Fev 09

A história sempre foi o género literário mais próximo da ficção

Confesso que tenho assistido, entre o sofá e a secretária,  mas com todo o cuidado auditivo, à série do Salazar garanhão, a perder a fé, dado a bruxarias e à variedade dos concubinatos, típicas das recaídas pagãs, como se pagus não fosse aldeia, etimologicamente falando, e não fossem tradição as teúdas e manteúdas dos grande chefes dos vícios privados, virtudes públicas. Também verifiquei, um pouco antes, na mesma SIC, como Mário Crespo, ao vivo e em directo, não conseguiu driblar a Maria José Morgado, vestida com o heterónimo de Pinto Monteiro, a qual lá escapou das candidices  e foi sempre magistralmente correcta, sem necessidade de usar o chinelo, como às vezes faz contra Pinto da Costa. E logo imaginei que a próxima entrevista do programa seria a de Crespo com Câncio, depois da bela polémica escrita que os dois estabeleceram, com Sócrates em pano de fundo e o ministro Silva Pereira reduzido a um registo de pressões frustradas pelo telefonema prévio, que não foi ilícito, que não foi imoral, mas que revela a pouca vontade de combate nos domínios do imprevisível.

 

Claro que não pensei mais em Marcelo e em Ferreira Leite, depois de prestar um depoimento ao gratuito “Meia Hora” e que, hoje, faz parangona de primeira página, quando subliminarmente declarei que Cristo prepara a sua descida à terra, porque é, talvez, a última oportunidade de o professor, das domingueiras missas laicas, ser primeiro-ministro de Portugal. Claro que também não alinhei no propagandismo de Santos Silva contra a bisneta de José Dias Ferreira, a quem assinalei a tenacidade de cumprimento da abstracção programática, independentemente desta alteração anormal das circunstâncias, embora tenha observado que ela ficou enredada neste ambiente de confronto das grandes potências no sistema, dado que se assume como mera potência secundária de Cavaco. Esta parte das declarações não foi seleccionada, coisa correcta de critério editorial, face ao tom da peça publicada. Embora esteja escaldado porque ainda há semanas um grande jornal me pediu um comentário sobre uma intervenção da líder do PSD e que, então, saiu objectivamente elogioso, mas que foi apagado e nunca saiu, porque a onda dominante era, então, a de malhar na senhora, mesmo sem telefonemas de ministros ou da máquina de campanha cor de rosa.

 

Prefiro reflectir sobre o ambiente retrospectivo da série de Salazar, procurando esconjurar os fantasmas salazarentos. Porque o travo que nos fica, depois de assistirmos a essa nova versão da Emmanuele de Santa Comba, quase ameaça a democracia, ao mostrar-nos um estadista que alcançou o cognome que também marcou Robespierre, o de incorruptível, mas, tal como o seu irmão-inimigo jacobino, também dado ao terror. Mesmo com os vícios de seminarista e de namorado frustrados, o essencial da mensagem tem a ver com o pecado natural de um humano, demasiado humano.

 

São perigosas estas viagens pelas intimidades da tal história que, conforme dizia um ministro de Salazar, Armindo Monteiro, depois de saneado, é o género literário mais próximo da ficção. São, sobretudo, perigosas neste momento em que o regime democrático ameaça degenerescência, até porque nos faltam menos de dez anos para completarmos, neste regime, o tempo que durou a governação de Salazar. Um autoritarismo que, apesar de ter no cume um incorruptível, também viveu rodeado de corrupção, promovida pelos mesmos agentes que, agora, estão apodrecendo este nosso péssimo regime, mas, com toda a certeza, o menos péssimo de todos os que tivemos desde o terramoto pombalista, quando o despotismo ministerial destruiu o consensualismo da lusitana antiga liberdade.

 

Por mim, ainda estou disposto a lutar pelos tradicionais princípios e valores demoliberais, mas acredito que, sem a restauração da república, contra aquilo que Salazar clamava como a fina flor da plutocracia, corremos o risco de continuarmos sujeitos ao arbitrário do domínio perpétuo do acaso e do governo dos espertos. Espero que os nossos responsáveis partidocráticos entendam estes sinais do tempo, auscultando como a opinião pública observa esta viagem pela memória salazarenta. E a melhor maneira de denunciarmos esta pesada herança é a de sublinharmos que o Estado Novo, com o seu condicionamento industrial, criou uma estufa de proteccionismo para as forças vivas da inércia, assentes numa economia privada que nunca foi pluralista e competiva, isto é, economia de mercado, sem fidalgotes a queimarem e a exilarem os judeus e cristãos novos.

 

Salazar foi o pior dos adversários do espírito liberal e não apenas pela intolerância e a persiganga policiescas do autoritarismo. Mantendo o despotismo ministerial do pombalismo e algum caceteirismo da viradeira, foi um efectivo primeiro-ministro de um imaginado rei absoluto, entre a esquizofrenia de João Franco, que matou a democracia, e o neofradesco inquisitorial. Caso não esconjuremos este avô tirano, nunca repararemos como é impossível, pela natureza das coisas, um qualquer salazarismo democrático, porque um regime misto, como deve ser a democracia pluralista do Estado de Direito, nunca pode fazer desabrochar as sementes da ditadura, incluindo a tecnocrática ditadura das finanças. Mesmo o apelo ao anticapitalismo, que vai da Convenção do Casal Vistoso aos discursos pretensamente progressistas da moção de Sócrates, quando já não há soberanismo, são meras drogas ideológicas que não nos curam de uma doença que precisa urgentemente de um direito público universal, e não das ilusões albanesas. Porque alguns acreditam na hidra denunciada por Santos Silva sobre o assassinato moral de Sócrates, é natural que se restaure moralmente Salazar, num esquema directamente proporcional à nebulosa dos preconceitos de esquerda e dos fantasmas de direita que nos enredam.

