e saúde, para termos os piores serviços públicos de educação e de saúde. Apesar de continuar a ser ensurdecedora a música celestial dos eternos reformólogos da justiça, da educação e da saúde, essas doutas vacas sagradas, entre os que se sucedem como ministros do Bloco Central de interesses e os que passam a eméritos, jubilados e reformados, para darem sentenças sobre aquilo que, quando estavam no activo, espatifaram. O que vem dar razão ao engenheiro Ezequiel de Campos, o seareiro que foi ministro do governo esquerdista do José Domingues dos Santos e que chegou a ser indigitado para voltar a tais funções pelo primitivo 28 de Maio, para quem o nosso problema sempre foi o da “organização do trabalho nacional”. E hoje continuam a faltar-nos os ezequiéis construtores de barragens, isto é, tecnocratas com alma de reformadores políticos. Vale-nos que José Hermano Saraiva, em “A Capital”, talvez candidatando-se à categoria de intelectual do ano pelo mesmo jornal, sempre ávido por ministros do “ancien régime”, vem dizer que “Salazar era um santo e um judeu”. Na primeira qualificação, esperamos por um processo expedito, a ser desencadeado por D. José Saraiva Martins, o segundo dos nossos “papabile”. Na segundo, apenas recordamos o que disse José Lopes de Oliveira, um historiador anti-salazarista e ex-militante republicano radical, que chegou a proclamar um dia: “Salazar é judeu”, logo dizendo que o podia provar, “ele é meu primo…”. Para os devidos efeitos, comunico que continuo como sempre, nestes breves aforismos conspiradores, sofridos no exílio interno, lá para os lados de São Julião da Ericeira, de costas para a Corte e com os sonhos postos no Atlântico, até porque sou e sempre fui um tradicionalista que detesta os reaccionários e que, para ser de direita, tem de assumir-se como um radical do centro. Porque um liberal liberdadeiro deve ser libertacionista para servir a justiça. Tal como um nacionalista que assuma a armilar tem de ser mais universalista do que soberanista.     A esmagadora maioria dos representantes da nação, tal como a dos professores que temos, usurpa um título, dado que todos eles apenas têm licença para continuação dos estudos, de acordo com a etimologia e a designação institucional do canudoO poder enlouquece, o poder absoluto enlouquece absolutamente (Alain). Infelizmente, o fundo da questão continua a fugir-nos da lupa da investigação e quase me apetece contar uma história real, em que participei, quando um ilustre político em funções me chamou ao respectivo gabinete de poder, solicitando-me que o ajudasse, na presença, aliás, de um terceiro, seu colega de função, a escrever uma carta de exoneração, porque tinha um ilustre colaborador, de outro partido, que deveria ser preso em flagrante, por actos de corrupção. Ajudei-o naturalmente. Mas, no fim da labuta, perguntei-lhe se ele já tinha comunicado a coisa ao respectivo chefe de partido. Ele respondeu-me que não, porque o dito estava no estrangeiro e só voltaria dentro de dias. Power tends to corrupt and absolute power corrupts absolutely(Lord Acton). A carta foi escrita. O chefe regressou e a carta não foi enviada. O corrupto continua impune. O tal meu amigo continua nas mesmas funções. E o referido chefe continua a brilhar ainda mais. Todos eles são considerados exemplos de bons e extraordinários políticos e enchem-nos os olhos e os ouvidos de discursos sobre a moralidade política. À excepção do tal colaborador corrupto, onde aparecem cada vez mais sinais de que, mais dia, menos dia, será apanhado. It has been said that power tends to corrupt, but that loss of power tends to corrupt absolutely (John Ruskin). Esse político, meu amigo, talvez por remorso, nunca mais me contactou. Continuo a considerar que ele é honesto, mas tratei de o incluir na categoria dos incorruptíveis que sobrevivem pela boa gestão de corruptos que sabem fazer. Dos que chegam ao fim do dia e fazem o respectivo exame de consciência, concluindo que, por acção e omissão, ao somarem as colunas do bem e do mal, reparararam que a balança pendeu para a primeira opção. Corruption, the most infallible symptom of constitutional liberty (Edward Gibbon). Tenho a certeza que esse tal político meu amigo, se lhe dessem o estatuto de arrependido, poderia, ao pôr a boca no trombone, desvendar as teias e os apitos que alimentam esta rede de canalhocracia em que estamos envolvidos, dado que uma pequena minoria de corruptos está a estragar a imagem de uma maioria de políticos honestos, que são deglutidos pelos inferno das boas intenções. É a isto que chamo sistema e que se transformou num mostrengoFlattery corrupts both the receiver and the giver (Burke). Acrescento que nada há de novidade debaixo do sol da sociedade aberta e pluralista. Mesmo na história de anteriores regimes políticos portugueses, esta degenerescência sempre aconteceu, tanto na monarquia liberal como na Primeira República. Mas hoje, há um aparelho de leis e de magistrados como, anteriormente, não existia, pelo que é, no mínimo, pisarmos as raias da incompetência, deixarmos que a degradação continue.Among a people generally corrupt, liberty cannot long exist (Burke). E lá volto à azáfama das aulas, onde a recepção da bolonhesa ameaça muita massa mal cozida e bastante carne picada de duvidosa proveniência. Valem-nos os molhos, ingredientes, especiarias e outros condimentos que disfarçam a realidade. Basta fazer contas: onde antigamente havia quatro anos de licenciatura, dois de mestrado e outros tantos de doutoramento, há agora três, no primeiro grau, um, no segundo, e eventual chouriçada no terceiro. Por outras palavras, graças à concorrência e à mobilidade, grande parte das escolas pode cumprir o primeiro grau, mas já não atingirá o segundo, pelo que os orçamentos de Estado assistirão à redução dos cogumelos, sem terem que declarar entidades em degradação pedagógica ou que atender às sugestões das comissões de avaliação. Se eu pudesse influenciar quem manda, em vez de lavar as mãos como Pilatos e de ser vítima da celestial demagogia dos profissionais do reformismo, aconselhava um pouco mais de patriotismo científico e uma adequada estratégia, para a gestão dos recursos escassos. Na minha área, por exemplo, seguia o modelo francês de concentração de esforços no ensino superior público, independentemente dos interesses dos concordatários e dos que andam na procura do lucro. Por outras palavras, tinha bom senso…

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