Mai 22

Os cilícios do Opus Dei, os preconceitos WASP e a continuidade dos bananas

Lá vi o Dan Brown posto em filme, depois de o ter lido em livro, sempre à boleia das ondas da moda. Gostei mais da primeira experiência que da segunda. Repito o que aqui disse em Fevereiro de 2005: a história de Maria Madalena e do Graal fazem parte das deliciosas patranhas do nosso imaginário, como a Cinderela ou o Pinóquio. Retoma-se, quase meio século depois, o regime do “best seller” de Pauwels e Bergier, “Le matin des magiciens”, Paris, Gallimard, 1960, agora num regresso ao anticongreganismo primário, onde, em vez dos jesuítas, surge o “Opus Dei”, vulgarizando-se ridiculamente questões maçónicas, gnósticas e panteístas.

 

Reduzir ao ritmo cinematográfico temas como os do simbolismo e do esoterismo, atacar o catolicismo e a maçonaria, pela interpretação das lendas merovíngias, é brincar com o fogo sagrado. Especialmente neste Ocidente onde as bases esotéricas atiram a memória pré-cristã e as heresias medievais para a zona do sincrético das seitas e das macacadas das sociedades secretas, onde, afinal, algumas multinacionais livreiras espetam as garras do negocismo, explorando as nebulosas que circundam a procura da verdade, sem se ir ao fundo das coisas.

 

 

 

Acaba por apelar-se ao vazio da procura pessoal, obrigando muitos a acolherem-se à sombra de explicações transpersonalistas e fazendo dissolver as autonomias individuais no colectivismo moral das seitas e nesse jogo entre o exotérico e o esotérico, de modo que a verdade acaba por dissolver-se. Importa salientar que quando alguém procura atingir o bem colectivo através do mal individual, em nome da Razão de Estado, da Razão de Seita ou da Razão de Igreja, está a matar-se a si mesmo, ainda que adopte aquela literatura de justificação do realismo político.

 

Há muitas boas e higiénicas instituições que invocam fins superiores, incluindo o divino, enquanto os respectivos jagunços, inflitrados nos aparelhos do Estado de Direito, brincam ao maquiavelismo, maculando a eventual espiritualidade com que vão recrutando neófitos. E o estampido das crenças, com que muitos vão permitindo as conversões, pode levar a um processo de crescente relativismo e cepticismo, onde acaba por preponderar o mero jogo das bruxarias. Continuo a preferir Umberto Eco e “O Nome da Rosa”. Ficamos mais cavaleiros andantes, mais próximos do saber poético, mais amantes do mistério, mais cultivadores do transcendente…

 

 

 

No filme, tornam-se manifestas as caricaturas quase racistas que os anglo-americanos pouco universais e muito hollywoodescos fazem dos franceses e que atingem o clímax do insulto quando tentam retratar o espanhol, nesse ambiente de anticolonialismo imaginário, onde o máximo de pseudo-racionalismo passa pela demonização do latino, pintado de ditador da república das bananas e vestido de cardeal, nessa inconfessada vontade de segregacionismo e de “apartheid” de certa cultura WASP- White Anglo-Saxon Protestant.

 

 

 

E não foi por acaso que a minha visita ao filme foi precedida por uma visita a fígados de tamboril, lá para os lados de Alfarim, e deparando-me, à porta do cinema, com esse génio da escrítica que a esquerda instalada decreta como o paradigma da direita que convém à esquerda. Reparei que, apesar de novo, continuava imensamente velho, copiando os rebanhudos papas da jornalada que se assumem como as manilhas centrais da importação das ideias vanguardistas, mesmo quando reaccionárias. Por isso, quando voltei a casa e reparei nas cenas do congresso do PSD, fiquei sem saber se estava a assistir ao comentarismo do “Jogo Falado”, dado que os justamente afamados analistas da futebolítica são, além de treinadores de bancada, distintos militantes do laranjismo, assim se confirmando a superioridade da agregação de interesses do mendismo face ao estilo socrateiro, com que se disfarçam os cor-de-rosa.

Mai 19

Memórias do dia da Europa visto por um europeu pouco europês

Memórias do dia da Europa visto por um europeu pouco europês

Por José Adelino Maltez

 

O discurso de Schuman, de 9 de Maio de 1950, obedeceu a um esquema de planeamento de operações de carácter quase militar. Em primeiro lugar, havia uma questão de agendas. Com efeito, para tal data, estavam marcadas, da parte da manhã, reuniões dos conselhos de ministros em Paris e Bona. Para os dias 11 e 12 de Maio, em Londres, uma reunião dos ministros dos estrangeiros norte-americano, francês e britânico sobre a questão alemã. Para o dia 18, uma reunião do conselho ministerial da NATO. Jean Monnet, com a colaboração de Pierre Uri, Étienne Hirsch e Paul Reuter, tinha elaborado um plano que no dia 1 de Maio era já aprovado por Robert Schuman.

 

No sábado, dia 6 de Maio, já o documento adquire forma definitiva. Tomam então conhecimento do mesmo os Ministros da Justiça, René Mayer, que há-de ser o sucessor de Monnet na Alta-Autoridade, e o Ministro do Ultramar, René Pleven.

 

Domingo, dia 7: o secretário-geral do ministério dos estrangeiros, Alexandre Parodi, é posto ao corrente do processo. Do mesmo modo, Dean Acheson, que fazia escala em Paris, é informado por Monnet do projecto em curso.

 

Segunda-feira, dia 8: parte para Bona um enviado especial de Schuman, Michlich.

