Jun 01

Europa. Constituição europeia.

Os holandeses rejeitaram a dita Constituição Europeia e um ilustre catedrático lusitano, dizendo ter lido todos os jornais holandeses do dia, mesmo não sabendo neerlandês, tudo explica por causa da xenofobia de extrema-direita e de extrema-esquerda. Isto é, depois dos republicanos franceses, chegou a vez dos monárquicos holandeses, esses nobres fundadores da CECA e da CEE que agora vieram rejeitar as delícias da constituição valéria.  Esse europeísmo de pronto-a-vestir, misto de chouriço e banha da cobra, parece não conseguir resistir a simples desafios urneiros. Valia mais que entendesse a simplicidade do conceito de vizinho, de amigo, de compatriota, de português e de europeu. E que não nos tratasse a todos como párias do come e cala, para que o presidente da Comissão Europeia esfregue o olho, pensando na reforma que vai receber quando sair. Caso se mantenha a intenção de dar democracia ao processo de edificação do projecto europeu, julgo que importa assumirmos a necessidade de uma Europa dos homens comuns com signos efectivamente mobilizadores. Esses burocratas e subsidiocratas, higienicamente transnacionais, que se passeiam por aeroportos e programas de propaganda quase colonial, não podem continuar a refugiar-se à sombra dos belos símbolos da bandeira azul das doze estrelas e do hino de Beethoven. Muito menos, devem misturar-se com os politiqueiros que pedem a suspensão do mandato para responderem a processos judiciais ou a confundir-se com políticos reformados que esperam um tachito dourado numa qualquer empresa pública. Estamos fartos de ouvir esses discursos enlatados de ministros que fazem da austeridade para os outros um hino épico de resistência nacional, enquanto todos os dias vão abichando a sua pensão de ex-bancários. Não é por mera xenofobia que tememos alguns dos anexos da Constituição europeia que por aí circulam em denúncia justa: pena de morte em caso de sublevação, insurreição ou “ameaça de guerra”; requisição de cidadãos para trabalhos forçados; prisão arbitrária; vigilância electrónica da vida privada; liberdade de expressão e de informação; clonagem humana. Como ainda hoje li num “mail” privado de um querido amigo: “estão a jogar aos brinquedos com seres humanos que deitam para o lixo e autoproclamam-se humanistas!” Noutro “mail”, de outro silencioso revoltado, posso ler que antigo gestor do PSD “está em grande guerra com o governo por causa da indemnização que exige para sair. Aliou-se com o X que também faz qualquer coisa no Serviço Z e aufere de lá apenas 1600 contos e também diz que não sai se não lhe derem uma certa fortuna”. Por mim, preferia que a Europa fosse como a bela festa dos vizinhos que a minha junta de freguesia promoveu, onde nos fomos conhecendo uns aos outros, neste olhos nos olhos e mãos nas mãos dos homens comuns, sem os quais não há enraizada democracia e confiança pública. Por isso continuo a apoiar uma mudança autárquica na cidade onde vivo. E transcrevo o apelo ao voto no meu candidato a Lisboa, recebido de A.A., porque “quem impugna e impugna sempre alcança; ainda não reclamou de todos nós os juros compensatórios a que tem direito pelo esforço no acto de estar atento; conhece a interpretação do jus gentium; sabe que as obras vivas correspondem à parte submersa das embarcações que não são nem obras novas, nem obras de arte, nem obras mortas, nem obras públicas; é objector de consciência da sociedade quando a esta faltam as convicções profundas no dever de actuar; e finalmente porque tem sido pelo Não tal como se devia fazer no referendo para a Constituição europeia, apenas porque os que vão votar pelo Sim não sabem explicar porque lhes não resta outra escolha. E assim se passeia a democracia na Europa, como se de negócio jurídico abstracto se tratasse!”. Se calhar, para escrevermos Europa por estas linhas tortas, temos de receber inspiração no checo prédio de Gehry que aqui deixo como imagem de meditação. Para os devidos efeitos se comunica que também já fui catedrático Jean Monnet. Fiquei farto dos pretensos filhos de algo. Mas continuo a venerar a nobreza de Jean Monnet.

 

Jun 01

Europa. Constituição europeia.

Os holandeses rejeitaram a dita Constituição Europeia e um ilustre catedrático lusitano, dizendo ter lido todos os jornais holandeses do dia, mesmo não sabendo neerlandês, tudo explica por causa da xenofobia de extrema-direita e de extrema-esquerda. Isto é, depois dos republicanos franceses, chegou a vez dos monárquicos holandeses, esses nobres fundadores da CECA e da CEE que agora vieram rejeitar as delícias da constituição valéria.

