Abr 07

As maravilhas jurídicas deste milénio

Tentando actualizar a minha “reaccionária” formação em leis, depois de verificar como as “auditorias jurídicas” existentes nos vários ministérios foram ultrapassadas pelo recurso à consultadoria deste oligopólio, também bastante influente a nível da partidocracia e do mundo dos grandes negócios, julgo que o Estado, para salvaguardar a excelência destes centros de decisão nacional, deveria dar um passo ainda mais ousado, concessionando todos os serviços da Procuradoria-Geral da República a estas entidades, ao mesmo tempo que as principais faculdades de direito também poderiam passar para a gestão das mesmas. Desta maneira, até se poderiam resolver os problemas de desemprego que afectam os jovens licenciados em direito, porque, em vez de 300 vezes três, poderíamos multiplicar por dez as novas oportunidades de excelência. Em seguida, seria talvez possível fazer uma grande operação de concentração dos três grandes e o Senhor Feliz aliar-se-ia finalmente ao Senhor Contente. E da advocacia passaríamos ao supremo estádio da gestão de interesses e, dos grupos de interesses, passaríamos à gestão da influência e, desta, ao grupo de pressão e, da pressão, ao estoiro, onde o público deixaria de ser o todo, o bem comum, o pleno, mas a parte em lugar da vontade geral, para a gargalhada nos inundasse em tráfego de barganhas. Confesso estar definitivamente ultrapassado pelas maravilhas jurídicas deste milénio, deseducado que fui por escolas jurídicas onde fui aluno e docente, nos já longínquos séculos das trevas, bem como pelo meu estágio de advocacia feito na antiquíssima Coimbra do meu querido e falecido patrono Manuel Fernandes de Oliveira, ainda marcado por outras deontologias. Por mim, preferia o regresso ao modelo das auditorias jurídicas e a entrega a funcionários públicos em regime de exclusividade das funções de “advogado do Estado”. Pelo menos, para que a mulher de César, além de séria, parecesse séria. Mas não passo de um nostálgico de certos princípios que parecem já pertencer a outras eras, embora esteja disponível para lutar pela actual constitucionalização dos mesmos, como apreendi de meus avós, campónios e analfabetos e, durante uns anos ensinei aos meus alunos de filosofia do direito na dita Clássica, antes de eu assistir a campanhas eleitorais para órgãos académicos noutras escolas, onde uma das listas até invoca o facto de ter a liderança de um advogado avençado que consegue descontos num dos escritórios dos avençados e pode pôr, de forma mais barata, as escolas concorrentes nas teias da conflitualidade jurídica dos pareceres e das consultas, com o nome de um grande, mas subscrito por um dos dessas lojas de trezentos… Ainda acredito que seja possível uma distinção entre o público e o privado e não advogo o “tertium genus” que, na economia, deu origem àqueles vícios das sociedades de economia mística, que são pela privatização quando a coisa está a dar lucro e pela publicização, quando o risco acaba por levar a prejuízos. Até rejeito que se mantenha o sistema de uma economia privada sem a concorrencialidade da economia de mercado. Aliás, exijo regras de concorrência que punam os abusos de posição dominante. E, muito liberalmente, considero que os princípios que defendo para economia devem estender-se aos próprios advogados, sociedades de advogados e multinacionais do direito.