Fev 12

Darwin, com socialistas a reconhecerem que pode haver um César, aqui e agora, e homossexuais a admitirem que a Igreja Católica tem o monopólio de Deus

Neste dia de aniversário de Charles Darwin, importa reconhecer que o evolucionismo gerou alguns descendentes do despotismo, como um tal Mugabe, enredado noutro aniversário, com prendas milionárias pré-determinadas e muita lagosta. Porque Darwin aplicado às teorias sociais, com as ideias de selecção natural, luta pela vida e sobrevivência dos mais aptos, gerou todo um esquema causalista e determinista, desde o evolucionismo de Herbert Spencer, com a ideia de organismo social, considerando que as relações existentes entre todos os organismos vivos, sejam as de luta pela vida ou de cooperação, são as mesmas que as existentes nas relações entre os animais ou entre os homens, ao próprio marxismo que, como reconhece Lenine, foi por ele dominado.

 

Mesmo os irmãos-inimigos do neo-reaccionarismo, como Charles Maurras, defenderam a selecção do mais apto, considerando que na biologia, a igualdade só existe no cemitério, porque a divisão do trabalho implica a desigualdade das funções, porque o progresso é aristocrático. Nem sequer escaparam os defensores determinismo geográfico e os do determinismo racial, como Taine. Por outras palavras, da extrema-esquerda à extrema-direita, do comunismo ao reaccionarismo, passando pelo racismo, todos inventaram criaturas ideológicas que o invocaram como criador.

 

Se é justíssima a lembrança de um dos maiores pensadores de todos os tempos, importa também notar as limitações ideológicas dos respectivos invocadores. Ficam apenas as palavras de Lenine: Darwin pôs fim à concepção segundo a qual as espécies de animais e plantas não estavam de modo nenhum ligadas entre si, sendo acidentais, ‘criadas por Deus? e imutáveis, e que foi o primeiro a dar uma base estritamente científica à biologia, estabelecendo a variabilidade e a continuidade das espécies. E recordo-as para podermos compreender como grande parte da nossa elite, a que se arrependeu do marxismo, aproveita a homenagem para, matando o pai Marx, continuar a seguir o avô, mas sem perceber que ele teve, como netos,  asquerosos racistas, limitados reaccionários e pretensos cientistas da máquina do Estado, sejam darwinistas ou não darwinistas, crentes ou agnósticos, à boa maneira daquele Trofim Lysenko que, enganando-se nas sementes, levou a União Soviética à fome.

 

Veja-se o ambiente de sociologia de luta que marcou o nosso dia parlamentar de ontem, onde pareceu que voltámos a um ambiente de macacos evoluídos, quando os insultos incendiaram aquilo que devia ser um exemplo: a casa da nossa democracia. Os guinchos do argumento fraco, superaram a serenidade persuasiva do discurso do argumento forte, como assinalava Brito Camacho, só porque as caricaturais hipérboles do imaginário de Pinóquio de uma jota irritaram quem se vitimiza como alvo de uma campanha negra. Como se quem estivesse contra o detentor do poder supremo tivesse que cair necessariamente nas perguntas insultuosas. E a histeria foi de tal maneira de  mau-gosto que até Louçã vestiu o heterónimo da moderação, enquanto o patrão da Jerónimo Martins veio a terreiro dizer que a “iniciativa privada não tem que aturar isto” e tem “muitos sítios para onde ir”.

 

Face à demagogia, os gestores das conferência de imprensa da Igreja Católica entraram no sofisma sacrista do bate e foge. Num dia, por causa dos casamentos de homossexuais, mandaram não alinhar com partidos que ofendam os respectivos valores. No outro, pondo água na fervura, e lembrando-se dos resultados do referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez, vieram esclarecer que mandar não votar em determinadas ideias não pode qualificar-se como apelo ao voto, o que logo levou Sócrates a congratular-se expressamente, depois de assumir a sua pobreza franciscana da classe remediada alta e talvez pensando na sugestão do ex-bastonário Pires de Lima sobre a transparência do respectivo património. Aliás, deputados e representantes do grupo de pressão LGT logo citaram Jesus Cristo, sobre o dar a Deus o que é de Deus e a César, o que é de César. Com socialistas a reconhecerem que pode haver um César, aqui e agora, e homossexuais a admitirem que a Igreja Católica tem o monopólio de Deus.