Fev 09

A série do Salazar garanhão

Confesso que tenho assistido, entre o sofá e a secretária,  mas com todo o cuidado auditivo, à série do Salazar garanhão, a perder a fé, dado a bruxarias e à variedade dos concubinatos, típicas das recaídas pagãs, como se pagus não fosse aldeia, etimologicamente falando, e não fossem tradição as teúdas e manteúdas dos grande chefes dosvícios privados, virtudes públicas.  Prefiro reflectir sobre o ambiente retrospectivo da série de Salazar , procurando esconjurar os fantasmas salazarentos. Porque o travo que nos fica, depois de assistirmos a essa nova versão da Emmanuele de Santa Comba, quase ameaça a democracia, ao mostrar-nos um estadista que alcançou o cognome que também marcou Robespierre, o de incorruptível, mas, tal como o seu irmão-inimigo jacobino, também dado ao terror. Mesmo com os vícios de seminarista e de namorado frustrados, o essencial da mensagem tem a ver com o pecado natural de um humano, demasiado humano. São perigosas estas viagens pelas intimidades da tal história que, conforme dizia um ministro de Salazar , Armindo Monteiro, depois de saneado, é o género literário mais próximo da ficção. São, sobretudo, perigosas neste momento em que o regime democrático ameaça degenerescência, até porque nos faltam menos de dez anos para completarmos, neste regime, o tempo que durou a governação de Salazar . Um autoritarismo que, apesar de ter no cume um incorruptível, também viveu rodeado de corrupção, promovida pelos mesmos agentes que, agora, estão apodrecendo este nosso péssimo regime, mas, com toda a certeza, o menos péssimo de todos os que tivemos desde o terramoto Pombalista, quando o despotismo ministerial destruiu o consensualismo da lusitana antiga liberdade. Por mim, ainda estou disposto a lutar pelos tradicionais princípios e valores demoliberais, mas acredito que, sem a restauração da república, contra aquilo que Salazar clamava como a fina flor da plutocracia, corremos o risco de continuarmos sujeitos ao arbitrário do domínio perpétuo do acaso e do governo dos espertos. Espero que os nossos responsáveis partidocráticos entendam estes sinais do tempo, auscultando como a opinião pública observa esta viagem pela memória salazarenta . E a melhor maneira de denunciarmos esta pesada herança é a de sublinharmos que o Estado Novo, com o seu condicionamento industrial, criou uma estufa de proteccionismo para as forças vivas da inércia, assentes numa economia privada que nunca foi pluralista e competiva, isto é, economia de mercado, sem fidalgotes a queimarem e a exilarem os judeus e cristãos novos. Salazar foi o pior dos adversários do espírito liberal e não apenas pela intolerância e a persiganga policiescas do autoritarismo. Mantendo o despotismo ministerial do pombalismo e algum caceteirismo da Viradeira, foi um efectivo primeiro-ministro de um imaginado rei absoluto, entre a esquizofrenia de João Franco, que matou a democracia, e o neofradesco inquisitorial.  Caso não esconjuremos este avô tirano, nunca repararemos como é impossível, pela natureza das coisas, um qualquer salazarismo democrático, porque um regime misto, como deve ser a democracia pluralista do Estado de Direito, nunca pode fazer desabrochar as sementes da ditadura, incluindo a tecnocrática ditadura das finanças. Mesmo o apelo ao anticapitalismo, quando já não há soberanismo, émeras droga ideológica que não nos cura de uma doença que precisa urgentemente de um direito público universal, e não das ilusões albanesas.

Fev 08

Há falta de vida e de política, para além do “Freeport”

Experimentem ver na televisão um desses delírios propagandísticos de palanque, tirando-lhe o som. Gravem-no. Ponham-lhe a voz de Paulo Portas, Barroso, Menezes ou Louçã. Peçam discursos enlatados a uma qualquer agência de comunicação, “soundbytes” e “slogans”, as que procuram as frases das modas que passam de moda, sejam progressistas ou reaccionárias, desde que adaptadas à espuma do tempo. Pronto. Está cozinhado o “action man”, o “gajo porreiro, pá”, o líder de plástico insuflável pela federação de interesses das forças vivas, enquanto as polícias e os magistrados, em vez dos crimes, investigam os seus próprios meios de investigação, numa nova guerra de secos e molhados. Logo, já não temos a quem gritar o “aqui d’el rei” ou o “oh! da guarda” do nosso velho Estado de Segurança com que tentámos fugir ao esquema da vindicta privada.

 

Passemos para a dita autonomia da sociedade civil, e para as profundas correntes e concepções do mundo e da vida que a deveriam marcar. Tomemos o exemplo da blogosfera. Onde o nosso querido primeiro-ministro está completamente retalhado entre uns que, desde já, o condenaram às penas da Inquisição, como bode expiatório, ou inimigo de estimação, e alguns outros logo alinham no sindicato situacionista do elogio ao grande líder, pensando que mantêm o subsídio, o emprego ou a subida de carreira, depois de uma intervenção no congresso ou nas novas fronteiras, citando maridos e esposas de governantes, o presidente do INA, ou ilustres administrativistas que sabem administrar a parecerística.

