No dia em que se assinala a data de nascimento de Francisco da Costa Gomes (1914), ficámos a saber que o ministro Diogo do Amaral abandonou o governo, encerrando assim certo ambiente de fin de siècle que parece marcar os imitadores de Talleyrand. E não parecem também ser por mero acaso os arrufos manifestados contra o governo pelo antecessor de Diogo na sua última presidência do CDS, a propósito do papel salvífico dos avaliólogos, educacionólogos e outros ornitólogos. A belle époque dos adesivos e dos viracasacas parece estar a dar as últimas.
Monthly Archives: Junho 2006
Rousseau, Sérgio, Deutsch, Weil e Opções Inadiáveis
Por causa daquilo que ontem aqui rescrevi sobre Rousseau, recebi sinais contraditórios, desde os habituais apoios aos tradicionais preconceitos reaccionários (strictu sensu) que não querem reparar no genebrino como um desses geniais recriadores das teses de Platão, Suárez ou Espinosa, onde as parábolas não são ideologia de caricatura. Desenganem-se os recolectores das modas que passam de moda. Não evolui nada nessa leitura de Rousseau, apenas repito o que proclamei desde a minha dissertação de doutoramento e que há cerca de um quarto século proclamo desde que tenho licença para dar a minha própria matéria. Sou do partido de Espinosa, Rousseau e Kant, desse subsolo filosófico liberalão e humanista que advoga o radicalismo do indivisus contra os colectivismo que nos querem arrebanhar. Julgo até que o Contrato Social é a peça literária mais maravilhosa de toda a nossa civilização.
Claro que, sobre o autor, apenas repito o que, dele, foi vislumbrado por autores como o português António Sérgio, por politólogos como Karl Deutsch ou por filósofos como Eric Weil. Apenas noto que a subtil distinção que faz entre a vontade geral e a vontade de todos, é equivalente às categorias suarezistas da vontade como universal e à vontade como singular, nesse exercício onde o próprio jesuíta da neo-escolástica peninsular permitiu a conciliação com o imperativo categórico de Kant. Refazer guerras civis ideológicas por causa do nosso pai comum da civilização demoliberal é quase equivalente às teses que distintos membros deste governo emitiram quanto a Platão, considerando-o pai do totalitarismo comunista. Por causa destas e doutras é que continuaria a desembarcar na praia do Mindelo, sob a bandeira azul e branca da liberdade.
Com efeito, parcas são as memórias assinalar na data de hoje, onde apenas importa referir o aparecimento em 1978 do grupo “Opções Inadiáveis”, uma quase dissidência do PSD que se assume como não seguidista face à acutilância anti-sistémica de Sá Carneiro. Na altura, José Miguel Júdice, ainda não liberto totalmente da nebulosa criativa do espaço dito nacional-revolucionário, que glosava José António Primo de Rivera, também editava Portugal à Deriva, nas edições do Templo, dirigidas por Luís Sá Cunha e José Valle de Figueiredo. Estávamos na véspera do VI Congresso do PSD no cinema Roma em Lisboa (dia 1 e 2 de Julho), com o regresso de Sá Carneiro à liderança, mas quando o grupo das Opções Inadiáveis mantinha a maioria do grupo parlamentar. Nas eleições para o Conselho Nacional, os sá-carneiristas conseguem 21 lugares contra 9 da oposição, liderada por Francisco Pinto Balsemão e Ferreira Júnior. Mas, sob a alçada de Sá Carneiro, regressa ao partido Carlos Macedo, dissidente de Aveiro, e entram como militantes, entre outros, Natália Correia, Dórdio Guimarães e Luís Fontoura.
Viva Rousseau! Viva Espinosa! Viva Kant!
