Acordo bem de madrugada em dia de eleição presidencial, não pela angústia da escolha, mas porque me apeteceu sentir raiar a aurora em pensamento. Reparo nas efemérides de ontem, dia de, no ano de 1808, ter chegado ao Brasil o que era a cúpula do Estado lusitano, na precisa data em que morre Lenine (1924), Orwell (1950) e o estadão salazarista (1961), quando Galvão assaltou o paquete “Santa Maria”, coisas que, se fossem devidamente reflectidas poderiam agitar em demasia um dia dito de reflexão.
Hoje, outras são as coisas que apetece recordar. Porque em 1915 houve o Movimento das Espadas que abalou o processo de ocupação da Primeira República pelo afonsismo e pela “formiga branca”, pois o presidente Arriaga, eleito pelo “bloco” de almeidistas e camachistas, teve a ousadia do intervencionismo, através do lançamento de um governo de iniciativa presidencial, chefiado pelo velho general Pimenta de Castro, republicaníssimo, numa iniciativa que vai falhar e ser derrubada pelo golpe afonsista de 15 de Maio. Assim quatro anos depois, no mesmo dia 22, perante os dramas do pós-sidonismo, há uma revolta monárquica em Lisboa e que instala a bandeira azul e branca e Monsanto, durante quatro dias apenas, enquanto dura a Traulitânia no Norte. Já em 1975, refira-se o célebre primeiro congresso no Porto, que vai ser gloriosamente boicotado pelo PREC, ameaçando destruir a hipótese de pluralismo em Portugal, depois de já terem sido estadualmente extintos o Partido do Progresso, de José Miguel Júdice, e o Partido Democrata-Cristão, do ex-ministro spinolista, Sanches Osório.
Também eu sinto que, a partir de amanhã, vamos passar a viver um dos últimos momentos de um certo ciclo do nosso regime político e que, mesmo sem o assassinato de Sidónio, se poderá assemelhar à nova república velha da era pós-sidonista. Porque não percebemos que efectivamente manda, dado que até traduzimos a expressão britânica de “rule” por “governo”, não reparando que mesmo no espaço capitalizado por Londres, num recente inquérito, se diz que tanto Barroso como Murdoch mandam mais do que Blair. Por cá, considerados que somos pelo último inquérito do Eurobarómetro como os mais desmoralizados da Europa, tanto não nos vale o Barroso como o Mourinho, apesar de recentes investigações genéticas demonstrarem que o primeiro europeu ocidental dever ser português, certamente da estirpe saloia ou alentejana. É por isso que já se começam a notar grandes filas diante das máquinas registadoras do euromilhões, porque para a semana o “jackpot” atingirá os 146 milhões de euros, enquanto o frio ártico nos continua a invadir a partir da Rússia e a gripe das aves a ameaçar-nos, a partir da Turquia.