 

Para muitos, tudo não passa de uma manobra, inventando-se o inimigo conveniente que, por comodismo, continua a ser o fantasma de sempre, entre os pedreiros livres, as forças da reacção ou as congregações, todas controladas por polvos internacionais, ao serviço do capitalismo, dos judeus, ou das sotainas do Vaticano, porque comunistas já não há. Cabem quase todos no ginásio do Casal Vistoso, onde ser produtivo é utilizar a técnica heterossexual da fornicação, para que, nove meses depois, se denuncie a infertilidade do capitalismo, dos “gays”, das “lesbians” e dos “trans-sexuais”, as coisas mais parecidas com duas notas de cem euros metidas dentro das trevas sufocantes de uma “valise” de cartão canelado. A não ser que se utilize a notinha para fazer deslizar um qualquer desses pozinhos de cristal, vindos do comércio justo da produção de papoila pelos esforçados camponeses do Afeganistão, explorados pelas multinacionais e as grandes irmãs petrolíferas ao serviço do Pentágono, da Wall Street e do Clube de Bilderberg.

 

A Joana Amaral Dias que faça queixinhas ao Mário Soares e que peça ajuda ao Balsemão e à Clara Ferreira Alves. Quem falta às sessões missais perde pontos no campeonato do poder e, pelo menos, outra tem de ser a nossa voz nas televisões, já cansadas da loira e mais dispostas a ouvir, pela enésima vez, a dulcíssima e morena Ana Drago, a cantarolar o ser de esquerda hoje, num substantivo tão fluidamente adjectivo quanto o conceito progressista de Sócrates, esse que nada tem a ver com a designação do partido mais monárquico do 4 de Outubro de 1910, o de José Luciano Corte Real, o que menos adesivos parece ter fornecido a Afonso Costa.

 

O Freeport já era. O que fica é a confirmação das vacas sagradas do modelo constitucional de administração da justiça em nome do povo. Onde o ministro da justiça é um mero gestor do economato que vende instalações judiciárias e compra computadores e software, desde que o ministério se perdeu no “outsourcing” da pretensa modernização administrativa, onde até foi pioneiro da manobra do PRACE, depois dos platónicos discursos dos laborinhos cavaquistas. Nem sequer consegue mobilizar consagrados cientistas do direito para as reformas, dado que quase todos eles enveredaram pela engenharia da parecerística e apenas se mostram ao povo quando há assembleias gerais da banca privatizada ou nacionalizada, deles.

 

Quando qualquer bom jornal, que correu atrás das parangonas, conseguiu, em poucos dias, desfazer meia dúzia de nós de um processo que permanecia no limbo, vemos como, além da lentidão, os nossos meios judiciários sobre temas quentes estão bem longe do movimento da vida e apenas operam retroactivamente, sem o sentido deontológico de um conceito prospectivo e presentístico de justiça. Por outras palavras, a ineficácia quase apela ao inevitável regresso a formas de vindicta privada, onde não faltam os tradicionais desafios perante a assembleia geral dos vizinhos, com a consequente declaração do inimigo público, o qual perde mesmo toda a esfera jurídica de protecção, nomeadamente a presunção de inocência até ao trânsito em julgado da sentença, porque já está condenado antes de ser suspeito. Apenas falta uma qualquer lei ou regulamento, do Estado central ou de um desses pequenos corpos endogâmicos por ele orçamentados, que venham a declarar inelegível um qualquer opositor, ou eventual opositor, para gáudio dos instalados. Não estamos longe dessa fase, neste manicómio em autogestão. Até poderia dar exemplos…

 

Prefiro hoje ver o jogo dos dragões contra as águia e a segunda parte da convenção dos bloquistas, nesse discurso de ódio ao capitalismo e ao liberalismo, onde as críticas ao mercado e à livre concorrência apenas favorecem a emergência do proteccionismo e do feudalismo, os tradicionais inimigos da liberdade. Não tarda que volte o Leviathan, tendo, numa das mãos, a espada e, na outra, o báculo, em nome da alma artificial da ideologia, porque o homem do palanque, aproveitando a onda, vai pedir que, entre dois males, escolhamos o mais suave, nesse tom de esquerda menos, onde a falta de autenticidade e de convicção, pintadas de propaganda coxa, já começam a ser insuportáveis…

Fev 07

Esperemos que as secretas, os polícias e os magistrados da democracia não se transformem no Pina Manique ou no Agostinho Lourenço!

Todas as sondagens publicadas demonstram a inevitável ingovernabilidade, até pela falta de confiança demonstrada nos oposicionistas, pelo que o mínimo de sentido de defesa do regime, implica que o sistema partidocrático exija imediatamente, ao presidente, a instauração de um novo governo provisório de salvação pública e concentração partidária, para a alteração imediata do actual paradigma situacionista. Pelo menos, o caso “freeport” tem sido a casca de banana que se vai transformando em mero revelador das fragilidades da nossa classe política, das nossas polícias, das nossas magistraturas e até dos nossos meios de comunicação de massa e do seu espelho da blogosfera, todos à procura de um pinóquio que não o dos cartazes inconformistas e não resignados da JSD.