28 de Junho, dia de muitas memórias, desde o triste referendo sobre as condições criminais da interrupção voluntária da gravidez, onde clara e frontalmente perderam as minhas convicções (1998), ao da edição de “Le Portugal Bailloné” de Mário Soares (1972), onde muitos costumam ir ver as diferenças do original face à posterior tradução portuguesa. Mais além do nosso quintal, assinale-se que em 1914 se deu o atentado de Serajevo, rastilho da Grande Guerra, para nesta mesam data, mas de 1919, se assinar o Tratado de Versalhes, antes de em 1931 ocorrerem as célebres eleições em Espanha para a Constituinte, com vitória da coligação socialista-republicana. Por tudo isto é que prefiro comemorar uma data de 1712, quando nasceu aquele que para mim é o maior escritor de teoria poítica destes últimos tempos: Jean-Jacques.
Rousseau nasce em Genebra, em circunstâncias trágicas, dado que a mãe morreu durante o parto, prenúncio de uma existência agitadíssima. Aos dez anos chega a vez do pai, relojoeiro, o deixar entregue a si mesmo iniciando-se aquela promenade solitaire ou vagabundagem marcada por um permanente autodidactismo. Encontra o primeiro trabalho como empregado de notário e depressa se acolhe à protecção de uma Madame Warens, católica, agente do rei da Sardenha. É então que se converte ao catolicismo e que foge para Turim.
A partir de 1744 instala-se em Paris, onde encontra nova companheira, a antiga criada de quarto, Thérèse Levasseur, começando uma actividade de escritor de óperas. Entra então em contacto com os intelectuais mais influentes da época, como Voltaire, que o detesta, e Diderot, que o contrata como colaborador da Enciclopédia. Mas é apenas com trinta e oito anos que se experimenta como escritor quando concorre para a Academia de Dijon, apresentação do trabalho Discours sur les Sciences et les Arts (1750), que lhe dá fama e dinheiro, propondo-se, a partir daqui, a elaborar uma obra global sobre as Institutions Politiques.
Mas só cinco anos depois surgem alguns frutos desse projecto: para além do Discours sur l’Économie Politique, publicado na Enciclopédia, é editado, no mesmo ano de 1755, o Discours sur l’Origine de l’Inegalité parmi les Hommes. Em 1761 volta ao calvinismo e começa a escrever La Nouvelle Heloïse. Em 1762 chega a vez de Emile ou sur l’Éducation e da principal obra, o Du Contrat Social. Principes de Droit Politique.
Continua, no entanto, uma vida errante. Em 1756 vai para o Ermitage. Em 1758 está em Montmorency. No mesmo ano em que o Emile era queimado publicamente em Paris, em 11 de Junho de 1762, também o Du Contrat Social sofre de idêntica sorte em Genebra, segundo sentença de 19 de Junho, por ser tendente a destruir a religião cristã e todos os governos. Entre 1763 e 1764, instalado em Val de Travers, na sua Suíça, escreve as Lettres Écrites de la Montagne. Segue então para Inglaterra a convite de David Hume. Aí escreve Les Confessions (1764-1770). Surgem depois as Rêveries d’un Promeneur Solitaire (1776-1778) e a vagabundagem prossegue: Normandia, Lyon, Monquin e Paris, mais uma vez.
Em 1764-1765 é a elaboração do Project de Constitution pour la Corse, apenas publicado em 1861. Em 1771 chega a vez de Les Considérations sur le Gouvernement de Pologne et sur as Réformation Projectée, publicado em 1782. Morre em Ermenonville (2 de Julho de 1778). Pede para ser enterrado no jardim da Ilha dos Choupos, mas as cinzas em 1794, são transferidas para o Panthéon.
Na base do pensamento de Rousseau está o estado de natureza, entendido como a verdadeira juventude do mundo onde os homens eram originariamente livres e iguais, bons e felizes, o coração em paz e o corpo em saúde. Essa quase Idade de Ouro platónica seria uma espécie de estado pré-social e até pré-moral, onde o homem se assumia como um agente livre e dotado de perfectibilidade, um estado que talvez nunca tenha existido, que provavelmente jamais existirá e sobre o qual, entretanto, é necessário ter noções correctas para bem julgar o nosso estado presente. Era um tempo de ócio, de indolência, onde os únicos bens seriam a comida, a fêmea e o repouso, e os únicos males, a dor e a fome.
