O nosso velho Estado Novo, o de Portugal e da Europa, dito “Welfare State”, ainda tem suficientes jóias da coroa para evitar que se entre no rodopio do “Warfare State”, até porque sempre podemos privatizar as praias ou vender em lotes o novo espaço de acrescentamento da zona económica exclusiva. Aliás, não é de descartar a hipótese de haver petróleo nos muitos Beatos que lobrigamos. E enquanto o pau vai e vem, de Bruxelas para Washington, folgarão as costas da engenharia financeira, com muitos honestos a gerirem corruptos e outros tantos corruptos a gerirem honestos, em regime de alterne. Enquanto isto, para quem não perceber o logro de dois terços de remediados, sempre maiores do que um terço de excluídos, lá poderemos ler as epístolas aos pobres emitidas pelo espírito de Porto Alegre, deliciar-nos com os ditirambos de revolução dos homens de meia idade aposentada, ou experimentar os novos produtos de rebeldia enlatada. Resta saber o que acontecerá quando o estado de graça e as altas expectativas deste gigante de entusiasmo se volverem em desencanto e frustração, diluindo-se nos pés de lama em que o fizemos assentar? Será que só então descobriremos que as presentes boas intenções sistémicas não assentavam nas necessárias boas ideias nem tinham suficientes raízes na opinião pública, na sociedade civil e no civismo participativo? Será que só então perceberemos que o unanimismo ideológico, além de ser mau conselheiro. é revelador de uma cobardia massificada e fruto de um longo desinvestimento nas autonomias individuais? Porque países com a nossa dimensão e até com infra-estruturas axiológicas próximas conseguiram resistir e crescer, para cima e para dentro, de forma sustentada, adoptando o conceito originário da “new frontier”, que sempre foi ir além dos limites, na procura do paraíso. Porque o tal varar as fronteiras que o irlandês Kennedy tornou em slogan sempre foi a americanização do nosso bandeirante, dessa procura de um “far west” que nos desse o mar sem fim. Importa voltar a querer, não uma ilha sem lugar, onde é provável o afundamento sem regresso, nem o menos mau da empregomania e do salve-se quem puder, mas o aqui e agora da subversão pela justiça, num transcendente situado nas circunstâncias do tempo e do lugar. Naquilo que Jacques Maritain qualificava como um ideal histórico concreto, onde, em vez do castelhano Dom Quixote, a lutar contra os moinhos de vento, haja um Zé Sancho Pança, ou João Semana, a semear para colher, sem ter que ser confiscado por um sistema quase ladrão, que continua a isentar os privilegiados que têm “lobby” e a permitir a evasão fiscal, sem um programa consequente de luta contra a corrupção e o indiferentismo cívico. O presente Estado dito de Bem-Estar é mero manto diáfano de fraseologia discursiva que recobre a verdade nua e crua da injustiça. Cudado com o evitável estado de mal-estar!