 

Basta notar as parangonas de hoje. Num dos órgãos controleiros da magistratura parece que se discutiram pormenores das ligações de um sobremagistrado com as polícias secretas e a fuga de informação sobre o controlo das fugas de informação acaba por vir de quem deveria estar acima de suspeita, em matéria de fugas de informação, tal como as secretas deveriam ser mesmo secretas, os polícias, polícias, e os magistrados, magistrados. O problema é que todos desconfiam dos políticos, mas todos querem ser políticos, tal como estes procuram fingir que são jornalistas, enquanto os jornalistas vão recolhendo todas estas vergonhas, cumprindo o respectivo dever, quando as mostram ao povo.

 

Curiosamente, para sabermos como o poder ministerial estabelecido controla, directa ou indirectamente, alguns órgãos de comunicação social, basta passarmos os olhos sobre os que informam ou investigam sobre os assuntos incómodos para Sócrates, para que outros ocultem dados sobre a matéria, ou os reduzam a mera nota pé de página, em letra inversamente proporcional às sondagens laudatórias para o sistema. Entre o telejornal de sexta-feira de Manuela Moura Guedes e o programa de segunda-feira de  Fátima Campos Ferreira, eis o preto e o branco de duas campanhas multicolores que têm de ser descodificadas e que levam o ministro Silva ao desespero, mas com a vantagem de mostrar que ainda há socialistas liberdadeiros, como Alegre, Pedro ou Henrique Neto.

 

Por outras palavras, o PS, ministerializado pela empregomania da “mesa do Orçamento” e da banca “nacionalizada, nossa”, caiu nas teias daquilo que um dos pioneiros dos partidos socialistas em Portugal, Antero de Quental, em plena decadência fontista, denunciou como casta bancoburocrática que, sitiando o aparelho de poder, acaba por obrigar os tradicionais devoristas das forças vivas a proclamar, sem vergonha, que “l’État c’est moi”, que o Estado já não somos nós, mas apenas “eles”, os tradicionais donos do poder que, vindos da monarquia liberal, passaram a “adesivos”, na Primeira República, e a “viracasacas”, no salazarismo. Esperemos que as secretas, os polícias e os magistrados da democracia não se transformem no Pina Manique, no Ferreira do Amaral ou no Agostinho Lourenço de uma facção conquistadora.

 

Mesmo que no fim do caso se liberte José Sócrates da suspeita, o que seria um grande bem para a República, ficam os destroços de um sistema apodrecido, bem como o inventário de cumplicidades e de aventureirismos, onde não tem sido devidamente realçado o papel de antigos militantes do PCP que se passaram para o PS, quando os comandos da “perestroika”, ainda aliados aos coronéis do novo KGB, determinaram a mudança de rumo dos defensores do sovietismo, muitos dos quais passaram imediatamente para o mundo dos negócios, transformando as antigas sociedades de “import-export” que serviam de intermediação entre Moscovo e os seus velhos e novos satélites. Quando ontem, na sessão de esclarecimento de Sócrates na Guarda, voltei a ver o cardeal Pina Moura, comecei a dedilhar a lista dos antigos companheiros do mesmo, que se espalharam pelo aparelho central e local do PS e que continuam em íntima cooperação com os antigos trotskistas que se passaram para o que qualificam como não-lado errado da história.

 

Quem os conhece profundamente, isto é, os também ex-pêcês, militantes de sempre do PS, mas que nunca coincidiram com o sovietismo brejneviano, e os ex-militantes da esquerda revolucionária que também alteraram as concepções do mundo e da vida, mas por efectiva conversão e consequente alteração dos subsolos filosóficos, consegue demonstrar-nos como certas adesões ao socialismo pluralista e à sociedade aberta são mera hipocrisia. Por outras palavras, os que continuam marcados pelo neomaquiavelismo das vidas duplas, e que acabaram por viver o exacto contrário de seus íntimos pensamentos, talvez tenham gerado estas vias pantanosas, embora mantendo certos métodos de limpeza de memórias e de apagamento de papéis e fichas, segundo as tradicionais técnicas dos sargentos verbeteiros, emitidas pela central técnica do edifício com que encimo este postal.

Fev 06

Quem sabe fazer não ensina, porque só ensina quem não sabe fazer (voz de um dos donos do poder, ontem)

Recordo-me de, há uns anos, assistir a uma daquelas cenas habituais, onde importantes decisões políticas tomadas numa sexta-feira, depois das pressões de fim-de-semana, passam a ser adocicadas na segunda-feira. O veículo de cunha usado pelo prejudicado em causa, e depois amplamente prebendado pelo regime, foi um conhecido banqueiro, o principal de um banco que está sempre na linha colaboracionista com todos os regimes, porque, muito justamente, os banqueiros não fazem política, usam, como feitores e capatazes,  certos políticos, incluindo os que são situacionistas, os quais precisam, quando são ministros ou primeiros-ministros, de alguém que lhes faça o discurso da união nacional, do todos não sermos demais para continuarmos Portugal e as “ilhas adjacentes”, na falta de colónias, como ainda ontem ouvimos, através da televisão pública. É evidente que o banqueiro em causa não poderia ser do tipo de banqueiro anarquista de Fernando Pessoa e, certamente, não receberá os elogios de José Saramago, de Edmundo Pedro ou, até, de Manuel Alegre. Aliás, pouco lhe interessa que este regime goste de “malhar” na esquerda e na direita políticas, como alguns dos seus antecessores preferiram que o “malhar” não fosse uma metáfora, mas antes a verdade nua e crua do cacete, legalizado por um conceito amplo de polícia política que transformava as outras polícias que ainda restam em meras ilhas adjacentes e colónias.

