Nov 22

Sejamos independentes e dignos dos objectivos nacionais permanentes!

Dizer que a morte de um soldado em combate equivale a um simples acidente previamente admissível pelo tecnocrático cálculo das baixas de uma missão militar ou acentuar que o mesmo é um mero voluntário reduzindo a trágica circunstância ao aleatório do jogo da vida e da morte numa profissão de risco é negarmos o nosso próprio fundamento nacional. Quem não entender que as pátrias são comunidades simbólicas fundadas em laços de amor nunca poderá assumir que só podemos amar as coisas pelas quais estamos dispostos a dar a vida. Aliás, neste regime que deve a sua existência e estabilidade tanto a um golpe militar como ao voluntário regresso dos militares aos quartéis, pela renúncia ao poder de controlo da legalidade revolucionária, temos assitido, sem muitos queixumes, à redução das próprias forças armadas a um mero corpo técnico, destinado a intervenções cirúrgicas de pequena monta, como auxiliares dos nossos tradicionais aliados. Nota-se até um certo clamor que as pretende transformar em mero sucedâneo de forças policiais ou civis, nomeadamente de bombeiros e guardas fiscais. Mais recentemente até as deixámos enveredar por redutores movimentos sindicais, com muitos comunicados e notas oficiosas, em ritmo de guerra de papéis, a que não faltou o espectáculo das manifestações de rua ou de jantar. Transformámos até aquilo que eram prestigiadas instituições de consenso nacional em quase clubes de certas cliques universitárias ou de gabinetes de estudo de fragmentações sediciosas, promovidas por ministros do reino de vontade estranha, que usaram e abusaram do saneamento e da inquisitorial devassa, num ambiente mais próximo do politiqueirismo das comadres e dos compadres que do necessário esforço de pensamento convergente com os objectivos nacionais permanentes. Não faltam imensas guerrazinhas de homenzinhos, com telenovelas, passagens de modelo e tragicomédias, onde entraram espiões e simuladas fugas aos segredos de Estado que ainda há não muitos anos até levaram à demissão de um venerando ministro. Por mim, não gostaria de ver resvalar as nossas forças armadas para uma tecnocratice que as venha a enfileirar nas teias integradoras de uma nova Grande Armada, que se julgue invencível e acabe derrotada. Nem gostaria de meras chefias que se reduzissem a engenheiros da teoria das organizações, capazes de um grau de prontidão interessante na execução das ordens de um qualquer “big brother” que nos faça parcela de um super-sistema independente da vontade nacional. Preferia instaurar um regime militar helvético, como chegou a ser sonhado pelo governo provisório da Primeira República. Repito o que há dias aqui enunciei: não há democracia sem soldados. Não há política sem democracia. Não há democracia sem pátria.

Nov 22

Dos pulos do super-mário ao necessário Sancho Pança, com passagem pela física das partículas, Jean Monnet e o afro-estalinismo libertador

Foi ontem encerrado o ciclo de uma certa aventura da dita avaliação do ensino superior. Bastou um simples discurso do esfíngico e notabilíssimo ministro das ciências exactas e das universidades místicas, para que o mais cavaquista dos membros do presente governo socialista, atendendo ao perfil de física das partículas com que sempre geriu os respectivos silêncios, proclamasse a nova teoria da hiper-relatividade da nossa autonomia nacional. Afinal, os ilustres primazes que nos avaliavam, em regime de transacção lobística entre escolas públicas, privadas, concordatárias e politécnicas, apesar dos muitos gastos e honrarias, têm que ceder a comissões de sábios, não estrangeiradas, mas supra-nacionais, vindas do sítio criado pelo discurso de Marshall e onde tivemos como embaixadores Pedro Roseta, Basílio Horta e Ferro Rodrigues. E tal como na história do ovo de Colombo, afinal todos estão de acordo com o furo, promovendo-se novas visitações a esta periferia lusitana, dado que as anteriores não satisfizeram, talvez por tais profes serem tão ilustres quantos os ilustres reformados, eméritos, jubiliados e aposentados que avaliavam aquilo que uma semana antes geriam. A pátria não tem que servir de alibi para se eliminarem patológicas dores de cotovelo presidenciais. E a democracia não nos pede serviçal obediência a venerandos ministros de pretenso estadão. Por mim, prefiro a sabedoria de um qualquer Sancho Pança que opte por seguir de burro, em vez de correr atrás de dulcineias da frustração. Por isso, continuo a dizer, sem diplomática mesura, que, nesta teatrocracia de quem ostenta o microfone do poder, há muitas ilustres tristes figuras que vão nuas de crenças, sonhos e princípios, coisa que normalmente sucede aos que, perdendo a bússola das ideias, entram em certo rodopio das cabras-cegas e não conseguem saber do necessário Norte que nos dê rota para navegarmos rumo a um qualquer porto seguro.