 

Como ontem dizia ao Meia Hora, antes da segunda intervenção da CEP, esta atitude da Igreja “é uma espécie de chicotada psicológica para levar o PS a negociações e a uma solução de meio-termo”. Com efeito, “o pior que podia acontecer agora era um conflito entre política e religião” e, como tal, “vai haver alguma pacificação”. Até porque “a Igreja não tem poder de mobilização de massas e de mobilização política e também nunca o fez”. Aliás, se tomarmos à letra a promessa de Sócrates, a discussão pública pode levar a uma espécie de armistício moral, se nos iluminarem exemplos de legislações europeias, há muito consensualizadas, que não confundiram a necessidade de protecção pública da liberdade contratual dos homossexuais, com um metacontrato ou instituição que, antes de ser do direito canónico já era do direito romano. Porque a mera analogia, de um contrato, não pode confundir-se com a essência de outra coisa, já  institucional, independentemente do sacramento, que é bem mais do que a bilateralidade, tendo a ver com o conceito de corrente de geração, e que permanece mesmo quando o contrato é anulado ou entra em divórcio, porque novas formas de família, nomeadamente as monoparentais, podem continuar e reforçar a ideia de obra que a liga aos avós e aos netos.

 

É por isso que reli The Origin of Species, trabalho publicado em Novembro de 1859, onde Darwin considera que todos os organismos têm tronco comum, que todas as espécies vivas são resultado da evolução e da selecção natural. In the survival of favoured individuals and races, during the constantly-recurring struggle for existence, we see a powerful and ever-acting form of selection.

Fev 12

A poesia é mais verdadeira do que a história

Pedem-me que ficcione como será o mundo depois de eu já cá não estar, no ano de 2050 depois de Cristo. Sem qualquer cedência ao cientificismo, chame-se futurologia ou prospectiva, começo por imaginar que a própria medida do tempo pode já não ter como marco esse messias, justamente maioritário, aqui e agora. Porque outro o pode superar em plenitude e vulgatas, com a emergência de novas aparições, ou com eventuais encontros com extraterrestres, se a escatologia e a ciência o permitirem. Mas talvez ainda permaneçam homens de boa vontade que sejam homens livres, se o conceito individualista, nascido das luzes do Mediterrâneo, berço do estoicismo, do judaísmo, do cristianismo e do islamismo, resistir, face aos totalitarismos grupais e aos respectivos fundamentalismos. Por mim, julgo que deixará de haver esta ficção de declararmos hipocritamente a existência de uma democracia universal, apenas permanecendo algumas democracias, as que ascenderam ao universal pela diferença, assentando no “small is beutiful” da velha “polis” e dos reinos medievais, donde  veio o conceito romântico de nação, sempre em conflito com a herança absolutista da estadualidade. Embora a esperança de uma paz perpétua, à Kant, com a sua ideia de Estado de Direito universal, ainda possa permanecer nalgumas instituições, desde a herdeira da Sociedade das Nações à união europeia, julgo que continuará a ser projecto a procura da realização do sonho dos homens de boa vontade, tentando juntar, contra a intolerância, os humanismos, cristãos e laicos, os que nos deram a revolução atlântica demoliberal, da revolução inglesa à revolução norte-americana. Se não imagino uma utopia dos “amanhãs que cantam”, à procura de uma dessas revoluções de terror, que encontrem o totalitarismo de um qualquer aparelho de poder pretensamente iluminado, nem por isso deixo de assumir a esperança, vislumbrando as sementes de bem e de mundo melhor que a humanidade tem acolhido. Em 2050, quando os meus netos forem pais e avós, julgo que eles estarão em convalescença, depois de terem sofrido novas investidas dos velhos cavaleiros do apocalipse, como novas fomes, novas pestes e novas guerras, e com os consequentes rastos de autoritarismos e totalitarismos, os tais sintomas das causas que costumam acompanhar essas degenerescências. Isto é, acredito que, depois de inevitáveis quedas, os homens concretos e o homem de sempre estarão, mais uma vez, a levantar-se, com novas frases que pensam salvar a humanidade, mas ainda sem conseguirem a salvação do mundo, essa procura da perfeição que marca sempre o homem imperfeito. Continuará por fazer a obra da “política” que, desde Péricles, sempre teve como sinónimo a “democracia”, mesmo que tivesse, ou venha a ter, um novo nome. Por isso, os meus filhos e os meus neto continuarão a ler Platão, Cristo, Buda, Confúcio, Maomé e Rousseau, bem como um desses pensadores de hoje que deconheço, mas que, de certeza, já escreveu a nova inspiração do amanhã. Porque não são os teóricos do processo histórico que fazem o homem. Será o homem a fazer a história, mas sem saber que história irá fazer. Porque ela não é causa, mas consequência. Depende das acções dos homens e não das respectivas intenções e planeamentos. Por outras palavras, continuaremos a dizer que a poesia é mais verdadeira do que a história…

