Baptista-Bastos conseguiu dizer tudo o que era preciso no DN de hoje, ao descrever a oposição do perfil da pátria medular e cívica ao chamado pensmento único: ainda bem que o Governo esteve ausente nas homenagens a Miguel Torga. O Governo não tem nada a ver com Torga. E, se pouco tem a ver connosco, nada tem a ver com a cultura. O Governo desconhece que a cultura é um dos interesses da política e que a política é uma disciplina da cultura. Embora ajam em esferas diferentes. Um político inculto possui algo de deformado. E um homem culto que se diz indiferente à política revela amolgadelas de carácter: mente porque, em rigor, defende pareceres desonrados.
Já há alguns dias, do seu retiro de Constança, o mesmo resistente tinha proclamado ao JN: sou de uma esquerda rebelde, que contesta as coisas, que leu Marx, mas não recusa a Bíblia. Que se encontra no humanismo. Estamos a precisar de gostar uns dos outros.
Por mim, que não sou dessa esquerda, quando noto que certa direita entra no desespero da saudade salazarenta, sinto necessidade de encontrar companheirismo de valores patrióticos e cívicos em quem vem de outras tribos políticas, para que o que nos é comum não seja das esquerdas e das direitas ditas pós-ideológicas. Por tudo isto é que importa que Torga se torne num símbolo de mobilização nacional, para que a racionalidade finalística possa ser compensada por uma racionalidade axiológica, a que alguns chamam emoção.