Nov 21

Chuva, capitaleiros, voyeurismo, freitismos e missas por alma de Salazar e Franco

A fluida chuva vai plenificando o ar da manhã e todos vamos sorvendo as gotícolas de um molha-tolos que nos vai felizmente ensopando. Fecho os ouvidos às notícias que nos trazem os bailados das candidaturas presidenciais e os discursos enlatados dos principais actores do processo. As pingas continuam impertinentes, insistentes, saudosas, enchendo barragens secas, lavando as ruas cinzentas da cidade e convidando-nos a ficar em casa. E não apetece circular pela engenharia analítica do nosso político-social, porque em tais teias não vislumbramos qualquer sinal de esperança, mesmo que os qualifiquemos como do mal, o menos. Os capitaleiros são uma estreita casta social que há dois séculos vive entalada entre as sinecuras concedidas pela mesa do orçamento, distribuídas pelo Terreiro do Paço, e o culturalmente correcto, gerado pelas divagações etéreas na linha de Cascais, com direito a férias no além-Portela e finíssima educação nas mecas da Europa e dos States. São eles que proclamam em quem povo deve votar, para atingirmos a modernidade, e como o mesmo povo deve ser educado, para se livrar das trevas medievais. Há dois séculos que eles estão sempre de acordo com o vento novo e até conseguem conjugar o tempo do verbo da moda que passa de moda. Os últimos exemplares desta espécie em vias de extinção, filhos de gente bem salazarenta , viveram os delírios sessentões da extrema-esquerda do “make love, not war”, apesar de agora teorizarem a moderação com as tesouras do verbalismo radical, não vá alguém reparar que só é novo aquilo que se esqueceu. Para visitarmos a reserva ecológica onde ainda se manifestam esses descendentes dos sucessivos devorismos que fazem apodrecer os nossos regimes políticos, basta visitarmos alguns dos repositórios das representações sociais de tais donos do poder, percorrendo algumas folhas de opinião que nos querem controlar e certos livros de pretensas memórias, onde eventualmente podemos excitar-nos com alguns “voyeurismos” e inconfidências. E lá vamos ouvindo em fundo o ruído dos presidenciais que não passam de mera consequência de uma teia sistémica que lhes dá causa. Não passam de regressos anunciados, de simples expressão de certa literatura revisionista de justificação, onde a invocação de vidas passadas apenas anuncia a eventual chegada de mais uns louros para as distintas biografias que já ostentam. Felizmente que, por cá, já não se fazem missas em memória de Salazar , pois os respectivos ministros e hagiógrafos preferem um lugar de quentinho tacho, nas comissões de honra dos presentes candidatos presidenciais. E não o fazem como os tradicionais viracasacas e adesivos, mas antes como confirmadores da efectiva evolução na continuidade, assim demonstrando que, para além dos regressos, o que é permanecente nesta decadência da pátria reduz-se à falta de vergonha, nessa moluscular postura dos flexíveis sem espinha que sabem gerir as flutuações do politicamente correcto. Na verdade, todos os situacionismos coincidem na mesma gentalha de perfil ministerial, onde os ministros do “ancien régime”, à espera da Viradeira, nunca iriam a missas por alma do defunto que serviram, coisa que apenas cabe aos maluquinhos extremistas que não sabem fazer a tradicional bissectriz, que vive dos oportunismos dos que sabem ler os sinais dos tempos.