Depois deste estado selvagem, é que os homens ascenderam à sociedade civil, um mal inevitável criador de um regime artificial de desigualdades, ao colocar os homens na mútua dependência, contrária aos princípios naturais do seu modo de ser. Surgia assim o estado de civilização e com ele viria o contrário do ócio e a petulante actividade do amor próprio. Há assim um dualismo entre nature e domination, acreidtando que o fundamento da autoridade humana não vem de Deus nem da natureza.
Como fazer a viagem de regresso, como recuperar a liberdade perdida? Reconhecendo a impossibilidade de um regresso puro e simples, porque não é possível a um velho regressar à mocidade, Rousseau propõe, como forma de restituição aos homens do gozo dos seus direitos naturais, a constituição de um contrato social de responsabilidade limitada, em que a pertença ao corpo político não teria de significar a destruição da liberdade de cada um.
A civilização ou sociedade civil, no sentido de sociedade política, é que teria criado um regime artificial de desigualdades, colocando os homens em mútua dependência: o verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer “isto é meu”. Isto é, depois das desigualdades naturais ou físicas, seguiram-se as desigualdades morais ou políticas, onde, além da diferença entre os fracos e os fortes, acresceram as diferenças entre os ricos e os pobres, entre os senhores e os escravos.
Eis, portanto, o contrato social, que não assentaria na força, na autoridade paternal ou na vontade de Deus, mas sim no livre compromisso daquele que se obriga. Ele seria um pacto duma espécie particular, pelo qual cada um se compromete com todos os outros; donde se segue o compromisso recíproco de todos para com cada um, que é o objecto imediato da reunião.
A partir de então é que emerge o corpo político e moral, essa comunidade marcada por um moi commun. Um contrato social que, no entanto, constituiria mera determinação da razão e não um facto historicamente verificado, significando um tipo-ideal de constituição política em que os indivíduos conferem ao Estado os seus direitos naturais, para que este os transforme em direitos civis, que concede aos cidadãos.
Ao contrário dos defensores do duplo contrato, eis que, para Rousseau não há senão um contrato no Estado, é o de associação e este exclui qualquer outro; não se poderá imaginar qualquer outro contrato público que não seja uma violação do primeiro. Só depois viria um pacto de Governo, onde se dá a dissolução do povo que perde a sua qualidade de povo.
É que importava encontrar uma forma de associação pela qual cada um, unindo-se a todos, não obedeça todavia senão a si mesmo e continue tão livre como dantes. Onde cada indivíduo, contratante, por assim dizer, consigo mesmo, encontra-se comprometido numa dupla relação, isto é, como membro do soberano em relação aos particulares e como membro do Estado em relação ao soberano. Assim, os associados tomam colectivamente o nome de povo, e chamam-se em particular cidadãos, quando participantes da autoridade soberana e súbditos quando submetidos à lei do Estado.
A partir desta distinção, o Estado deixa de ser um mero mecanismo, retomando-se o conceito substancial do político, oriundo de Platão. Neste sentido, Rousseau, conforme salienta Eric Weil, descobre o conceito moderno de razão como unidade de teoria e de acção, de pensamento e de moral, de consciência individual e de lei universal. Com efeito, o Estado volta a adicar-se no interior do homem, numa atitude moral situada no próprio coração do cidadão. Se assim se regressa a uma ideia de vontade racional, dá-se, contudo, um distanciamento face aos autores clássicos, porque a vontade geral é atribuída a todos os indivíduos e não apenas a uma minoria esclarecida ou educada. Aliás, segundo Rousseau, todos os homens possuem a possibilidade de uma vontade racional, pelo que a vontade geral deve vir de todos e ser aplicada a todos.
É da ideia de vontade geral que o mesmo autor extrai o conceito de soberania, entendida como o exercício da vontade geral, como algo de indivisível e de inalienável, dado que o poder é susceptível de se transmitir, a vontade, não. Deste modo, as cláusulas do contrato social reduzem-se à alienação total de cada associado com todos os seus direitos a toda a comunidade, pelo que o contrato social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus membros.