 

Terça-feira, dia 9: na parte da manhã reúnem os conselhos de ministros da França e da RFA. O chefe de gabinete de Adenauer, Blankehorn, interrompe o conselho e entrega a Adenauer as cartas de que era portador Michlich.

 

Já passava do meio-dia quando Clappier recebe comunicação de Bona com o assentimento de Adenauer ao projecto. É só então que Schuman desvenda o segredo aos restantes ministros. Os jornalistas são convocados para as 18 horas, para aquilo que deveria ser anunciado de maneira espectacular. Durante a tarde recebem-se os embaixadores dos países europeus. Um jornalista pergunta a Schuman: Então, é um salto no desconhecido? e este responde: É isso, um salto no desconhecido.

 

Também nesse dia, o embaixador da França em Londres, René Massigli, é recebido no Foreign Office por Bevin. Attlee estava fora das ilhas britânicas, em férias.

 

No dia 10, reunia-se a conferência dos Três em Londres sobre a questão alemã. O partido liberal propõe a participação britânica. Os conservadores, através de um discurso de Anthony Eden, recomendam idêntica atitude. Mas a imprensa, do Times ao Daily Express, teme a palavra federação e receia pelo fim da independência britânica.

 

No dia 11 de Maio, quinta-feira, aqueles que virão a ser os seis Estados Membros aprovavam o plano de Schuman e não é por acaso que nesse mesmo dia se instituía o partido de Adenauer, a União Cristã-Democrática.

 

O então Primeiro-Ministro britânico, o trabalhista Clement Attlee, faz um discurso nos Comuns onde saúda a reconciliação franco-alemã, mas deseja que se proceda a um exame aprofundado das implicações económicas. Nesse mesmo dia, tem uma resposta cuidadosa. Se felicita a iniciativa francesa, dado pôr fim a um conflito secular com a Alemanha, não deixa de referir que a mesma teria de ser objecto de uma reflexão cuidadosa.

 

Nos dias 14 e 19 de Maio, Monnet desloca-se a Londres, acompanhado por Hirsch e Uri, procurando convencer o governo britânico, principalmente através de Sir Plowden, o responsável pelo Plano. Mas em França, vários grupos se opõem ao projecto, de gaullistas (RPF) a comunistas. O próprio De Gaulle, em discurso proferido em Metz, no dia 19 de Maio de 1950, proclama expressamente on propose en méli-mélo de charbon et acier sans savoir où l’on va aller en invoquant un combinat quelconque.

 

A história continua nesta Europa que deixará de o ser se abandonar o seu modelo de pátria da discórdia criativa.

Mai 16

Foi noutro dia que espreitei este pedaço de futuro

Do cimo desta colina, olhando a barra do tejo, trafaria, bugio e uma nesga do mar sem fim que, outrora, desvendámos. Do cimo desta colina, de lisboa cidade que foi porto de partida e agora é apenas passagem e memória do passado. Do cimo desta colina, olhando a barra do tejo, onde rio e mar se diluem no mistério da viagem. Do cimo desta colina, de olhos postos na bruma, sobre mim mesmo, vou pensando em portugal.

Mai 16

Algumas revelações sobre a estrutura da selecção nacional das Vacas Sagradas

Foi no ano da graça de 1977 e neste mesmo dia que começou a ser transmitida a primeira telenovela televisiva, a “Gabriela, Cravo e Canela”, dois anos antes de ser aprovado o Serviço Nacional de Saúde. Foi por isso que ontem, ao fim da tarde, assistimos emocionados à conferência de imprensa, onde o seleccionador nacional do movimento das vacas sagradas no poder (MDVSP), apoiado pelo clube nacional da imprensa divertida (CNID), divulgou quem vai representar “este país” na fase final do Mundial das Velhas Glórias 2006, marcado para o Cemitério dos Insubstituíveis (09 de Junho a 09 de Julho), segundo o lema “pensar no esférico e levar frango sem gripe”.

 

 

 

 

Os escolhidos são:- Para guarda-redes da rectaguarda do sistema situacionista e devidas condecorações pelo 10 de Junho : Soares, “O Fixe” (S. C. Campo Grande), Eanes “O Eloquente” (S. L. do Madre de Deus) e Sampaio Cenourinha (New York Superstars). Guterres espera convocatória de Moirinho e Alegre voltou à poesia, tendo que justificar as faltas no parlamento. Cavaco está nos sub-21.

 

 

 

 

 

 

Defesas da Esquerda do estado a que chegámos: Vasco Lourenço e Pá (Old Captains, Grandola City), Francisco Anacleto “Trotski” (Mani Sinistra, Itália), Mário Tomé, “Ex-Kaúlza” (Military Policy, Tirana of Albanese), Jerónimo (União dos Trabalhadores da Festa do Avante), José Manuel, “The Duran Boy” (Georgetown Sports, with Twelve Stars) e Santana Lopes (Santanets of New Lisbon and Rock in Rio).

 

 

Médios do Centrismo: Diogo (União do Largo do Caldas), Coissoró (Tamils of Sri Lanka and Caldas Caril), Ribeiro e Castro (Union des Églises Chrétiennes, Bruxelas, Quatro Estações), Dias Loureiro (BPN, All World and Arredores), Rui Mateus (Socialist International Finance, Europe e Põe-te a Andar) e Ângelo Correia (Iraq Petroleum, Saddam City).

 

- Avançados da Direita: Adriano, “El Kissinger” (C. F. Alcolena), Simão da Veiga, “The Nuclear” (Bolonha, União Europeia), Paulinho “The Rumsfeld” (Any Airport, State of Art), Mendes, “Gandanóia” (Mocas de Fafe, Terra da Laranja Amarga), Teixeira Pinto (BCP, Navarra Benzida) e Belmiro Azevedo (F. C. do Marco sem Avelino).