Nov 21

De Madonna a Garcia Pereira, mas sem música celestial

Muitas vezes começamos a escrever sem termos mesmo nada para dizer, confiando que, do mero ritmo de uma escrita automática, possa emergir uma qualquer ideia que nos acorde do torpor, para que, palavra a palavra, possa nascer o “logos” que capture uma qualquer semente de pensamento, neste fluir da palavra escrita que vai viajando pelo grande armazém do espírito desse colectivo da humanidade que é a multidão dos muitos milhões de homens que vivem no ritmo do fala-só. Por mim, bastou-me sentir o último “videoclip” de Madonna para concluir que os norte-americanos nos conseguem conformar o gosto quotidiano, só porque souberam transformar uma “way of life” em valores tão naturais quanto o próprio ar que respiramos.

 

 

 

E reparo como nalguns blogues de candidaturas presidenciais se perde a agressividade propagandística das ideologias e se humanizam os revolucionários em mergulhos nas águas azuis, por onde os proletários se afundam e os grandes educadores andam à caça dos pides que morram na rua. Por mais que se esforcem, não conseguem copiar o estilo da “american way of life”, essa espécie de selecção europeia dos emigrantes insatisfeitos, à procura de um novo mundo que, no além-mar, semearam a filosofia do desejo do homem comum. Daí que seja paradoxal a obsessão pelo discurso anti-americano que domina certas falsas elites lusitanas que citam Noam Chmsky para criticarem George W. Bush. Os mais americanistas de nós todos podem ser afinal os que traduzem em calão o discurso anti-americano que da América nos vem.

Nov 21

De Madonna a Garcia Pereira, mas sem música celestial

Muitas vezes começamos a escrever sem termos mesmo nada para dizer, confiando que, do mero ritmo de uma escrita automática, possa emergir uma qualquer ideia que nos acorde do torpor, para que, palavra a palavra, possa nascer o “logos” que capture uma qualquer semente de pensamento, neste fluir da palavra escrita que vai viajando pelo grande armazém do espírito desse colectivo da humanidade que é a multidão dos muitos milhões de homens que vivem no ritmo do fala-só. Por mim, bastou-me sentir o último “videoclip” de Madonna para concluir que os norte-americanos nos conseguem conformar o gosto quotidiano, só porque souberam transformar uma “way of life” em valores tão naturais quanto o próprio ar que respiramos.

E reparo como nalguns blogues de candidaturas presidenciais se perde a agressividade propagandística das ideologias e se humanizam os revolucionários em mergulhos nas águas azuis, por onde os proletários se afundam e os grandes educadores andam à caça dos pides que morram na rua. Por mais que se esforcem, não conseguem copiar o estilo da “american way of life”, essa espécie de selecção europeia dos emigrantes insatisfeitos, à procura de um novo mundo que, no além-mar, semearam a filosofia do desejo do homem comum. Daí que seja paradoxal a obsessão pelo discurso anti-americano que domina certas falsas elites lusitanas que citam Noam Chmsky para criticarem George W. Bush. Os mais americanistas de nós todos podem ser afinal os que traduzem em calão o discurso anti-americano que da América nos vem.

Nov 18

Não há democracia sem soldados, não há política sem democracia, não há democracia sem pátria.

No momento em que tomamos conhecimento da morte de um soldado português na guerra da grande coligação internacional contra o terrorismo, no Afeganistão, importa recordar o discurso de Péricles em 430 a.C., considerado o discurso fundador da democracia ocidental e proferido precisamente em homenagem aos soldados mortos pela pátria. Numa democracia onde não estávamos habituados à dimensão da tragédia, importa reconhecermos em solidariedade a memória desse soldado morto ao serviço da nossa comunidade política, sem cairmos nas habituais tentações das cobardes carpideiras. Não há democracia sem soldados, não há política sem democracia, não há democracia sem pátria. “Temos um sistema político… que se chama democracia, pois se trata de um regime concebido, não para uma minoria, mas para as massas. Em virtude das leis (…), todas as pessoas são cidadãos iguais. Por outro lado, é conforme a consideração de que goza em tal ou tal domínio que cada um é preferido para a gestão dos nossos negócios públicos, menos por causa da sua classe social do que pelo seu mérito. E nada importa a pobreza: se alguém pode prestar serviço à comunidade, não é disso impedido pela obscuridade de sua categoria. É como homens livres que administramos a polis… ”

