Sempre fui um antigonçalvista primário e um anti-revolucionário assumido, sem as ilusões de um futuro ministro de u governo socialista que até escolheu a data da tomada de posse do primeiro governo vasquista para fundar um partido centrista, com que pretendia envernizar o cavernícola marxista-leninista de certa tropa. Ele foi, sem dúvida, a imagem de um certo Abril prequiano que fora spinolista, passou a costa-gomista e acabou soarista, sem nunca ter sido otelista. Reconheço que, hoje, caiu mais um mito: o do companheiro Vasco que nunca teve direito a muralha de aço. Perseguiu “eme-erre-pum-puns”, encheu Caxias com capitalistas e contra-revolucionários; ajudou a descolonizar rapidamente e em força e deu origem, não apenas a movimentos unitários antifascistas, mas, sobretudo, a um gigantesco partido anticomunista que, ocupando as ruas, destruiu as pretensas lendas e narrativas do romantismo revolucionário, evitando que continuassem as prisões por delito de opinião, os atentados aos direitos do homem, a perseguição política dos adversários, os latrocínios, os roubos, as invejas à solta, o saneamento de professores e a expulsão de estudantes das próprias universidades, como fui vítima, perante o silêncio cúmplice e o aplauso de certos supremos magistrados dos dias que temos, quando ainda entoavam loas à luta de classes e ao sol da Terra soviético. Ele foi vermelho, menos de cravos e mais de foices e martelos, e bem podia ter sido a mão armada de Álvaro Cunhal. Não sendo Guevara, Allende nem Fidel, bem poderia ter sido um intróito para Hugo Chávez, em ritmo de Alberto João. Teve e tem cantadores, baladeiros e poetas que quase o deificaram em estatuetas para a festa do Avante, mas acabou por se eternizar em muitas anedotas. Inventou o conceito de “pesada herança do fascismo”, foi o murro que tentou “quebrar os dentes à reacção”, no 28 de Setembro, e personificou a nacionalização dos “homens sem sono” no 11 de Março. Se ainda houvesse União Soviética, seria, sem dúvida, digno da máxima condecoração moscovita. Esperemos que os habituais supremos carpidores da república lhe tracem o elogio funerário, olhando-se ao espelho. Apenas direi, como sempre, revolução, nunca mais! E contra-revolução, muito menos! Mas não poderei deixar de dizer que, graças à coerência desse militar de alcatifa e célula, que, “a contrariu”, erguemos, bem mais depressa, uma democracia pluralista e ocidental, sem as tragédias da guerra civil, até porque em pleno Verão quente, ele aceitou o convite de Otelo para optar pelas sopas e pelo descanso…
Daily Archives: 11 de Junho de 2005
os chamadas psicopatas sentenciadores
E desta não poderão escapar os próprios vendedores de sentenças opinativas, incluindo os chamadas psicopatas sentenciadores e todos os que continuam o velho regime absolutista, segundo o qual o príncipe está solto da lei (“princeps a legibus solutus”) que ele próprio edita através da opinião, dado pensar que também é lei tudo o que príncipe diz (“quod princeps placuit, legis habet vigorem”), mesmo que seja um bocejo ou o habitual prognóstico feito depois do jogo ter acabado, dado que outros até se esquecem o que o mesmo príncipe, já olvidado de suas maneiras, tinha dito um quarto de hora antes do tal jogo ter começado, porque “un quart d’heure avant sa mort, il était encore vivant”. Proponho que a lei seja efectivamente igual para todos. Para a gente fina de Cascais e para a malta da Damaia, para os que vivem no Intendente ou nos condomínios da classe A e B, cujos habitantes militam no SOS Racismo. Proponho que chamemos os bois pelos nomes, isto é, que acabem com todos os acumuladores, incluindo aqueles que tiveram direito a vencimento acumulativo dado em resolução do conselho de ministros de um anterior governo PS, depois de já acumularem a pensão de deputado e de professor, para além do subsídio de curadoria, em fundação que costuma escolher um patriarca por partido, para, depois, organizar colóquios sobre a moralidade dos partidos ao cheiro da canela e das patacas, mesmo que seja o tlin-tlin das “slotmachines”. Os higiénicos ocultadores do termo raça, que é coisa que cientificamente não existe, como demonstra qualquer universidade ou investigador sérios, não são capazes de reconhecer que a culpa é de nós todos, desse falso paternalismo da memória colonial e imperial que, confundindo o bem com o mal, não é capaz de compreender que, com fantasmas de guerra colonial e preconceitos de descolonização, o racismo é uma fogueira que vai lavrando sem se ver, um primitivismo naturalístico que disfarça a nossa impotência de criação comunitária. Uma pátria que não reconhece que é bem mais rica porque, hoje, há mais portugueses a falar crioulo do que madeirense ou açoriano, mas que continua a não admitir o óbvio de sermos, pelo menos na grande Lisboa, um pequeno Brasil, é uma pátria transformada num cadáver adiado, só porque não repara que, para continuarmos a viver, temos que lutar pela reinvenção de uma identidade nacional capaz de mobilizar os pretinhos portugueses da Cova da Moura, a que só dão, felizmente, o futebol, do Benfica à selecção nacional, e algumas pitadinhas de Sara Tavares. Não é esse o meu Portugal. O meu Portugal não pode ter esta mentalidade de criação de favelas que por aí circula entre os que continuam com programas escolares e de televisão que nos pintam de caras pálidas, burguesas e fidalgotas. O meu Portugal não é o da educação multicultural irrealista, mas dos novos muitos Portugais que me enriquecem e que eu não tenho que integrar em unidimensionalismo, mas na variedade dos muitos crioulos que fizeram Lisboas, Alcáceres, Messejanas e muitas outras aldeias de variedade universal. Por isso exijo que os polícias estabeleçam a ordem, que os tribunais cumpram a sua missão e que as televisões mostrem que os criminosos que por aí andam são de todas as cores, de todas as classes sociais, de todos os bairros. Sejamos claros, a preto e branco, a loiro e a moreno. Não decepem o Portugal maior que ainda podemos reidentificar e amar! Os primitivos actuais são naturalisticamente racistas. Só o deixam de ser quando se conhecem, quando se amam, quando, através de um esforço de conversão, se elevam ao ardor de um sonho. Cá por mim, continuo a sonhar um Portugal cadinho de universal e até sou capaz de propor que o crioulo seja elevado a língua nacional portuguesa, ao lado do mirandês e do barranquenho. Saibamos ser dignos do Brasil que transportámos para a ex-capital do Império, mas não deixemos que cresçam as favelas da ignorância e da falta de transparência noticiosa. Só quem assumir uma identidade nacional aberta e reinventar todos os dias um sonho actualista de nação é que vale a pena, se a alma não for pequena! Obrigado, Sofia, a chinesinha que nasceu na minha rua e que anda sempre com o cozinheiro do restaurante indiano, a brincar com o pretinho Jaquim e com a Maria, moldova, seus vizinhos, neste belo quadro de um Portugal que pode voltar a ser abraço armilar! Os polícias são necessários, mas não são os polícias sozinhos que fazem as pátrias!