 

A medida causou grande consternação entre o seleccionador nacional dos sub-21, dado que não constam todos chanceleres e os vogais dos Conselhos das Ordens Honoríficas Portuguesas. Porque, por proposta do Chanceler, Tenente General Vasco Joaquim Rocha Vieira, foram nomeados Vogais do Conselho das Antigas Ordens Militares o General José Lemos Ferreira, o Major General Heitor Hamilton Almendra, o Embaixador Leonardo Charles de Zaffiri Duarte Mathias, o Prof. Engenheiro Ricardo Manuel Simões Bayão Horta, o Almirante Nuno Gonçalo Vieira Matias, o Tenente General Fernando João de Jesus Vasquez, o Actor Ruy de Carvalho e a Professora Doutora Maria Helena Farmhouse da Graça Mira Mateus.

 

Por proposta do Chanceler, Dr. João Bosco da Mota Amaral, foram nomeados Vogais doConselho das Ordens Nacionais o Coronel António Alves Marques Júnior, o Professor Doutor Manuel Vilaverde Cabral, a Professora Doutora Maria Ângela de Sousa, a Dr.ª Maria de Jesus Barroso Soares, a Dr.ª Maria Teresa Pinto Basto Patrício Gouveia, o Dr. Miguel Luís Kolback da Veiga, o Professor Doutor Raul Rosado Fernandes e o Professor Doutor Urbano Tavares Rodrigues.

 

Por proposta do Chanceler, Embaixador António de Oliveira Pinto da França, foram nomeados Vogais do Conselho das Ordens de Mérito Civil o Dr. Augusto de Atayde Soares de Albergaria, o Monsenhor Vítor Francisco Xavier Feytor Pinto, a Dr.ª Maria Manuela Morgado, o Eng.º Dr. Eduardo Carrega Marçal Grilo, o Professor Doutor Narana Sinai Coissoró, o Eng.º Francisco Xavier Bello van Zeller, o Dr. Manuel Carlos Teixeira de Abreu e o Eng.º Álvaro João Duarte Pinto Correia.

Mai 12

Confessos iberistas, filatelias filantrópicas, comendas, prebendas, berloques e sinecuras…obviamente, demitam-se!

Reparo que a consultadoria é emprego que se ganha depois de se ter sido ministro de Estado, pelo que talvez fosse de exigir aos que os exerceram tal missão em nome do povo, que fizessem uma declaração pública, não do que entra na respectiva conta bancária, mas das funções não públicas que passam a exercer depois de colocarem no bengaleiro das tralhas o tal chapéu de funcionário da comunidade. Não para que os senhores polícias, magistrados e juízes os accionem criminalmente, de acordo com as leis que os da casta superior fizeram ou poderiam fazer, mas para que o senhor povo, que somos nós todos, possa avaliar cívica e moralmente os pretensos vacas sagradas. Saudamos, portanto, as nomeações do presidente para os supremos conselhos da comenda, nesta sociedade da corte e da prebenda, onde há uma relação directa entre o berloque e a sinecura, face a esta “network” de cunhas  e vaidades, onde acaba por ser predominante o processo do habitual curto-circuito. típico desta democratura de intermediários intocáveis. Porque, antigamente, chamava-se, à aliança da pretensa ciência certa com o poder absoluto, depotismo iluminado. Hoje, a coisa ainda não tem nome. Prefiro o que lhe deu Salgueiro Maia, no Largo do Carmo, no dia 25 de Abril de 1974: é o Estado a que chegámos. Porque cada Estado gera o seu próprio status, onde há sempre um l’ état que são eles.

Mai 11

Europeísmos, Martins, Afinsas, Vitorinos e Carrilhos

O que aqui publicitei no passado dia 9 de Maio sobre a declaração Schuman e o dia da Europa, e que mereceu algumas referências, em blogues de referência, e outras tantas “charges” de pseudo-europeístas de postas, subsídios e postos de vencimento, não passa de mero registo de um guião das minhas aulas de há dez anos, quando geria, na minha escola, a Cátedra Jean Monnet e ainda recebia convites da própria Assembleia da República para participar, até por escrito, no chamado acompanhamento da revisão dos tratados, no tempo em que o Jorge Braga de Macedo era líder parlamentar do sector e chamava todas as universidades, sem “index”.

 

 

 

Duas décadas depois, verifico que o europeísmo passou a estar dependente de intermediários e “lobbies” que, disso, fazem posto de vencimento e degrau para o “cursus honorum”, em regime de clube fechado e de sindicato das citações mútuas, de acordo com as tradicionais regras das castas, um pouco à imagem e semelhança do que era a Agência Geral do Ultramar nos tempos do fim do império colonial, cujos métodos de prémio e castigo bem conheço no dorso. Isto é, sem aquela justiça material que aplica o princípio da igualdade segundo o princípio da produção científica e não o da avaliação segundo o critério oculto do convite favoritista e amiguista, que marca o princípio da seita.

 

Quando o dito europeísmo passa a oficioso processo de disputa do subsídio e do acesso ao croquete mediático, com tiques escleróticos de fixação dos bons e dos maus, segundo os métodos de definição dos verdadeiros amigos do sol da terra, mesmo que o tenham passado do Oriente para o Ocidente, apenas digo que não é assim que se consegue dar liberdade à ideia da Europa, com amor da complexidade e da pátria da discórdia criativa.