Nov 18

Nunca fui militante e muito menos dirigente do PP

O semanário “O Independente” traz hoje uns comentários meus ao discurso da candidatura presidencial de Jerónimo de Sousa. Apesar de terem surgido através de uma entrevista telefónica, foram correctamente seleccionados em quase todas as secções. Apenas o título não corresponde aos meus devaneios interventivos. Daí ter mailado o seguinte à jornalista Liliana Valente:

 

 

Apesar das dificuldades naturais da comunicação telefónica, julgo terem sido seleccionados de forma correcta os meus comentários ao discurso Jerónimo. Peço, contudo, que seja feita uma correcção: nunca fui militante e muito menos dirigente do PP de Manuel Monteiro. Fui militante e dirigente do CDS, sem PP, uns anos antes, com Francisco Lucas Pires e Adriano Moreira e passei a dissidente com o regresso de Diogo Freitas do Amaral. Não regressei com Manuel Monteiro, nem com Paulo Portas, nem com José Ribeiro e Castro. Colaborei também com a fundação da Nova Democracia, presidida por Manuel Monteiro, mas também decidi dissidir já lá vai um ano.

Como saliento no meu blogue (http://tempoquepassa.blogspot.com) assumo-me como “um tradicionalista que detesta os reaccionários”, e que “para ser de direita, tem de assumir-se como um radical do centro. Um liberal liberdadeiro deve ser libertacionista para servir a justiça. Tal como um nacionalista que assuma a armilar tem de ser mais universalista do que soberanista”… Para bom entendedor, até nem são meias palavras.

Desculpe este desabafo identitário….mas só assim se compreende como chamava soberanista ao Jerónimo. E aos outros que não eu…

José Adelino Maltez

Nov 18

Nunca fui militante e muito menos dirigente do PP

O semanário “O Independente” traz hoje uns comentários meus ao discurso da candidatura presidencial de Jerónimo de Sousa. Apesar de terem surgido através de uma entrevista telefónica, foram correctamente seleccionados em quase todas as secções. Apenas o título não corresponde aos meus devaneios interventivos. Daí ter mailado o seguinte à jornalista Liliana Valente:

Apesar das dificuldades naturais da comunicação telefónica, julgo terem sido seleccionados de forma correcta os meus comentários ao discurso Jerónimo. Peço, contudo, que seja feita uma correcção: nunca fui militante e muito menos dirigente do PP de Manuel Monteiro. Fui militante e dirigente do CDS, sem PP, uns anos antes, com Francisco Lucas Pires e Adriano Moreira e passei a dissidente com o regresso de Diogo Freitas do Amaral. Não regressei com Manuel Monteiro, nem com Paulo Portas, nem com José Ribeiro e Castro. Colaborei também com a fundação da Nova Democracia, presidida por Manuel Monteiro, mas também decidi dissidir já lá vai um ano.
Como saliento no meu blogue (http://tempoquepassa.blogspot.com/) assumo-me como “um tradicionalista que detesta os reaccionários”, e que “para ser de direita, tem de assumir-se como um radical do centro. Um liberal liberdadeiro deve ser libertacionista para servir a justiça. Tal como um nacionalista que assuma a armilar tem de ser mais universalista do que soberanista”… Para bom entendedor, até nem são meias palavras.
Desculpe este desabafo identitário….mas só assim se compreende como chamava soberanista ao Jerónimo. E aos outros que não eu…
José Adelino Maltez

