Basta recordar que não foi por estupidez que Marcello Caetano e Ramiro Valadão deixaram crescer o Zip Zip, baseados que estavam nas técnicas de controlo social recebidas do modelo de Estado de Segurança Nacional, montado por Golbery do Couto e Silva em Brasília. Pensavam que com esta forma controlada de saída do vapor, não sairia a tampa da panela de pressão, coisa que conseguiram enquanto durou a percepção de um tempo de vacas gordas. Só que o choque petrolífero e as consequentes vacas magras fizeram com que o monstrengo do estadão de outrora caísse, não pelos pés de barro, mas pelas baionetas que o sustentavam. Por outras palavras, as canções de protesto serviram, sobretudo, no “day after”, como elemnto fundamental do discurso de justificação do poder, não tardando a perderem-se no exagero situacionista, desde o “força, força, companheiro Vasco” à própria passagem dos principais baladeiros para o golpismo frustrado do 25 de Novembro, onde Jaime Neves e Eanes, com o apoio de Vasco Lourenço e Melo Antunes, acabaram por derrubar um movimento que tinha como símbolo o principal e mais consequente dos baladeiros, Zeca Afonso. Por outras palavras, tudo depende das vacas magras que ontem foram mais uma vez anunciadas pelo relatório do Banco de Portugal. Infelizmente, as cigarras dominantes continuam a cançoneta do regresso ao 11 de Março do estadão nacionalizador, nessa nostalgia revolucionária que se começa a confundir com as saudades do mercantilismo Pombalista, só porque alguns banqueiros repetiram o modelo de Alves dos Reis e caíram nas malhas da mesma administração da justiça que se enreda nas volutas dilatórias que nos fazem ter saudades do Juiz da Beira de Gil Vicente. Voltando à dita música de intervenção e às canções de protesto, importa assinalar todos os sistemas políticos são das tais panelas de pressão onde, de vez em quando, pode saltar a tampa. Nas ditaduras podem gerar revoluções onde as canções, tanto as de protesto, como a “Grândola, Vila Morena”, como as do português suave, como o “E depois do adeus”, podem ser senhas para um golpe de Estado. Em democracia, há outros golpes de Estado, mas sem efusão de sangue, as das mudanças eleitorais… Os situacionismos não se reduzem apenas aos aparelhos clássicos do estadão, dado que precisam de aparelhos culturais e ideológicos. E os aparelhos de repressão, para aliviarem a pressão, podem deixar aos protestantes os aparelhos culturais, desde que ele fiquem pela utopia e não entrem na repressão. Resta saber se, aqui e agora, os aparelhos culturais vivem num situacionismo de protesto ou ao ritmo de certo pimba. E se algumas pretensas canções de protesto não querem ascender à categoria de hinos situacionistas, com leves operações de revisionismo, onde, em vez de bretões, se utilize o politicamente correcto dos canhões. Estamos num tempo, onde a própria figura de um Che Guevara passou a ser mediaticamente vendida pelas multinacionais de Hollywood e onde, entre nós, os protestantes baladeiros passaram para os programas escolares oficiais e já são nome de rua, caindo nas teias do sacristão que perdeu o sentido dos gestos. Até porque, algumas vezes, os pretextos para o protesto não passam de golpes de “marketing”. Não estranharia que, nas próximas campanhas eleitorais, os mais situacionistas dos partidos recrutassem os próprios cançoneteiros que contra eles protestaram. Não me refiro aos Xutos, evidentemente, que não precisam destes golpes publicitários, mas aos fabricantes do “agenda setting” que continuam a ler os velhos manuais dos três “efes” napolitanos, onde antes do “pão”, vinham as “festas”. E não foi por acaso que traduzimos em calão a coisa e lhe chamámos “fátima, futebol e fado”…
Abr
16