O Estado é também instituído pela vontade geral, sendo encarado como uma pessoa pública ou uma pessoa moral, detendo uma espécie de eu comum (moi commun): tomava noutros tempos o nome de cidade e toma agora o de república ou de corpo político, o qual é chamado pelos seus membros Estado, quando é passivo, Soberano, quando é activo, Potência, ao compará-lo aos seus semelhantes.
É um ser abstracto e colectivo cujo instrumento é o Governo, entendido como um corpo intermédio estabelecido entre os sujeitos e o soberano por mútua correspon dência, encarregado da execução das leis e da manutenção da liberdade, tanto civil como política. É a acção de todo o corpo agindo sobre si próprio, isto é, a relação do todo com o todo, ou do soberano com o Estado
Nestes termos, considera incompatível com a natureza do corpo político que um Estado possa estar submetido a outro Estado. Apenas compreende que dois Estados possam estar submetidos ao mesmo principe, porque são as instituições nacionais que formam o génio, o carácter, os gostos e os costumes de um povo. Assim, considera que é a educação que deve dar às almas a forma nacional e dirigir de tal maneira as suas opiniões e os seus gostos, que elas sejam patriotas por inclinação, por paixão, por necessidade. Uma criança, abrindo os olhos, deve ver a pátria e, até à morte, não deve ver mais do que ela. Todo o verdadeiro republicano suga com o leite materno o amor da sua pátria.
Rousseau também não aceita o conceito aristotélico do homem como animal naturalmente político, dado que o estado de natureza é perspectivado como algo de fundamentalmente pré-social. Reconhece que o Estado foi instaurado pelos que se apropriaram dos maiores bens e para benefício dos mesmos e que o próprio poder do Estado degenerou quando o capricho dos poderosos passou a governar.
Estas sementes de Estado-razão serão, depois, desenvolvidas por Kant, onde o contrato social (Staatsvertrag) se transforma na razão pura prática, como universal legisladora (rein rechtlich gesetzgebende Vernunft), em ideia pura com fins regulativos. A própria vontade geral (allgemeiner Wille) torna-se a própria vontade racional de cada um dos membros da comunidade, considerados como personalidades autónomas no acto de estas obedecerem ao imperativo categórico e de se tornarem, como tais, legisladoras duma legislação universal.
Em resistência e silêncio, para que não entre mosca nem saia asneira
Hoje, já vai longa a noite e continuo sem apetecer bloguear. Este intervalo entre os exames e as férias, com muitos júris, ganhou, recentemente, na vida universitária, novos cambiantes de cinzento, não tanto por causa da bolonhesa, quanto pela circunstância de certas mentalidades geométricas, filhas da sucessão dos rolos compressores da unidimensionalidade cartesiana, positivista e marxista, continuarem a usurpar o espaço do pluralismo tradicional das autonomias. Em nome do chamado Estado Moderno e das suas reformas da administração pública, aquilo que era a mentalidade pombalista do defunto ministério educativo, ao usurpar o conceito de reforma e a ideia de Europa, continua a sua acção de liquidação de um conceito de universidade.
Hoje, dia 26, não apetece, pois, recordar a Belfastada de 1826 ou a proibição das conferências do Casino de 1871. Tal como ontem não apeteceu recordar como Mondlane fundou a FRELIMO, em 1962, e como começou a guerra da Coreia, em 1950. E não foi por causa do jogo da selecção nacional dos profissionais portugueses de futebol contra os seus congéneres dos Países Baixos, a que muito napoleonicamente continuamos a dar o restrito nome de um deles, a Holanda que me calei. Porque também sofri e também vibrei. Apesar de ter seguido atentamente os sinais que as agências informativas nos transmitiram sobre Timor, onde, apesar do calor, apenas continuamos a ver a parte visível do “iceberg”, onde muito do que parece e aparece não é o essencial daquilo que efectivamente é.