Nov 17

Prefiro a plenitude do combate ao cinzento da cobardia

Passei alguns dias a peregrinar pelo mistério da polis, viajando pelos meandros daquelas comunicações íntimas com as profundas correntes do pensamento, onde as ideias não têm tempo nem sequer direitos de autor e até nos sentimos humildes discípulos e servidores de uma continuidade neo-clássica da política, entendida à maneira greco-romana, quase como uma religião secular. Nenhum desses papagaios das vulgatas gnósticas que por aí pululam no pensamento dominante, das modas que passam de moda, e que, de vez em quando, têm a ilusão de nos comandar, só porque pensam ser o pensamento único de uma pretensa elite que arroga no monopólio da inteligência, é capaz de assumir a humildade de se reconhecer como simples servidor da ideia plurissecular de democracia, respublica, regnum ou Estado de Direito. As ideologias que enclausuraram o século XX, e que ainda nos prendem, talvez não passem de operações massificadas por intelectuários que colheram as sementeiras filosóficas do século XIX, nesse jogo do longo prazo em que se traduz a política. Porque o chamado progresso, enquanto aumento quantitativo da cultura, não assentou em sólidas e profundas raízes civilizacionais. Os acontecimentos de encruzilhada que nos marcam, neste dealbar do século XXI, são assim meras consequências de um paralelograma de forças ideológicas passadas e dos respectivos subsolos filosóficos. Importa, pois, ir além daquela espuma dos acontecimentos que marca o ritmo da hiperinformação desta aldeia global que, hora a hora, nos traz notícias em forma de relato pretensamente histórico, conforme o ritmo dos telejornais. Importa viajar nos meandros dos sistemas de ideias que já não pensadas por ninguém e nas teias da pirâmide conceitual das ideologias, para podermos atingir o subsolo de pensamento onde radicam. De qualquer maneira, a consciência da crise política que vamos vivendo leva alguns a voltar a ter a ilusão da ideia geométrica de reforma do sistema político, como se fosse possível passarmos de mero corpo político a estruturado organismo político sem ser em nome de uma ideia de política, em nome da racionalidade e da virtude da justiça. Daí cairmos em certo desespero, a que damos os nomes de revolução ou de tradição, com o qual procuramos regenerar o corpo decadente, rejeitando o tempo perdido e procurando a pureza primitiva que nos fundou, sempre em torno do nosso próprio eixo. Sabemos, de pensamento pensado, que qualquer sistema degenera, quando esquece a ideia original que lhe deu empresa, esse impulso genético donde se veio e para onde se tende. Logo, qualquer reforma, longe de ser movimento pelo movimento, tem que relembrar a ideia matriz e procurar o mais além que nos deu raiz. Quando um sistema esquece os princípios que lhe deram princípio todo o esforço de mudança se pode perder nos meandros decadentistas da rotina, onde os que desesperam podem superar os que ainda têm esperança. De outro modo, podemos cair no vício positivista do rebaixamento dos fins da polis se apenas elaborarmos doutrinas de um dever-ser pensado no simples acaso de uma conjuntura. Porque, se confundirmos o transcendente com um mero politicamente correcto da simples encruzilhada, corremos o risco de transformarmos o além num mero articulado, embalado no papel de fantasia da abstracção codificante, ao estilo dos constitucionalistas que comentam as crises quotidianas nesta teledemocracia, enredada nas teias conceituais hierarquistas de certa engenharia de seita. E quando, para compensarmos a secura da hermenêutica constitucionalista, recorremos aos filósofos de pacotilha, como são os importadores de ideias exóticas que servem de agentes colonizadores, porque maus estrangeirados, podemos padecer daqueles habituais engasgamentos que mandam o patego olhar para o balão de certo provincianismo mental que nos endogamiza. O mais que nos pode acontecer é continuarmos a alimentar a bolsa dos “best sellers” das ideias enlatadas, onde abundam os que dizem mal de nós mesmos só porque se destribalizaram, nessa habitual cedência ao pacovismo da ilusória modernidade que nos faz traduzir em calão arrabaldes de Paris, Londres ou Washington. Detesto essa modernidade empacotada do dever-ser que regista, no cúbico concentrado de uma ideologia, todos os sinais dos pretensos amanhãs que cantam, explicando os recentes motins de Paris com os mesmos argumentos com que analisam a ascensão ao poder de Bush, da guerra do Iraque ou do Holocausto. Daí que, neste portuguesíssimo dealbar do século XXI, todas as discussões doutrinárias entre a direita e a esquerda se façam entre antigos marxistas-leninistas-estalinistas-maoístas, desde os neo-liberais de pacotilha, que nos vendem doutrina social católica, aos neo-socialistas ditos utópicos, que cantam a ecologia ou lutam contra a globalização. Acontece até que algumas destas sumidades se assumem como o paradigma do académico, não faltando os que apenas pintam de autenticidade meros fantoches em delírios semoventes, nomeadamente os que, sentados no coiros dos subsídios, continuam a invocar a respectiva estrada de Damasco, numas quaisquer férias universitárias onde encontraram a luz que os fez afastar dos antros apodrecidos de uma juventude extremista. Desses pretensos monopolizadores do politicamente correcto só porque depois se transformaram em transportadores da pasta de dois ou três manitus, em regime de carência afectiva de discípulos. Porque continuam por aí a circular dois ou três vermes gerontocráticos cuja falta de autenticidade tanto os levou a fazer discursos institucionalistas, quando as instituições que lideravam lhes serviam de instrumento para a personalização do poder, como logo a seguir procuraram despedaçar a boneca e quando passaram para o adversário, onde vislumbraram a continuidade frondosa do respectivo eucaliptal, feita de muitas chorosas viúvas da revolução frustrada. E nesta terra de cegos, eles continuam a despedaçar bonecas institucionais, apenas porque lhes deram agendas carregadas de teclas donde podem premir a obtenção rápida do elogio ou do subsídio, neste regime de mão estendida e de bailados de corte, onde muitos dobram a espinha. Porque o pior da falta de autenticidade é o modelo do psicopata sentenciador e oracular que, vestindo o hábito do pensador, apenas transforma a falsidade na roupagem vocabular do falso mestre-escola. O que, variando de norte e de discipulagem, apenas se notabiliza por trair os ingénuos crentes, dado que não consegue assentar em qualquer profunda corrente do pensamento. Por mim, prefiro continuar nesta encruzilhada de resistência, neste individual prazer de preferir a renúncia à cedência, dizendo “não, não vou por aí”. Prefiro a plenitude do combate ao cinzento da cobardia.