 

 

 

Posso ser bom europeísta e criticar Diogo Freitas do Amaral, mesmo que depois tenha de atender os recados dos respectivos directores e subdirectores pouco gerais e sem carreira. Posso continuar a ser bom europeísta e não entrar no encomiástico face a António Vitorino. Posso ser bom europeísta e não fazer parte da associação dos antigos docentes de Georgetown ou dos conferencistas do IEEI ou dos amigos de Portas nomeados para o IDN. Posso ser bom europeísta e ter alinhado com os contras à Constituição valéria.

 

Há um espaço de europeísmo maior do que o conceito feudal de fidelidade, medido pelo provincianismo capitaleiro dos que foram, ou querem, ser ministros ou deputados. Dos que não precisam de meter cunha às sumidades que têm sido regiamente subsidiadas por um sistema fechado de amiguismos propagandísticos.

 

 

 

Por mim, julgo fazer parte de uma escola que tem alguns produtos dignos de registo comparativo, desde as lições de direito comunitário do Professor João Mota Campos, à tese de doutoramento de Luís Sá sobre “A Crise das Fronteiras. Estado, Administração Pública e União Europeia”, de que fui o orientador. Mas como alguns agentes de certa mentalidade bismarckiana podem pensar que estamos a falar de glórias passadas, aconselho-os a espreitar para as recentes dissertações de doutoramento de Carla Costa, sobre economia europeia, ou de Raquel Patrício, sobre política internacional das relações em eixo, num esforço comparativo entre o diálogo franco-alemão e as relações argentino-brasileiras, aliás, em termos cronologicamente absolutos, a primeira tese em relações internacionais na Universidade de Brasília.

 

A estreita e preconceituosa base de dados de certa mentalidade juridiceira e historicista, que ocupa os preconceitos dos nossos europeísmo oficioso, pouca dada a reparar em matérias de economia, politologia ou internacionalismo, ainda consideradas como uma espécie de ciências ocultas, também ganharia em mais humildade se pudesse espreitar trabalhos publicados, como os de Maria João Militão Ferreira, sobre “A Política Externa Europeia”, ou de Andreia Mendes Soares, sobre “União Europeia: que modelo político?”.

 

Por mim, julgo que há alguma gente universitária com menos de trinta anos que pode ter alguma coisa a dizer a esta geração de grisalhos oligarcas que ocupou os interstícios de certa encruzilhada, onde só são europeístas os que alinham com o “sinzismo” de certa propaganda eurocrata ou que está nas boas graças dos decretinos serviçais nomeados por razões políticas. Desses que são ilustres académicos porque foram, ou são, ministros e directores-gerais, e ilustres políticos porque têm um titulozinho académico, para, depois, fomentarem o conúbio das chamadas escolas de regime, onde se aliam os dignitários dos antigos e dos novos regimes, na habitual confusão de narizes da decadência.

 

E se pensarem que a Europa também vai além das viagens rápidas entre Lisboa e Bruxelas, seria conveniente repararem em livros comos os de Helena Cristina Rego, sobre “A Nova Rússia” e de Marcos Farias Ferreira, sobre os havelianos. Infelizmente, nenhum destes faz parte do habitual sindicato das citações mútuas e das fábricas de cogumelos intelectuais e do pronto a vestir das chouriçadas coloquiantes. Com efeito, o rolo compressor do novo império colonial está a caminho e há imensos candidatos a colonizadores com o carimbo de modernizadores e reformadores. Por favor, onde fica o exílio!

 

 

 

Se continuarmos neste processo suicidário, poderá acontecer lermos, amanhã, o que hoje foi publicado por um antigo ministro dos estrangeiros: quando saí do Governo…decidi ser consultor em diversos grupos portugueses e estrangeiros… e fui convidado…por uma pessoa ilustre… a quem entreguei uma condecoração. Misturando agora estas confissões do “Correio da Manhã”, de hoje, com os conselhos provenientes de um nosso ex-comissário em Bruxelas, surgidas no “Diário de Notícias”, também de hoje, onde o nosso mais politicamente correcto denuncia um pretenso politicamente correcto, pode ler-se que outra experiência vivida por outro ministro dos Negócios Estrangeiros deve, pois, ser cuidadosamente meditada por todos os responsáveis políticos. Para que cada vez que tiverem um impulso de sinceridade …calem o que lhes vai na alma, retomando prontamente o que os franceses chamam “langue de bois”, a linguagem de quem fala mas não diz nada! A escola que impõe regras é, pois, a do “politicamente correcto”, da política asséptica, previsível e desprovida de qualquer dimensão anímica ou toque de ordem pessoal!

 

 

 

Foi pena que o ex-ministro Manuel Maria Carrilho não tenha seguido os conselhos de António Vitorino e só a posteriori tenha vindo denunciar o sistema de certa democratura, com as respectivas espirais de teoria da conspiração, onde entram agências de comunicação, comentadores políticos e negociantes da construção civil, bem como os engenheiros da fabricação de imagem no âmbito da teledemocracia. O único comentário que merece tal grito de alma do narcísico professor é que quem anda à chuva molha-se… se não usar o chapéu de chuva da consultadoria.