 

Julgo que, ontem, Sócrates ficou feliz com a conversata de um dos tradicionais donos do poder em Portugal, especialmente com o inesperado apoio à respectiva política educativa, quando o ilustre Ricardo, pouco dado aos mistérios do quinto-império da pomba homónima,  sem qualquer tipo de coração de leão e  mais à maneira dos guardas que gostam de “malhar” literalmente, de forma rascamente prosaica,  proclamou que quem sabe fazer não ensina, porque só ensina quem não sabe fazer (sic). Colocou-se assim nas alturas típicas das caricaturas miguelistas, formigueiras e salazarentas, para gáudio dos walters e dos pretensos estudos da OCDE, entrando nas águas chocas em que também parecem navegar alguns tiques metodológicos do ministro Santos Silva, cujos deslizes vocabulares o continuam a colocar do tal “lado errado da história”.

 

Por mim, prefiro recordar o PS da Alameda, de 1975, quando Sócrates ainda lá não estava, e quando o ministro Silva e muitos outros ministros de hoje tentavam boicotar essa resistência, feita em nome do pluralismo e da sociedade aberta, contra o pré-chavezismo gonçalvista. Prefiro recordar e ser fiel ao Edmundo Pedro, quando este soube mobilizar a direita, o esquerda e o centro contra as sementes totalitárias que nos enredavam. Prefiro continuar a praticar os poemas de Manuel Alegre contra os “ministros do reino por vontade estranha” e apenas lamento que o PS profundo, mesmo aquele que, cumprindo o seu dever, apoia Sócrates, não se demarque do “malhar” e da teoria da bicicleta revolucionária da extrema-esquerda, plebeia ou chic, que, em desespero de causa, ocupou o centro de poder do partido e do Estado.

 

O mais perigoso tique do desespero situacionista acontece sempre que o poder estabelecido inventa uma união nacional centrista, com inimigos à esquerda e à direita, confundindo o partido com o Estado e assumindo que o respectivo programa e intereses se confundem com as necessidades nacionais. Entre o pensamento único e o partido-sistema, a fronteira é ténue. Foi este o discurso de Estaline e de Salazar, com as sucessivas purgas dos desviacionismos de esquerda e de direita. É este o insensível barril de lodo que está a levar Sócrates ao desespero do propagandismo do ministro Silva. É isto que lamento no partido herdeiro da Alameda!

 

PS: Esta bicada só é compreensível para quem assistiu, ontem, à entrevista de Judite de Sousa ao novo banqueiro do regime, recordando o “Prós & Contras” de segunda-feira, na RTS, na rádio e televisão do Situacionismo, que, inadvertidamente, também nos disse, em parangonas, que Stanaley Ho perdeu, com a crise, noventa por cento da respectiva fortuna. Pelo menos, a crise tem esta vantagem, a moeda boa consegue sanear certa sociedade de casino…

Fev 05

Quando um refinado político oferece a sua mão activa para ajudar, ele apenas multiplica as interrupções e as causas das suas queixas…

Na ressaca, depois da barrigada de futebol de ontem, com dois directos em transmissão televisiva, com a Segunda Circular a esmagar os visitantes do norte, o povo não reparou que saíram, em defesa de Sócrates, Mira Amaral, Duarte Lima e Ângelo Correia, enquanto os meandros do BPN continuam a demonstrar como ilustres sociais-democratas sabiam jogar àquilo que, agora, se denuncia como práticas neoliberais, a única qualificação  a que recorre um tipo de esquerda, hoje, entre Mário Soares e Francisco Louçã, com passagem obrigatória por Sócrates e António Costa, enquanto Luís Filipe Menezes diz praticamente a mesma coisa, utilizando o sinónimo de hiperliberalismo, com pronúncia do norte, contra os sulistas, elitistas e liberais que são contra a regionalização. Por outras palavras, os sociais-democratas,incluindo os socialistas democráticos, sejam banqueiros, gestores de fortunas, agentes de capital estrangeiro, burocratas, autarcas ou arguidos, não percebem que pode haver socialismo sem justiça e que pode haver liberalismo que continue a assumir, e a praticar, essa virtude suprema do político, como se demonstra com Obama, na linha das propostas de John Rawls, mas continuando o paradigma de Jefferson.

 

Quando noto, nalguns socialistas, a facilidade com que lançam para o caixote de lixo da história o pensamento de Anthony Giddens, quase o reduzindo a Blair e quase limitando este à cimeira dos Açores, com Bush, Aznar e Barroso, aflige-me pelo oportunismo e pela falta de rigor. Por mim, tenho de reconhecer que a globalização não é uma ideologia, mas a nova circunstância da humanidade, onde grande nau, grande tormenta, e que, agora, vive a primeira das suas encruzilhadas críticas. Porque uma geofinança sem regras, isto é, sem Estado de Direito universal, conforme a proposta de Kant, expandiu as suas mafeitorias de licenciosidade predadora através da geoeconomia, lançando milhões de homens na multidão solitária e levando as classes políticas a discursos de justificação irrealistas que invocam a necessidade de restauração do velho Estado soberanista.