Nov 17

O choque em cadeia das presidenciais ameaçando a blogosfera

Vários candidatos presidenciais, marcados pela vertigem eleitoralista, chocaram-se hoje, em plena campanha. Para alguns, o culpado foi, mais uma vez, o fatídico nevoeiro sebastianista. Para outros, os defeitos da condução. Julgamos que se todos fossem de burro, haveria menos chapa batida.

 

Acontece, contudo, que nas minhas peregrinações pelos parceiros da blogosfera, cheguei à triste conclusão que este campanheirismo presidencial transformou vozes até aqui independentes em simples militantes desse efémero, sendo raros os blogues de referência de alguns destacados apoiantes do cavaquismo, do soarismo e do alegrismo que conseguem escapar à tentação. Alguns deles, praticamente deixaram de ver mais mundo, para além das virtudes dos candidatos que apoiam, deixando-nos empobrecidos. Ben preferiria que reservassem o propagandismo para os blogues colectivos e não-oficiais das comitivas candidatas.

 

Apenas apetece dizer que neste Novembro de dias cada vez mais curtos, cada vez mais frios, quando nos revestimos de lã e acendemos as lareiras, vai apetecendo o calor do lar vencendo a solidão da revolta. Porque o cair da folha é apenas sinal de um renascer que há-de florir na primavera. E como todos os outros, eis que me resguardo em semente preparando o regressar do sol, esperando que ele trespasse as vidraças que me aconchegam, para que as fibras do sonho mobilizem o torpor.