Há uma semana que estou nesta imaginada casa branca de telha portuguesa, neste sítio onde há pedaços de sombra, num pátio interior, bem algarvio, ousando esquecer estes restos de quem sou. Aqui, neste lugar de calma, há um largo da praça, um azul solar, um devagar, e sempre uma folha branca por onde peregrinar, especialmente quando a manhã vai nascendo e apetece o aconchego de uma árvore ainda verde, em pleno Agosto, para mais um dia de pedra calcinada. Aqui sou, mais uma vez, à espera que novo dia me desperte, neste ritual de estar sentado a escrever-me, aqui estou, à minha espera, viajando pelas memórias que me desperta a gente que passa no largo da praça. Tento cumprir a missão de todos os dias me pensar, de todos os dias me escrever, mesmo quando não o comunico aos irmãos leitores destes postais. Deixo que a fluidez lírica que me impregne, que este ambiente aquífero e arenosos das dunas e sapais estimulem a minha própria procura, feita de quotidianos exercícios espirituais e de certa “ratio studiorum” que nem por isso me fazem guerrilheiro da palavra, ao serviço de um qualquer colectivismo moral. Até porque as escamas de sal e de sonho que trago no corpo vieram da realidade destas águas atlânticas voltadas para África, deste novo Mediterrâneo da história, deste mar cuja linha de horizonte vai de Leste para Oeste. Continuo sereno e difuso, anotando quem sou e procurando captar o sonho que me leva à escrita, neste escrever por ter de escrever, sem saber o que vai acontecer na linha que começo a escrever. Porque escrever-me à toa é procurar captar o manancial de signos e sensações que todos os dias vou resguardando na arca dos poemas por fazer. Confesso que neste bloguear continuo a ser abstracto demais para os caçadores de parangonas, mesmo quando peregrino pelas politiqueirices que me cercam e as quais tento enfrentar com o mínimo analítico do lume da razão, e com alguma imaginação criativa, dita lume da profecia (Padre António Vieira)