Fev 12

Darwin, com socialistas a reconhecerem que pode haver um César, aqui e agora, e homossexuais a admitirem que a Igreja Católica tem o monopólio de Deus

Veja-se o ambiente de sociologia de luta que marcou o nosso dia parlamentar de ontem, onde pareceu que voltámos a um ambiente de macacos evoluídos, quando os insultos incendiaram aquilo que devia ser um exemplo: a casa da nossa democracia. Os guinchos do argumento fraco, superaram a serenidade persuasiva do discurso doargumento forte, como assinalava Brito Camacho, só porque as caricaturais hipérboles do imaginário de Pinóquio de uma jota irritaram quem se vitimiza como alvo de uma campanha negra. Como se quem estivesse contra o detentor do poder supremo tivesse que cair necessariamente nas perguntas insultuosas. E a histeria foi de tal maneira de  mau-gosto que até Louçã vestiu o heterónimo da moderação, enquanto o patrão da Jerónimo Martins veio a terreiro dizer que a “iniciativa privada não tem que aturar isto” e tem “muitos sítios para onde ir”. Face à demagogia, os gestores das conferência de imprensa da Igreja Católica entraram no sofisma sacrista do bate e foge. Num dia, por causa dos casamentos de homossexuais, mandaram não alinhar com partidos que ofendam os respectivos valores. No outro, pondo água na fervura, e lembrando-se dos resultados do referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez, vieram esclarecer que mandar não votar em determinadas ideias não pode qualificar-se como apelo ao voto. Aliás, deputados e representantes do grupo de pressão LGT logo citaram Jesus Cristo, sobre o dar a Deus o que é de Deus e a César, o que é de César. Com socialistas a reconhecerem que pode haver um César, aqui e agora, e homossexuais a admitirem que a Igreja Católica tem o monopólio de Deus.  Como ontem dizia ao Meia Hora, antes da segunda intervenção da CEP, esta atitude da Igreja “é uma espécie de chicotada psicológica para levar o PS a negociações e a uma solução de meio-termo”. Com efeito, “o pior que podia acontecer agora era um conflito entre política e religião” e, como tal, “vai haver alguma pacificação”. Até porque “a Igreja não tem poder de mobilização de massas e de mobilização política e também nunca o fez”. Aliás, se tomarmos à letra a promessa de nosso primeiro, a discussão pública pode levar a uma espécie de armistício moral, se nos iluminarem exemplos de legislações europeias, há muito consensualizadas, que não confundiram a necessidade de protecção pública da liberdade contratual dos homossexuais, com um metacontrato ou instituição que, antes de ser do direito canónico já era do direito romano. Porque a mera analogia, de um contrato, não pode confundir-se com a essência de outra coisa, já  institucional, independentemente do sacramento, que é bem mais do que a bilateralidade, tendo a ver com o conceito de corrente de geração, e que permanece mesmo quando o contrato é anulado ou entra em divórcio, porque novas formas de família, nomeadamente as monoparentais, podem continuar e reforçar a ideia de obra que a liga aos avós e aos netos. É por isso que reli The Origin of Species, trabalho publicado em Novembro de 1859, onde Darwin considera que todos os organismos têm tronco comum, que todas as espécies vivas são resultado da evolução e da selecção natural. In the survival of favoured individuals and races, during the constantly-recurring struggle for existence, we see a powerful and ever-acting form of selection.