Talvez amanhã recupere o ânimo, para contar mais reflectidamente algumas das minhas experiências dos últimos dias, neste começo de um Verão, onde continuarei a ler muitos anúncios de renovação da pátria em semanários de grande circulação. Registo apenas que o nosso Primeiro-Ministro foi a Ferreira do Alentejo anunciar que Portugal inteiro ficou em regime de banda larga, nesse choque tecnológico que nos transforma numa longa auto-estrada da informação. Será que a auto-estrada é para outros entrarem? É que no acesso à globalização continuamos todos a circular por caminhos de cabras, porque, sem sustentatiblidade, podemos ter canas de pesca, mas não sabemos pescar.
Em resistência e silêncio, para que não entre mosca nem saia asneira
Em nome do chamado Estado Moderno e das suas reformas da administração pública, aquilo que era a mentalidade pombalista do defunto ministério educativo, ao usurpar o conceito de reforma e a ideia de Europa, continua a sua acção de liquidação de um conceito de universidade. Hoje, dia 26, não apetece, pois, recordar a Belfastada de 1826 ou a proibição das conferências do Casino de 1871. Tal como ontem não apeteceu recordar como Mondlane fundou a FRELIMO, em 1962, e como começou a guerra da Coreia, em 1950. E não foi por causa do jogo da selecção nacional dos profissionais portugueses de futebol contra os seus congéneres dos Países Baixos, a que muito napoleonicamente continuamos a dar o restrito nome de um deles, a Holanda que me calei. Porque também sofri e também vibrei. Apesar de ter seguido atentamente os sinais que as agências informativas nos transmitiram sobre Timor, onde, apesar do calor, apenas continuamos a ver a parte visível do “iceberg”, onde muito do que parece e aparece não é o essencial daquilo que efectivamente é. Talvez amanhã recupere o ânimo, para contar mais reflectidamente algumas das minhas experiências dos últimos dias, neste começo de um Verão, onde continuarei a ler muitos anúncios de renovação da pátria em semanários de grande circulação. Registo apenas que o nosso Primeiro-Ministro foi a Ferreira do Alentejo anunciar que Portugal inteiro ficou em regime de banda larga, nesse choque tecnológico que nos transforma numa longa auto-estrada da informação. Será que a auto-estrada é para outros entrarem? É que no acesso à globalização continuamos todos a circular por caminhos de cabras, porque, sem sustentatiblidade, podemos ter canas de pesca, mas não sabemos pescar.
A falsa consciência
O pior de muito anticlericalismo é a falsa consciência de antigos clericalistas. Foi mal de que padeceu certo jacobinismo e algum revolucionarismo marxistóide. E ainda por aí circula em música celestial laicista ou antilaicista. Mudam de cartilha, mas não de método. E a respectiva retórica cheira a fedor, gasta pelo mau uso e prostituída pelo abuso.
De Ávila e Bolama
Ninguém se lembra do António José de Ávila como esquerdista juvenil, reformista no assalto ao poder, marquês, ou duque. Ficou para sempre como autor de um decreto de 1871, por causa da proibição das conferências de uns então marginais, dado que estas “procuram sustentar doutrinas e proposições que atacam a religião e as instituições políticas do Estado”
Memórias da última reeleição de Tomás e da Convenção do Gramido, nesta velha gestão de dependências, a que damos o nome de independência
Na véspera de comemorarmos a assinatura da Convenção do Gramido (1847), o nascimento de D. Nuno Álvares Pereira (1360) e a batalha de São Mamede (1128), temos o infausto de, hoje, assinalarmos o convite escrito de Marcello Caetano para a reeleição de Américo Tomás pelo colégio eleitoral do regime salazarista (1972), enquanto ontem valia a pena lembrar 1829, quando se deu o desembarque na ilha Terceira de Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque e Vila Flor, o futuro duque da Terceira.
Prefiro acentuar os enredos da Convenção do Gramido. Assinam-na Loulé e António César Vasconcelos Correia pelos patuleias, na presença dos espanhóis general D. Manuel Gutierrez de la Concha, coronel Buenaga e o inglês coronel W. Wylde (24 de Junho). E tudo acontece na aldeia do Gramido, freguesia de Santa Maria de Campanha. Como salienta Oliveira Martins, o povo voltava para casa, chorando: chorando assistira à entrada de Concha.