 

É por isso que fui pedir ao meu mestre Adam Ferguson, para me ajudar a compreender a crise. E ele repetiu: Há fenómenos resultantes da acção do homem, mas não da sua intenção…quando um refinado político oferece a sua mão activa para ajudar, ele apenas multiplica as interrupções e as causas das queixas.

 

Aliás, o escocês continua a defender os conflitos como saudáveis, aceitando a concorrência e a própria ideia de luta no plano internacional. Proclama que as contínuas diferenças e antagonismos dos indivíduos são a base do desenvolvimento social, que o interesse pessoal é o motivo principal da acção dos homens. Porque cada pessoa é livre na proporção em que o governo do seu país seja suficientemente forte para protegê-la e limitado e prudente o suficiente para não abusar do poder que detém.

 

Ainda na Escócia, tive uma entrevista com outro inspirador, Adam Smith, que, no mesmo tom, até me pediu para eu fazer chegar o seu protesto junto de Sócrates, por causa da má interpretação que este faz de uma nota pé de página de um seu escrito de 1776. Insistiu: O homem é levado por uma mão invisível a apoiar um objectivo que não fazia parte da sua intenção. Coisa que apenas queria repetir a ideia do seu companheiro de liberalismo ético, Ferguson. Porque o que move o mundo é o interesse pessoal, segundo o qual os homens andam sempre a tentar melhorar a sua situação económica, procurando o máximo de satisfação com o mínimo de esforço, sendo importante mobilizar os motivos egoísticos e a espontaneidade das instituições realizam inconscientemente a providência divina. Mas este hedonismo dos consumidores só funciona num processo onde haja uma espécie de ética puritana dos produtores. The natural effort of every individual to better his own condition … is so powerful, that it is alone, and without any assistance, not only capable of carrying on the society to wealth and prosperity, but of surmounting a hundred impertinent obstructions with which the folly of human laws often encumbers its operations. Por mim, apenas confirmo que continuei um liberal assumido, bem pouco neoliberal e nada neoconservador.

 

Até recordei outro mestre desta concepção do mundo e da vida, Alexis de Tocqueville, quando este assinala que não é a história que faz o homem, mas o homem que faz a história, mas sem saber que história vai fazendo. Porque de boas intenções dos políticos está o inferno das crises cheio…

Fev 04

A culpa da escravatura é dos escravos que não assumem a necessária revolta de escravos, a única que pode fazer cessar a presente servidão voluntária

Cavaco lá veta mais um diploma. O buraco do BPN é do tamanho de um oceano, mas os que dele receberam prebendas e ofícios continuam a dar-nos lições de moral, pessoal, religiosa e pública, sem qualquer espécie de vergonha. O coiso já está nacionalizado nos seus prejuízos, já são nossos os golpes que apenas alguns praticaram e ninguém repara que o banco público já teve que lá meter exactamente o dobro do que estava previsto por ocasião da nacionalização. O erário é elástico, quem paga é sempre o Zé e, depois, a culpa cabe aos liberais, porque o socialismo, a social-democracia e a democracia-cristã são um elixir mágico que nos dá o reino dos céus e a absolvição permanente, mesmo sem qualquer espécie de penitência. Peço desculpa por este grito de revolta que os fariseus da perecerística hão-de qualificar como inqualificável, porque não podem internar a liberdade de expressão num campo de concentração, embora possam usar o chicote do ostracismo.

 

Como se a atitude liberal significasse subscrevermos o discurso dos patrões, especialmente o discurso salazarento de certas forças vivas de sempre e dos variados  grupos de pressão e de interesse que já não falam nos corredores parlamentares e ministeriais, mas noutros passos perdidos, bem mais altos, próximos da “inside information”, desse “holding” dos “holdings”, onde, carregando-se num botão, pode matar-se um qualquer mandarim, mesmo que seja na China. Em Portugal, se sempre existiu uma economia privada desde o devorismo, pintada de liberalismo a retalho, e os situacionismos nunca deixaram que florescesse uma economia de mercado, de concorrência, de sociedade aberta e de não condicionamento  proteccionista. Por outras palavras, nem sequer alguma vez admitiram a ética individualista do capitalismo que continuo a defender. Os representativos patrões desta pequena casa lusitana, aqueles que, em vez da economia, fazem os jogos típicos dos donos do poder, com muitos feitores e capatazes, semeados na classe política e na engenharia da parecerística e das avenças, que enreda os intelectuais, são mais herdeiros dos fidalgotes que fizeram, da Inquisição, um tribunal de Estado e de classe, que dos que queriam introduzir a burguesia e o capitalismo em Portugal,  como eram os chamados cristãos novos.

 

Mais uma vez repetem a táctica. A de ocuparem o púlpito daquela demagogia que passa pelos “mass media”, e que já não é controlada pela deontologia dos jornalistas. E talvez consigam manipular o mesmo povo, o tal que pode escolher o caminho para o desastre, porque os barões capitaleiros, das várias capitais que temos, se sentem como peixe na água pantanosa, neste lodaçal da desinstitucionalização, agora que os meninos ricos pintadores de paredes já são ministros e líderes partidários. Não dos signos ideológicos esquerdistas e revolucionários de outrora, mas desse grande caracol do imobilismo ideológico, a que damos o nome de socialismo democrático, social-democracia e democracia cristã, o qual se reduz à baba do mero intervencionismo estadual, feito dinheiro dos contribuintes, por mais que se esforcem os bem intencionados, ainda maioritários na classe política e que não há meio de exercerem o dever de revolta.

