Princípios. Decadência

Balanços do ano, balanços da década, profecias do que há-de vir e tudo ao ritmo dessa hiperinformação que não informa, com notícias históricas, de meia em meia hora, semanários políticos de fim-de-semana e revistas cor-de-rosa, para colorirmos o que é cinzento… De uma coisa tenho a certeza: tudo vai continuar como dantes, neste mais do mesmo de uma decadência que, entre nós, costuma durar décadas, quando apenas se vislumbram causas externas de crises financeiras e políticas, mas onde só existe aquilo que se pode medir em quantidades e gráficos, quando o problema é espiritual e metafísico, porque só por dentro das coisas é que as coisas realmente são. Eis que chegámos, com menos desdivinização e mais desencantamento, àquilo que alguns continuam a qualificar como choque de civilizações, só porque temem peregrinar pelas próprias origens. Quando importa concluir que não é a história, progressista ou reaccionária, que faz o homem, mas o homem que faz a história, mesmo sem saber que história vai fazendo… O pensamento politicamente correcto deste último meio século sempre disse que caminhávamos para um fim da história, como muitos amanhãs cantando, em nome da revolução ou da contra-revolução. Os respectivos sucedâneos preferem o planeamentismo e dão-lhe hoje o novo nome de investimento público. Por mim, continuo a rejeitar o construtivismo… A história é um ditadura de factos, de fenómenos resultantes da acção do homem concreto, gerando-se sucessivas ordens comandadas por uma espécie de mão invisível, onde o homem através de meios não desejados por ele, nem projectados por ninguém, é levado a promover resultados que, de maneira nenhuma, fazem parte das suas intenções. Os detentores do poder são completamente indiferentes ao bem estar ou ao mal estar dos que não têm poder, excepto na medida em que os seus actos são condicionados pelo medo. Os princípios são o eixo da roda da mudança, pelo que, alterando-se a matéria, terão de variar as consequências que deles podem extrair-se. Para um veículo avançar no caminho que o seu condutor determinou, tem que andar sobre rodas que monotonamente giram sempre em torno de tal eixo. Não é por acaso que a roda é o símbolo antigo da corrente do devir, do círculo da geração. Tem um centro imóvel, um eixo, símbolo da estabilidade espiritual, mas movimenta-se, apesar de o eixo se manter íntegro, porque representa a permanência de certos valores. O verdadeiro liberal é, por natureza, um reformador social, o paladino do humilde explorado e o adversário de todos os altos interesses dominantes e predatórios. Os capitalistas não são os únicos a terem privilégios egoístas e predatórios; o operariado bem organizado, abrangendo muitos milhões de trabalhadores, pode também ser predatório e perigoso ao bem-estar comum. Repetindo: o verdadeiro liberal nunca diz isto é verdade, apenas sendo levado a pensar que, nas circunstâncias actuais, este ponto de vista é provavelmente o melhor. Os últimos oito períodos são mistura de citações: Tocqueville, Toynbee, Russell, Hill Green, Ferguson, Smith e Hayek. Já nem sei distingui-los de mim mesmo. Uma questão de fé na aventura da liberdade, contra os revolucionários frustrados que nos reaccionarizam, neste caminho para a servidão…

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