Com a Convenção, imposta por forças militares estrangeiras, em nome da Quádrupla Aliança de 1834, aSanta Liberdade acabara usurpada. Como então chega a proclamar Rodrigues Sampaio, deixávamos de ter uma coroa pela graça de Deus e pela Constituição, dado que a mesma passava a sê-lo por graça dos aliados, ingleses e espanhóis, sobretudo, e vontade do estrangeiro.
Por outras palavras, a partir do segundo quartel do século XIX somos casca de nós no oceano balançoso da Europa, coisa de que apenas tivemos a ilusão de sair durante o salazarismo, quando passámos a viver a balança euro-atlântica, depois de irmos para a fundação da NATO e da OECE. Agora, feitos província do euro e departamento da globalização, temos que reavivar a velha tradição do nosso milagre independentista, reaprendendo a necessária gestão das dependências, pelo golpe de asa das interdependências. Nada de novo sob a bandeira das quinas! Que nisto de fábricas da Opel, a coisa não é o mesmo do que um jogo de onze contra onze num relvado verde, porque Sócrates até já nem pode brincar ao monetarismo de Alves dos Reis, como o cavaquismo governamental ainda podia fazer na década gloriosa da cobitação com o soarismo presidencial, entre 1985 e 1995. Apenas desejamos que Cavaco não passe a Xanana e que Sócrates não se reduza à dimensão de Alkatiri. Portanto, que viva Scolari!
Colóquio no PS do Barreiro
www.rostos.pt/paginas/inicio2.asp?cronica=804…
reportagem
PS Barreiro promove debate politico
PS e PSD são duas grandes empresas públicas multinacionais
Adelino Maltez salientou que a reforma do sistema político “não avança porque o PS e PSD não querem” porque limitam-se a analisar a situação a partir de um “negócio de contabilidade e projecções”.
Carlos Zorrinha sublinhou que o sistema politico “precisa de um abanão”, o “sistema politico precisa de se abrir”. |
Luís Ferreira, Presidente da Comissão Politica Concelhia do Barreiro do Partido Socialista, referiu na abertura do debate promovido no Auditório da Biblioteca Municipal do Barreiro, tendo como tema “A Reforma do Sistema Político” que está nos objectivos da Comissão Politica Concelhia dos socialistas promover, com regularidade debates que contribuam para a abordagem de temas da actualidade.
Eduardo Cabrita, que moderou o debate, recordou que na “génese da verdade” e “raiz dos partidos políticos” está o facto de estes serem espaços de promoção de discussões “sem tabus”.
Sublinhou, igualmente que a sua presença naquele debate, residia no facto de “não abdicar da minha posição de militante de base”.
Aprofundar discussão sobre “papel dos partidos”
Eduardo Cabrita, salientou que passados 32 anos desde o 25 de Abril, é importante ser promovida uma reflexão sobre as “características do regime” que “foi constituído por negação a outro que rejeitava partidos e a participação política dos cidadãos”.
Recordou os níveis de participação dos cidadãos nos anos após a revolução, nomeadamente nas eleições de 1975 e o crescente aumento de abstenção nos actos eleitorais.
Na sua opinião, é importante que se aprofunde a discussão sobre o “papel dos partidos”, a “crise dos partidos” a “representação política” entre outras matérias e, seguidamente, apresentou os convidados para participar neste debate.
Carlos Zorrinho, que foi autor de um documento que ficou conhecido por “Documento Zorrinho”, que perspectivava a ruptura de modelo de partido, propondo a abertura do partido a independentes, a realização de primárias nos partidos políticos para candidaturas eleitorais, sendo “uma ruptura interna do modo de estar no PS”.
Adelino Maltez, “uma voz inconformada e critica”, um “anarquista de direita” que permite “pensar numa direita inteligente”.
Só falta salvar o sistema político
Adelino Maltez, interrogou : “Como reformar o sistema politico?” E, respondeu : “Não sei”.