Mai 11

“Não é vergonha ser fraco, mas o é não querer ser forte”, onde se fala de Chirac, escravos e hierarquia das potências

No dia em que se recorda o nascimento de Salvador Dáli (1904), o tal que se dizia anarquista, mas monárquico, e a morte de Afonso Costa (1937), que nunca foi anarquista e sempre detestou os monárquicos, apetece lembrar que ontem o presidente francês decidiu comemorar a abolição da escravatura, visando colocar a França na senda da vanguarda humanista. Por isso, como português, tenho de recordar os anos de 1857 e 1858, quando tínhamos um governo de esquerda e um rei assumidamente liberal e ousámos apreender uma barca frances, Charles et George, que negreiramente ofendia as leis universais e nacionais de abolição do tráfico de escravos. Só que Paris, também muito civilizadamente, preferia praticar o princípio da hierarquia das potências, decidindo humilhar-nos, através de um ultimato que precedeu o ultimato britânico de 1890.

 

 

 

A palavra escravo vem do latim medieval sclavus, que talvez tenha tido como intermediária a expressão francesa esclave, de slav, os prisioneiros eslavos reduzidos à servidão pelos povos germânicos. Tal deve ter derivado dos povos germânicos terem sclavi que eram sclavini, isto é, escravos da Esclavónia. Em Portugal só no século XV é que começa a usar-se a expressão escravo, predominando até então o termo cativo.

 

 

 

Quanto ao processo de abolição da escravatura em Portugal, saliente-se que em 10 de Dezembro de 1836 era proibida a importação e exportação de escravos nos territórios portugueses a Sul do Equador, excepto para os proprietários de escravos de Angola que também tivessem propriedades no Brasil. No entanto, no Reino Unido, eis que em Agosto de 1839, Palmerston apresentou um bill para a supressão do tráfico da escravatura, que foi aprovado nos Comuns, mas rejeitado na Câmara dos Lordes, por oposição de Wellington, para quem se Portugal se sujeitasse à legislação britânica deixaria de ser uma nação independente.

 

Nesse bill de Palmerston, os navios britânicos passam a ter o direito de visitar qualquer navio português suspeito de transportar escravos, enquanto os capitães portugueses seriam julgados em tribunais britânicos, com a carga susceptível de ser perdida a favor da Coroa britânica. Sabrosa, em 26 de Fevereiro, em plena sessão do Senado chamara aos ingleses bêbados e devassos. O governo, considerado o último que se instituiu inteiramente com elementos do partido setembrista, pediu a demissão, depois de o governo britânico ter decidido controlar a navegação portuguesa ao sul do Equador, por causa do tráfico dos escravos.

 

No entanto, só em 14 de Dezembro de 1854 é que se emite um diploma consagrando a liberdade para os escravos pertencentes ao Estado. Em 24 de Julho de 1856, surge a liberdade para os filhos dos escravos nascidos no ultramar, depois de atingirem os 20 anos. Por decreto de 29 de Abril de 1858 é finalmente fixada a data de 29 de Abril de 1878 para a extinção da escravatura. Esta data-limite será antecipada pelo decreto de 23 de Fevereiro de 1869, dando-se assim a abolição completa da escravatura em todos os territórios sob administração portuguesa.

 

Mantêm-se no entanto alguns escravos numa situação de transição prevista durar até 1878, mas que é antecipada em 2 de Fevereiro de 1876, por iniciativa do então par do reino Sá da Bandeira. Refira-se que o tráfico de escravos foi formalmente proibido pelo Congresso de Viena de 1815. Mas nos Estados Unidos da América tal apenas acontece depois do fim da Guerra da Secessão (1862-1865), enquanto no Brasil foi proclamada em 1888, concretizando-se um pedido da Princesa Isabel ao seu pai, o Imperador D. Pedro II, visando comemorar-se o jubileu sacerdotal do papa Leão XIII.

 

 

 

Voltando ao Portugal de 1858, estávamos no ano da morte de Rodrigo da Fonseca e Henriques Nogueira que, na lápide funerária assumiu a defesa da ideia da federação política das Espanhas, Alexandre Herculano, que adquire uma quinta em Vale de Lobos, Santarém, onde se começará a instalar em 1866, recusa o lugar de deputado por Sintra, para que foi eleito, enquanto entram em Portugal as Filhas de Maria Imaculada, ou Filhas de Maria e a maçonaria lança a Associação Popular Promotora da Educação do Sexo Feminino (Outubro), onde se destaca D. António Alves Martins, com o apoio de Herculano, Passos Manuel, José Estêvão, Joaquim Filipe Soure e outros.

 

A barca, vinda de Moçambique, chega a Lisboa em 13 de Agosto. O ultimato francês para a entrega da barca é de 21 de Outubro. Mas, em 5 de Novembro é proferido o célebre discurso de José Estêvão sobre o apresamento. Porque Paris não concorda que o assunto seja submetido à arbitragem de uma terceira potência. D. Pedro V observa que não é vergonha ser fraco, mas o é não querer ser forte. José Estêvão diz que apanhámos a bofetada que a França quis dar à Inglaterra.

Mai 10

Quando Sophie Calle tinha treze anos de idade…

10 de Maio. Em 1966, o ministro da justiça de Salazar, Antunes Varela, faz a apresentação solene do projecto de novo Código Civil. Em 1981, em França, a eleição de Mitterrand e o consequente novo governo de Pierre Mauroy levam a uma esboço de inflexão da política europeia.