Alguns estúpidos povos europeus, como o francês e o holandês, tiveram o desplante de rejeitar o convite para a música celestial que os convencionalistas tinham lançado, para esse bailado de prosperidade que a santa aliança de Mário Soares, D. José Policarpo e o Professor Doutor Fausto de Quadros propunha. Esse europeísmo de pronto-a-vestir, misto de chouriço e banha da cobra, parece não conseguir resistir a simples desafios urneiros. Valia mais que entendesse a simplicidade do conceito de vizinho, de amigo, de compatriota, de português e de europeu. E que não nos tratasse a todos como párias do come e cala, para que Barroso esfregue o olho, pensando na reforma que vai receber quando sair.

Caso se mantenha a intenção de dar democracia ao processo de edificação do projecto europeu, julgo que importa assumirmos a necessidade de uma Europa dos homens comuns com signos efectivamente mobilizadores. Esses burocratas e subsidiocratas, higienicamente transnacionais, que se passeiam por aeroportos e programas de propaganda quase colonial, não podem continuar a refugiar-se à sombra dos belos símbolos da bandeira azul das doze estrelas e do hino de Beethoven. Muito menos, devem misturar-se com os politiqueiros que pedem a suspensão do mandato para responderem a processos judiciais ou a confundir-se com políticos reformados que esperam um tachito dourado numa qualquer empresa pública. Estamos fartos de ouvir esses discursos enlatados de ministros que fazem da austeridade para os outros um hino épico de resistência nacional, enquanto todos os dias vão abichando a sua pensão de ex-bancários.

Não é por mera xenofobia que tememos alguns dos anexos da Constituição europeia que por aí circulam em denúncia justa: pena de morte em caso de sublevação, insurreição ou “ameaça de guerra”; requisição de cidadãos para trabalhos forçados; prisão arbitrária; vigilância electrónica da vida privada; liberdade de expressão e de informação; clonagem humana. Como ainda hoje li num “mail” privado de um querido amigo: “estão a jogar aos brinquedos com seres humanos que deitam para o lixo e autoproclamam-se humanistas!” Noutro “mail”, de outro silencioso revoltado, posso ler que antigo gestor do PSD “está em grande guerra com o governo por causa da indemnização que exige para sair. Aliou-se com o X que também faz qualquer coisa no Serviço Z e aufere de lá apenas 1600 contos e também diz que não sai se não lhe derem uma certa fortuna”.

Por mim, preferia que a Europa fosse como a bela festa dos vizinhos que a minha junta de freguesia promoveu, onde nos fomos conhecendo uns aos outros, neste olhos nos olhos e mãos nas mãos dos homens comuns, sem os quais não há enraizada democracia e confiança pública. Por isso continuo a apoiar uma mudança autárquica na cidade onde vivo. E transcrevo o apelo ao voto no meu candidato a Lisboa, recebido de A.A., porque “quem impugna e impugna sempre alcança; ainda não reclamou de todos nós os juros compensatórios a que tem direito pelo esforço no acto de estar atento; conhece a interpretação do jus gentium; sabe que as obras vivas correspondem à parte submersa das embarcações que não são nem obras novas, nem obras de arte, nem obras mortas, nem obras públicas; é objector de consciência da sociedade quando a esta faltam as convicções profundas no dever de actuar; e finalmente porque tem sido pelo Não tal como se devia fazer no referendo para a Constituição europeia, apenas porque os que vão votar pelo Sim não sabem explicar porque lhes não resta outra escolha. E assim se passeia a democracia na Europa, como se de negócio jurídico abstracto se tratasse!”. Se calhar, para escrevermos Europa por estas linhas tortas, temos de receber inspiração no checo prédio de Gehry que aqui deixo como imagem de meditação.

Para os devidos efeitos se comunica que também já fui catedrático Jean Monnet. Fiquei farto dos pretensos filhos de algo. Mas continuo a venerar a nobreza de Jean Monnet.

 

M

 


2006

 

 

Logo, tenho de continuar a falar por metáfora, que é aquilo que me aguenta, neste mundo de gente lúcida onde tento manter a lucidez de ser ingénuo, porque quero viver como penso, sem ter pensar como vivo, dado que sei que importa submeter-me para sobreviver, a fim de conseguir, de seguida, lutar para continuar a viver. Até porque, na prática, a teoria é outra e, de boas intenções, está o inferno cheio.

E lá continuarei a falar por metáforas, no microcosmos e no macrocosmos, utilizando a técnica criativa da analogia que é ir de semelhante a semelhante, para pegar numa folha de árvore e tentar apanhar o todo, através da tradicional técnica da hermenêutica, que é o método epistemológico e de vivência que recebi da velha peripatética, coisa a que os alemães, muito Wissenschaft, chamaram Verstehen, que é prender coisa com coisa, similia ad similia, compreendendo a floresta pela descoberta do que é a alma de uma simples árvore, através dos indícios que me dão os sinais de casca que, por acaso, me caem na careca, sem eu, sequer, ter que os procurar, segundo a técnica da pretensa espionagem. Basta o olho vivo…mas triste.