“As frases que hão-de salvar o sistema político já estão todas escritas. Só falta salvar o sistema político. O diagnóstico está feito. Falta por mãos à obra” – salientou, acrescentando – “Temos 32 anos deste regime o que significa que estamos velhos. Mas, não reconhecemos que estamos velhos”.
Adelino Maltez sublinhou que “pertencemos a uma geração que veio de um regime autoritário”, uma geração que “fez uma integração na Europa e construiu a democracia, esta péssima democracia, mas que é o menos péssimo que Portugal teve até hoje”.
Nós somos uma província do euro
Na sua intervenção recordou que “tivemos um PREC” e “entramos na Europa”, que Portugal viveu 10 anos de fundos Europeus, um tempo em que “podíamos manipular um crise”, tempo esse marcado pela coligação do Bloco central, PS e PSD, Cavaco Silva e Mário Soares – “foi a década gloriosa”, que nem se apercebeu da queda do muro de Berlim.
Agora vivemos o tempo do euro, onde “a maioria dos factores de poder não são governamentalmente controlados”, porque, salientou “nós somos uma província do euro”.
Na sua opinião, os dois partidos, PS e PSD, “são duas grandes empresas públicas multinacionais”, financiadas pelos eleitores.
“São duas secções de duas multinacionais europeias, que vinculam programaticamente os próprios partidos” – referiu.
Adelino Maltez, sublinhou que “a acção fundamental da politica é defender o interesse nacional” mas na prática “a maior parte deste processo é gerir dependências”.
E, neste contexto considerou que a “maior mentira foi a questão da Constituição Europeia”.
Bloco dos bipartidos não deixa fazer reformas
Na sua opinião a “reforma do sistema político” tem que ser concretizada “com grande humildade”.
“Hoje não há hipóteses de amanhãs que cantam” – salientou.
Adelino Maltez, referiu que o “bloco dos bipartidos não deixa fazer as reformas”, porque “há uma posição dominante PS/PSD” e “os intrusos são rejeitados” e estes partidos morrem no dia “que haja dissidências”.
Na sua intervenção lançou um “apelo à recriação dos partidos políticos”, sublinhando a importância da formação politica.
“Tivemos boas escolas de formação de quadros no inicio da democracia” e, actualmente, “há um declínio nas Escolas de Quadros dos Partidos”, porque “os partidos deixaram de formar militantes”, por essa razão “os partidos não estão a captar os melhores”.
“Os partidos morrerão no dia que forem tomados por alunos de má nota” – salientou.
Redução do Parlamento a 100 deputados
A finalizar a sua intervenção Adelino Maltez salientou que a reforma do sistema político “não avança porque o PS e PSD não querem” porque limitam-se a analisar a situação a partir de um “negócio de contabilidade e projecções”.
Defendeu a redução do Parlamento a 100 deputados, a criação de Parlamentos Regionais, a descentralização dos poderes centralizados na capital do país que só contribuiu para a “desertificação do país”.
Poder tem resistência à mudança
Carlos Zorrinho, começou por referir a importância de introduzir nos partidos uma regeneração ou “uma capacidade de auto regeneração”.
Sublinhou que “uma organização de poder tem resistência à mudança” e usa a “politica estritamente instrumental”.
Na sua opinião os partidos têm que ter “a ambição de transformar a sociedade, em nome de um conjunto de valores”.
Salientou que por vezes quando se refere que esta democracia”cheia de defeitos” é a “melhor democracia” serve para “justificar o imobilismo”.
Recordou que “o mundo mudou” que hoje “vivemos tempos diferentes” e também “mudou o funcionamento dos partidos”.
“Não me resigno à ideia que o sistema político é um funil à participação, que afasta, que reprime. Não podemos aceitar isto” – referiu Carlos Zorrinho.
“Tenho a utopia que a representação politica deve estar a cargo dos melhores, o sistema politico tem que ser pensado para atrair os melhores” – salientou.