 

 

 

1966 é e era um ano muito especial, có dentro de nós. Estávamos no quadragésimo aniversário do 28 de Maio, no quinto ano da guerra colonial e a dois do fim da governação de Salazar, quando Mao desencadeava a chamada revolução cultural. Se simbolicamente se atinge o clímax a política das fachadas do Estado Novo, com Arantes e Oliveira a repetir o modelo de Duarte Pacheco, para que Salazar pudesse superar o fontismo, eis que o regime acaba por perpetuar-se no seio da sociedade civil, não pelos melhoramentos materiais, mas pela emissão do respectivo Código Civil, graças a uma geração jurídica que misturando a jurisprudência dos conceitos com a doutrina social da Igreja Católica, assume uma concepção social de direito e um ritmo pragmático de jurisprudência dos interesses, eliminando-se os vestígios individualistas do liberalismo e do krausismo da geração do Visconde de Seabra e daquele Código Civil liberdadeiro, então acusado de padecer de um excesso de originalidade.E sobre tal se diz que um vinho novo vai correr nos velhos tonéis que a ciência jurídica pôde armazenar ao longo de um século (Antunes Varela, sobre o novo Código Civil).

 

 

 

Já na França de 1981, os socialistas que, na campanha contra Giscard, haviam proclamado a Europa dos trabalhadores contra a do grande capital, bem como um espaço social europeu, chegam a reclamar contra a supranacionalidade, invocando a necessidade do regresso ao direito de veto. O próprio Mitterrand acusara o antecessor de praticar uma política importada da Alemanha e da circunstância do mesmo privilegiar o diálogo directo com Bona. Esta turbulência entre a França socialista e a RFA governada por uma coligação SPD-FDP, sob a presidência de Helmut Schmidt e com Gensher nos negócios estrangeiros, vai terminar logo em 1982, com a subida ao poder em Bona de Helmut Kohl e a instituição de uma coligação CDU/CSU-FDP.

 

 

 

Às vezes, a política é como a ficção que quer transformar a realidade em arte política. Por isso, cito o que ontem aprendi ao fim da tarde, em Kiekebenart, repetindo um texto de Freud, de 1908: cria-se a ficção quando se considera a realidade insuportável, ainda em memória viva do ano 1966, onde, para bom compeendedor, meias palavras bastam. Por isso gosto bem mais do efectivo criador, daquele que finge que é verdade aquilo em que na verdade crê, onde o fingimento é a própria realidade e onde a sobre-realidade é o anti-surrealismo, numa ficção feita com brutais pedaços de um quotidiano, onde, entre o vivido e o imaginado, há descrição verbal em palavras contidas que procuram ser o espelho dos dramas humanos do quotidiano.

 

 

 

E só quando temos a imagem da pessoa é que lhe conseguimos roubar a alma. Logo, dizemos que é racional quando, vencendo a emoção, tentamos não ter identidade, secando-nos por dentro, passando tudo o que temos para a obra que projectamos, de maneira a que dentro de nós fique aquele nada que é o outro. No fundo, quando pomos o nós dentro do eu e passamos a ser todos os outros, diluindo-nos na multidão das pessoas comuns.

 

Em 1966, há uma série de conferências comemorativas do 40º aniversário do 28 de Maio, com discurso de Kaúlza de Arriaga sobre a defesa nacional, onde critica abertamente o comportamento dos militares em Goa, em Dezembro de 1961 (15 de Outubro). Outros conferencistas são José Manuel Fragoso, Ester de Lemos, Daniel Barbosa (denuncia o condicionamento industrial), José Veiga Simão (sobre a investigação científica, antecipando a sua chamada ao governo de Salazar, Soares e Guterres), António Furtado dos Santos, Álvaro da Costa Pimpão, José Canto Moniz e Joaquim Trigo de Negreiros. Na Assembleia Nacional, discursam Baltazar Rebelo de Sousa, José Hermano Saraiva e Melo e Castro. A RTP, apesar de gravar, não transmite a coisa. Só o disc

Mai 09

Da “Operation Kaos” a Possenti…

O autor de La Buona Societá. Sulla Riconstruzione della Filosofia Politica, Milão, Vita e Pensiero, 1983, e de Le Societá Liberali al Bivio. Lineamenti di Filosofia della Societá, Génova, Marietti, 1991

 

Outras efemérides deste dia da Europa: em 1978 Aldo Moro aparece assassinado pelas Brigadas Vermelhas (um dos efeitos indirectos da “Operation Kaos” e de outras brincadeiras da Guerra Fria que também passaram pela criação de movimentos maoístas que eram contra os PCs sovietistas, aqui no Ocidente); em 1992, dissidentes do PCP criam a Plataforma de Esquerda que há-de dar alguns ministros a Guterres e Sócrates, desde os que são patrões actuais da Iberdrola aos que se dizem agora iberistas, talvez por não gostarem do patriotismo assumido pelo Miguel Urbano Rodrigues); instituída a GNR e criadas as Faculdades de Letras de Coimbra, em substituição da Faculdade de Teologia, e de Lisboa, em substituição da escola de D. Pedro V, o Curso Superior de Letras. Porque há mais mundo além dos eurocratas de tradução em calão.

 

Aliás, ontem e hoje, decorre na Universidade Católica uma conferência internacional de homenagem ao Professor Mário Emílio Bigotte Chorão, um dos grandes do nosso pensamento social-cristão e neotomista do pós-guerra, para onde se mobilizaram grandes nomes da Europa, como Vittorio Possenti e Miguel Ayuso, numa homenagem ao subsolo filosófico estruturante da nossa libertas. A semente continua a ser lançada, mas os registadores do quotidiano apenas qualificam como caravana os que fazem discursos que não mordem.

posted by JAM | 5/09/2006 11:27:00 AM

O dia da Europa visto por um europeu pouco europês, isto é, sem rebuços de revisionismo histórico estalinista

 

A fotografia que foi encenada no dia seguinte, como, entre nós, este ano, se comemorou o dia na véspera

 

O discurso de Schuman de 9 de Maio de 1950 obedeceu a um esquema de planeamento de operações de carácter quase militar. Em primeiro lugar, havia uma questão de agendas. Com efeito, para esse mesmo dia 9 de Maio, estava marcadas para a parte da manhã, reuniões dos conselhos de ministros em Paris e Bona. Para os dias 11 e 12 de Maio, em Londres, uma reunião dos ministros dos estrangeiros norte-americano, francês e britânico sobre a questão alemã. Para o dia 18, uma reunião do conselho ministerial da NATO.