 

Os donos do poder, habituados ao parecer comprado, à avença feudal e a outros requintes da velha fidalguia, que deixava o trabalho sujo aos inquisidores, hão-de, dentro de pouco tempo, lavar as mãos como Pilatos e continuar a dizer que a culpa morreu solteira, lado a lado com os muitos idiotas úteis. Apenas confirmo Beaumarchais: a culpa da escravatura é dos escravos que não assumem a necessária revolta de escravos, a única que pode fazer cessar a presente servidão voluntária. Basta fazer as contas e pedir a um qualquer fiscalista que nos demonstre como quem paga impostos em Portugal é o proletariado e a classe média baixa que não sabe onde ficam as ilhas Caimão, onde costuma haver furacões que aqui não chegam por causa da corrente do golfo do “mainstream”. Ao que consta, o Zé Povinho, em forma de louça, está prestes a falir, por causa do “magalhães” indiano, que não vai chamar-se “vasco da gama”, mas que sai ao preço desta chuva de invernia que já não se confunde com o molha-tolos do costume…

 

PS: Dizia-me ontem um desses belos indisciplinadores, dos que querem pensar pela sua própria cabeça, depois de ler a sondagem da Católica sobre os efeitos do “Freeport”, que a Manela ainda pode sair primeiro-ministro, no fim do ano. Bastaria que fosse para um qualquer mosteiro budista no Tibete em retiro espiritual, assim gerindo o silêncio até às eleições. Pelo menos, ela sabe de ciência fiscal e pode introduzir as necessárias reformas que têm sido aventadas pelo Medina Carreira. Acabar com a gorda interpretativa das isenções e dos despachos casuísticos dos perdões, nomeadamente aos poderosos, a quem se esqueceram de cobrar o IVA…

Fev 03

Venha o Sinédrio e o nacionalismo liberal! Abaixo o Estado Novo e os feitores dos ricos!

Hoje, o nosso Primeiro-Ministro pode começar um dia com mais tranquilidade. Escândalo, veio do grego scandalon e queria dizer a pedra em que se tropeça quando se está a marchar. Não há, por enquanto, mais grandes parangonas com novos factos de mau-gosto e de mau-senso, a não ser a repetição de histórias que já vieram num jornal regional. Nem sequer a reunião do PR com o PGR o devem preocupar, porque, com toda a certeza, o PM já contou tudo o que sabe ao PR e este apenas vai confirmar as circunstâncias processuais de um todo, onde ele é, e deve ser, supremo especialista. Porque todos ganharíamos em acabar com as brincadeiras de ex-pides e ex-espiões que tanto custam ao erário público, denunciando a incompetência que reina nesses antros, que herdaram, da PVDE e dos contactos com a CIA, o KGB e os franceses, o péssimo hábito bufante das redes em autogestão, oferecendo préstimos a patrões neofeudais.  Mas que todos se cuidem porque os sacos das bufarias continuam cheios e deles bem nos podemos aperceber se formos a alguns blogues que servem de escarrador em “comments” para as memórias futuras, nomeadamente as  que hão-de transformar-se em parangonas do curto prazo. Por outras palavras, a pior forma de lutarmos institucionalmente contra a corrupção é aquela que nos tem enredado na vileza da má-língua e, sobretudo, em meandros onde ela é instrumentalizada pelo micro autoritarismo subestatal, em que o crime dos factos consumados tem compensado, em aumento e distribuição do poder assim conquistado pelas castas do sindicato do elogio mútuo.

 

O belo estado mental desta nossa querida pátria, especialmente da nossa queridísima direita, que nem sequer sabe que foi o Gama e Castro que traduziu “O Federalista”, é directamente proporcional ao da nossa estimadíssima esquerda, onde a presente luta pelo poder nos pequenos corpos da administração indirecta do Estado atingiu as raias do surrealismo da indignidade. Veja-se como ideologicamente estão a traduzir em calão a presente crise da geofinança que destruiu a geoeconomia. Veja-se como o pensamento único dominante logo aproveitou a questão para dizer que o modelo liberal, a que chamam neoliberal, faliu, invocando um pretenso estatismo, a que chamam socialismo, e que tanto recobre o regime do despotismo da só-cracia de Chávez como atinge partidos, como o nosso PS, que, geneticamente, nasceram da liberdade  vivida e da experimentação do pluralismo, atirando para cima de Adam Smith as culpas pelas presentes circunstâncias de crise do globalismo. Até julgam que os descendentes de Thomas Jefferson não continuam a pensar que o melhor governo é o que governa menos.

 

Coitados! Não repararam que, mais uma vez, entraram em contraciclo, apesar dos avisos de Luís Amado contra os perigos do neoproteccionismo que nos lixariam. Basta notar como os socialistas britânicos de Gordon Brown recuperaram o liberalismo ético do moralismo escocês de Adam Smith e Adam Ferguson. Ou como os partidos liberais europeus estão a recuperar eleitoralmente, nomeadamente na República Federal da Alemanha. Por cá, é tudo da social-democracia do intervencionismo estadual, do PS ao PSD, passando pelo próprio CDS, todos subscrevendo a versão salazarenta do keynesianismo dos anos trinta, num estilo de neofontismo que não repara como, através dele, depois da euforia da especulação, nos endividámos cerca de um século, deixando um lastro de corruptos devoristas, como os donos do Palácio Foz ou do Palácio Burnay, esses expoentes da casta bancoburocrática, sempre à procura de políticos que se prestem a “feitores dos ricos”.

