Jun 02

Soprando as cinzas que, por vezes, nos pesam em amargura

A coragem e a palavra dada apenas se cumprem entre gente de princípios, entre homens e mulheres livres, os quais raramente coincidem com a chamada gente de poder, entre os que, quando estão aflitos, proclamam que ninguém os amedronta ou ninguém os cala, para, depois do caldo entornado, dizerem que estão de consciência tranquila.

 

Entre a fauna do poder, quase todos consideram que a vida é um jogo, com sucessivos episódios onde, ora se ganha, ora se perde, onde os que hoje perdem, nunca perdem tudo, porque tudo se transacciona com os que lhes sucedem nas meias vitórias. E nestes sucessivos jogos de soma zero da barganha, onde um mais um pode ser igual a menos do que um, raramente se vislumbra aquela mais valia da criação, a que muitos dão o nome de cultura, daquilo que se acrescenta sobre o cru do vazio humano.

 

Outra é a minha concepção do mundo e da vida, talvez mais peninsularmente dramática. Onde não há eternos palcos nem sucessivos jogos, mas uma longa linha de marítimo horizonte, onde sonhar é procurar passar os próprios limites, embora se reconheça a pequenez da nossa dimensão individual, como ser incapaz de captar todos os mistérios da criação.

 

Continuaremos presos entre o lodo e as estrelas, entre o paradoxo de vivermos e morrermos, onde até podemos viver morrendo, se tivermos uma qualquer causa pela qual valha a pena morrermos sem morrermos, inserindo-nos naquelas correntes de ideias que nos dão eternidade além de nós. Que até pode ser soprarmos as cinzas do ódio que recobrem as brasas aviváveis do amor

 

 

 

Imagem picada em Luar na Lubre

 

Por isso, vou transcrever o galego Madrigal á cibdá de Santiago de Federico García Lorca:

 

Chove en Santiago

meu doce amor.

Camelia branca do ar

brila entebrecida ô sol.

 

Chove en Santiago

na noite escura.

Herbas de prata e de sono

cobren a valeira lúa.

 

Olla a choiva pola rúa,

laio de pedra e cristal.

Olla no vento esvaído

soma e cinza do teu mar.

 

Soma e cinza do teu mar

Santiago, lonxe do sol.

Ãgoa da mañán anterga

trema no meu corazón.

Jun 02

A coragem e a palavra dada

A coragem e a palavra dada apenas se cumprem entre gente de princípios, entre homens e mulheres livres, os quais raramente coincidem com a chamada gente de poder, entre os que, quando estão aflitos, proclamam que ninguém os amedronta ou ninguém os cala, para, depois do caldo entornado, dizerem que estão de consciência tranquila. Entre a fauna do poder, quase todos consideram que a vida é um jogo, com sucessivos episódios onde, ora se ganha, ora se perde, onde os que hoje perdem, nunca perdem tudo, porque tudo se transacciona com os que lhes sucedem nas meias vitórias. E nestes sucessivos jogos de soma zero da barganha, onde um mais um pode ser igual a menos do que um, raramente se vislumbra aquela mais valia da criação, a que muitos dão o nome de cultura, daquilo que se acrescenta sobre o cru do vazio humano. Outra é a minha concepção do mundo e da vida, talvez mais peninsularmente dramática. Onde não há eternos palcos nem sucessivos jogos, mas uma longa linha de marítimo horizonte, onde sonhar é procurar passar os próprios limites, embora se reconheça a pequenez da nossa dimensão individual, como ser incapaz de captar todos os mistérios da criação. Continuaremos presos entre o lodo e as estrelas, entre o paradoxo de vivermos e morrermos, onde até podemos viver morrendo, se tivermos uma qualquer causa pela qual valha a pena morrermos sem morrermos, inserindo-nos naquelas correntes de ideias que nos dão eternidade além de nós. Que até pode ser soprarmos as cinzas do ódio que recobrem as brasas aviváveis do amor