 

Jean Monnet, com a colaboração de Pierre Uri, Étienne Hirsch e Paul Reuter, tinha elaborado um plano que no dia 1 de Maio era já aprovado por Robert Schuman.

 

 

O inspirateur, a quem De Gaulle chamava um grande patriota…norte-americano

 

No sábado, dia 6 de Maio, já o documento adquire forma definitiva. Tomam então conhecimento do mesmo os Ministros da Justiça, René Mayer, que há-de ser o sucessor de Monnet na Alta-Autoridade, e o Ministro do Ultramar, René Pleven.

 

Domingo, dia 7: o secretário-geral do ministério dos estrangeiros, Alexandre Parodi, é posto ao corrente do processo. Do mesmo modo, Dean Acheson, que fazia escala em Paris, é informado por Monnet do projecto em curso.

 

Segunda-feira, dia 8: parte para Bona um enviado especial de Schuman, Michlich.

 

 

O formal autor do discurso, com ar de meu avô, um francês da Lorena, membro da Europa vaticana

 

Terça-feira, dia 9: na parte da manhã reúnem os conselhos de ministros da França e da RFA. O chefe de gabinete de Adenauer, Blankehorn, interrompe o conselho e entrega a Adenauer as cartas de que era portador Michlich.

 

Já passava do meio-dia quando Clappier recebe comunicação de Bona com o assentimento de Adenauer ao projecto. É só então que Schuman desvenda o segredo aos restantes ministros.

 

 

Outro agente vaticano, o homem de Colónia, que então era o líder da Alemanha Ocidental, a segunda grande peça da bela engrenagem que nos deu paz

 

Os jornalistas são convocados para as 18 horas, para aquilo que deveria ser anunciado de maneira espectacular. Durante a tarde recebem-se os embaixadores dos países europeus

 

Um jornalista pergunta a Schuman:Então, é um salto no desconhecido? e este responde: É isso, um salto no desconhecido.

 

 

O terceiro grande contratante do tratado de paz, o chefe italiano, outro agente de Pio XII, também aliado de Washington

 

Nesse dia, o embaixador da França em Londres, René Massigli, é recebido no Foreign Office por Bevin. Attlee estava fora das ilhas britânicas, em férias.

 

No dia 10, reunia-se a conferência dos Três em Londres sobre a questão alemã. O partido liberal propõe a participação britânica. Os conservadores, através de um discurso de Anthony Eden, recomendam idêntica atitude. Mas a imprensa, do Times ao Daily Express, teme a palavra federação e receia pelo fim da independência britânica.

 

 

O chefe trabalhista britânico, que via a Mitteleuropa de fora e um pouco acima

 

No dia 11 de Maio, quinta-feira, aqueles que virão a ser os seis Estados Membros aprovavam o plano de Schuman e não é por acaso que nesse mesmo dia se instituia o partido de Adenauer, a União Cristã-Democrática.

 

O então Primeiro-Ministro britânico, o trabalhista Clement Attlee, faz um discurso nos Comuns onde saúda a reconciliação franco-alemã, mas deseja que se proceda a um exame aprofundado das implicações económicas.

 

 

O grande criador da coligação negativa que nos deu a CECA e ex-inspirador de alguns pais da Europa de hoje, quando ainda acreditava que o Ocidente cairia de pôdre e não contabilizava as divisões vaticanas

 

Nesse mesmo dia, Attlee tem uma resposta cuidadosa. Se felicita a iniciativa francesa, dado pôr fim a um conflito secular com a Alemanha, não deixa de referir que a mesma teria de ser objecto de uma reflexão cuidadosa.

 

Nos dias 14 e 19 de Maio, Monnet desloca-se a Londres, acompanhado por Hirsch e Uri. procurando convencer o governo britânico, principalmente através de Sir Plowden, o responsável pelo Plano.

 

 

Um dos que disse não ao 9 de Maio e acreditava no oui par le non de uma Europa que vai ser do Atlântico aos Urais e com nações

 

Em França, vários grupos se opõem ao projecto, de gaullistas (RPF) a comunistas. O próprio De Gaulle, em discurso proferido em Metz, no dia 19 de Maio de 1950, proclama expressamente on propose en méli-mélo de charbon et acier sans savoir où l’on va aller en invoquant un combinat quelconque.

 

A CGT fala no plano como um atentado à soberania nacional

 

O governo britânico toma posição formalmas a posição formal do governo de Sua Majestade, do dia 31, não é esperançosa: deseja participar nas negociações , mas sem se comprometer com os princípios da mesma.

 

Em 3 de Junho surgia um comunicado, emitido simultaneamente nas capitais dos seis, onde se proclama que tais governos decididos a prosseguir uma acção comum de paz, de solidariedade europeia e de progressos económicos e sociais, consideram como objectivo imediato a colocação em comum das produções de carvão e de aço e a instituição de uma Alta Autoridade nova cujas decisões ligarão a França, a Alemanha, a Bélgica, a Itália, o Luxembrugo, a Holanda e os países que a tal aderirem.