 

Ora, a melhor forma de lutarmos contra a luta de invejas que marca, e sempre marcou o nosso decadentismo, nunca foi o ódio aos ricos, mas antes a luta contra a pobreza, não pela semeadura de dinheiro dos contribuintes em areias de problemas, através da subsidiocracia, mas antes pela criação de mecanismos de um melhor Estado, através de mais autonomia para a sociedade, para que não pratiquemos a mera absolvição do darmos peixe congelado aos necessitados, mas antes outro método, o de os educarmos para a pesca, como já ensinava Maimónides e é actualmente praticado pelo microcrédito.  Ora, quando ilustres representantes intelectuais do passado e futuro da direita a que chegámos preferem, face à crise, o regresso à costela torquemada do pina manique, invocando exactamente os termos da setembrizada, mais me apetecem os homens do Conselho Conservador e do Sinédrio, incluindo os que são capazes de elogiar as qualidades intelectuais do José Acúrsio das Neves. Infelizmente, já não há um Manuel Fernandes Tomás, capaz de dinamizar um núcleo regenerador que expulse Beresford e os “ministros do reino por vontade estranha”, através do adequado nacionalismo liberal. Por mim, continuo fiel a esta concepção do mundo e da vida, subscrita por Fernando Pessoa em plena Grande Depressão. É este o “New Deal” que precisamos, para não cairmos nas teias de um “Estado Novo”, especialmente quando este ameaça usurpar a democracia e o Estado de Direito, com histórias de princesas para deleite dos arquivos dos descendentes dos devoristas, entre as capitaleiras linhas de Cascais e da Foz, que sempre detestaram os novos ricos vindos da província.

 

PS: A imagem é picada de um “online” britânico, como homenagem aos corta-fitas, com um abraço especial para quem foi desancado pelo Pacheco Pereira. Aconselho-o a notar quem é o ministro que acompanha a família real dos Hanôver. Para mais registos, veja-se o que escrevi na sexta-feira à noite e que hoje é publicado pela dupla Ana Clara/Isabel Guerreiro: os poderes enlouquecem e os que ficam à solta, enlouquecem absolutamente.

Fev 02

A hiperinformação das causas e das cascas de árvore não nos leva à compreensão, à intuição da essência da floresta como um todo

Da presente trapalhada, a única saída que convém à pátria e à democracia é a completa libertação da pessoa do Primeiro-Ministro das presentes insinuações, a fim de que ele possa estar livre dessas suspeitas, para ter que responder politicamente pelos seus actos políticos, e para que ele se arrependa da co-responsabilidade que tem sobre um sistema legislativo e politiqueiro de que ele foi, agora, a principal vítima. Quem respondeu como respondeu aos desenhos das casas da Guarda e à licenciatura na Universidade Independente, criou um estilo que levou aos presentes exageros. Os tais que acabaram por injuriar, ou difamar, terceiros, só pela circunstância de serem a sua mãe, o seu tio, ou o seu primo. Por outras palavras, a presente trapalhada está a afastar do civismo e da participação política todos os portugueses que não estão dispostos a confundir a sua vida privada e os seus círculos de intimidade familiar com o escrutínio público da própria devassa. Julgo que, a qualquer homem bom, a qualquer homem e mulher livre, de bons costumes ou de boa vontade, enoja este confusão de círculos íntimos, pessoais, familiares e políticos.

 

Acredito que há uma campanha negra e que ela se manifesta pelos fariseus que atiram pedras a todos os sinais exteriores de riqueza, em nome da inveja. Julgo que a conduta de José Sócrates Pinto de Sousa, manobrando neste mar encapelado da sondagem, da imagem e da sacanagem, tanto usou do ambiente em causa para ascender, como, eventualmente, corre o risco de se estatelar no lodo em que assenta a respectiva estátua. A táctica de defesa que usou pode ser compreensível e eu próprio, com o meu feitio, era capaz também de cair na esparrela, caso não dispusesse de suficientes sinais que me permitissem a contra-ofensiva, provando a teoria da conspiração.

 

Infelizmente, o resultado foi o de confundirmos a política de Estado com a politiquice da Liga Profissional de Futebol e da Federação Portuguesa de Futebol, com todos os nossos grandes jornais e semanários a atingirem o nível dos jornais desportivos, todos eles sensacionalistas. Os grandes líderes partidocráticos passam a ter o nível dos Pinto da Costa, dos Filipe Vieira e dos Soares Franco e corremos o risco de haver mais Valentim Loureiro, mais Fátima Felgueiras e um ou outro Valle e Azevedo. Temos uma  opinião pública traquejada para esse tipo de hiperinformação, onde abundam as folhas e as cascas de árvores, os vermes, as lixeiras e outros dejectos, mas incapaz de observar o todo da floresta, porque as explicações dos pormenores não nos conduzem à compreensão da todo, a prender uma peça com outra peça, para, sem subirmos nas causas previamente estabelecidas dos manuais operacionais da tecnologia e das FAQ, podermos aceder ao todo, através da urgente intuição da essência.