“Cada um de nós pode lutar contra a incerteza” – referiu Carlos Zorrinho, recordando que vivemos numa sociedade dependente da informação, que é “infodependente” e, acrescentou que “a sociedade da informação é a sociedade do individuo em rede”.
Na sua opinião “os partido não podem ser aparelhos” têm que ser uma “rede de indivíduos” que se “associam para atingir resultados”, sendo “indivíduos que se respeitam na autonomia e diferenças”.
Carlos Zorrino referiu que a importância da descentração das “fontes de poder”, que possa ser geradora de “uma imensa maioria em rede”, uma “rede global que determine”.
“Este é um novo patamar, um patamar de representação global” – salientou, acrescentando – “Os partidos ainda bem que são multinacionais”.
O Estado tem que ser forte
Na sua intervenção recordou que há “indivíduos excluídos do direito fundamental” de acesso à informação.
“Ser livre é ter acesso à capacidade de aceder à informação e compreender a informação” – salientou.
Neste contexto sublinhou os “novos poderes emergentes” no mundo actual as “máfias”, as “ONG’s” as multinacionais, a comunicação social, como centros de poder, de novas redes de poder.
“Os políticos não tem poder” perante a dimensão destas redes, referiu, salientando o “declínio das visões holísticas”.
“No contexto global há um novo papel do Estado” – sublinhou.
“Somos de facto uma província do euro” – referiu e neste contexto questionou – “Que fazer com o Estado?”
Na sua intervenção defendeu que o “Estado tem que ser forte, tem que ser um estado que funcione” porque tem que ser “mobilizador”.
Participar numa causa não tem que se estar registado
Carlos Zorrinha referiu a experiência dos “Estados Gerais” que foi gerador de uma esquizofrenia dentro do Partido Socialista.
O PS era dos “job for the boys”, os “Estados Gerais” eram a fonte dos “governantes”.
Esta situação gerou uma conflitualidade, uma dicotomia “o partido politico que tem poder e não tem ideias”, o “centro de reflexão que tem ideias e não tem poder”.
Neste contexto considerou que o essencial é que os “Estados Gerais” funcionem de “forma permanente dentro do partido” porque “é dentro do partido que a abertura tem que ser feita”.
Na sua opinião o partido tem que ser um centro de reflexão, ter ideias, mobilizando os militantes e não militantes para “participar em causas e projectos”.
“Para participar numa causa não tem que se estar registado” – sublinhou.
Referiu a criação de Grupos de Reflexão que contribua para motivar a participação de “militantes temáticos”, que contribuam para fazer dos “partidos focus da acção política”, dando “dignidade à acção partidária”.
O sistema politico “precisa de um abanão”
Carlos Zorrinha sublinhou que o sistema politico “precisa de um abanão”, o “sistema politico precisa de se abrir” e salientou que a discussão do sistema politico “é um tema aliciante porque tem muito a ver com a nossa vida e com o nosso futuro e salvaguarda da democracia”.
Seguiu-se um animado debate, no qual participaram militantes do partido socialista, diversos cidadãos com ou sem partido, sendo de registar a presença de militantes do Bloco de Esquerda e do Movimento Social Liberal ( que aspira a ser partido).
Noutro apontamento iremos abordar as matérias que foram tema de um animado debate político.
22 – 6 – 2006
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A festa do sol
Neste puro prazer de sentir a caneta a deslizar no papel, enquanto trinco uma maçã na solidão da noite, vou sentindo o marulhar dos pinheiros e o brilho das estrelas.
E sulcando livre em meu destino, mesmo que seja contra quem sou, me continuo nesta procura de estar vivo…
O limite é um muro que nos esconde um pedaço de estrada, ensombreando o sonho de quem sou e sofro
Da janela do meu sótão, olhava o sonho que via diante de mim: do cedro que me dava além, ao Sul, e da gruta fechada onde guardava quem sonho…
Continuo a ser procura das coisas que sou, mas não consigo…
Recordo mesa com toalha de linho e um pão de cruzado, comprado na ti Vieiguita, bem como uma janela de guilhotina, em casa de minha avó…