 

 

O pai tirano que mandava cá na gente, fundador da NATO, da OECE, da União Europeia de Pagamentos e da EFTA, outro membro de uma Europa Vaticana, mas do tempo de Dolfuss e da ideologia de Bento XV

 

Contudo, no dia 3 de Junho o Reino Unido recusa aderir à CECA. Queria continuar a privilegiar os laços que o ligavam aos USA e não queria abdicar do modelo da Commonwealth. Pela mesma altura, a direcção do Labour emite um documento onde expressamente rejeita qualquer espécie de autoridade suprancional. Aí pode ler-se aliás que estamos mais próximos da Austrália e da Nova Zelândia que da Europa pela língua, as origens, os costumes, as instituições, as concepções políticas e os interesses.

 

Depois, Mac Millan, algumas semanas depois, em pleno Conselho da Europa, tenta ainda propor uma forma de associação menos profunda e mais centrada sob o controlo do Conselho da Europa.

Não tarda que Attlee venha a criticar o carácter não democrático e irresponsável da Alta-Autoridade

 

Em 20 de Junho começavam no Quai d’Orsay as conferências dos seis, sob o impulso de Schuman e Monnet, visando instituir a comunidade do carvão e do aço. Conforme os europeístas de então, visava-se a criação de uma autoridade supranacional de competência limitada mas com poderes efectivos.

 

 

O verdadeiro inspirador do 9 de Maio, então mais preocupado com o anticomunismo e o rearmamento alemão, em tempos de Guerra da Coreia

 

A delegação francesa era presidida por Monnet e a alemã por Walter Hallstein. Monnet declara então: trata-se de levar a cabo uma obra comum, não de negociar vantagens, cada um deve procurar a sua vantagem na vantagem comum. Se discutimos enquanto entidades nacionais, os rancores de outrora reaparecerão; é somente na medida em que eliminarmos das nossas discussões o sentimento particularista que uma solução poderá ser encontrada.

 

Contudo, alguns dias depois, a 25 de Junho, iniciava-se a Guerra da Coreia, circunstância que vinha valorizar a posição alemã.

 

Em 7 de Julho os países beneficiários do Plano Marshall instituíam uma União Europeia de Pagamentos, que vai durar até 1959, constituindo um sistema de compensações multilaterais, a fim se substituir o sistema de compensações bilaterais de dívidas e créditos.

 

Os factos constam das Memórias de Jean Monnet e de qualquer história séria da Europa, tipo Fontaine, Gerbet e Massip. Não terão sido adequadamente lidas pelos europês oficial que ontem foi aos croquetes ao CCB, depois de prévio convite dos ex-eurocratas e ex-europarlamentocratas lusitanos, com emprego político em part-time e consultadoria como principal fonte de rendimento. Alguns destes ditos só conhecem os meandros da história da ascensão e queda de georgianos em Moscovo e de bibliotecários da Faculdade de Economia em Pequim.

Mai 08

Porque temos o nós dentro do eu, importa esquecer que também a solidão vive dentro de nós

Nunca gostei muito das decisões, votações ou revoluções dos pretensos homens sem sono. Prefiro os que se levantam cedo, pela madrugada, acordando ao som da passarada, para que um novo dia os lave das angústias. Vou à agenda das recordações e marcações e noto que daqui a pouco tenho a honra de participar numa homenagem que a Universidade Católica vai prestar a Mário Bigotte-Chorão. Mas ainda tenho tempo para reparar que hoje se celebra a morte de Sebastião José de Carvalho e Melo (1782), no mesmo dia da capitulação da Alemanha nazi (1945).

 

E que ontem nem tive tempo para assinalar que Lisboa e o Vaticano subscreveram a Concordata que ainda nos rege (1940). Ou que os franceses foram derrotados em Dien Bien Phu (1954). Porque se, em 7 de Maio de 1829, o terrorismo de Estado miguelista enchia as mãos de sangue, executando opositores, já em 6 de Maio de 1834, eram os próprios miguelistas caçados pelos novos vencedores da vindicta, sendo encontrado morto numa palhota esse grande intelectual e político chamado José Acúrsio das Neves.

 

Sempre esta espiral da violência física, acicatada pelas falsas ideias, sobretudo para quem tem memória e reconhece a pequenez de, muito individualmente, repetir erros de sempre, entre fantasmas e preconceitos. Logo, apenas tenho a obrigação de, aqui e agora, me pensar, pensando nos outros que somos nós, porque temos o nós dentro do eu e nada de novo debaixo do sol.

 

Continuamos a não fazer aos outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem. Continuamos a temer a comunidade das coisas que se amam. Continuamos este vazio de não sentirmos o próximo como precisamos que o outro nos sinta e compreenda. E espiralamos em dúvidas, descrenças e algumas violências. Por mim, hoje, não atiro mais nenhuma pedrada. Debato-me em silêncio e em revolta, contra quem sou, temendo a cobardia de fugir, sem olhar o sol de frente.

 

Vou à minha arca dos poemas por fazer e reparo que as páginas estão há muito tempo em branco, apesar de as escrever todos os dias. E tento sulcar livre em meu destino, mesmo que seja contra meus medos. E assim me continuo nesta procura de estar vivo, de sentir que posso ser mais se me perdoarem.

 

Apetece voltar a ser alma errante de nómada que gosta de parar e percorrer a prometida viagem que o mar das trevas sempre sulcou. Mesmo quando há vozes que se não ouvem ou não lembrança dos sinais que, rasgando a carne, nos marcaram.

 

Porque basta um gesto, um sorriso, para se encher uma página de azul e esquecer, por momentos, a solidão que vive dentro de nós.