Já agora vou comunicar-vos um pequeno segredo

Há dias em que apetecia dizer aqui, para os amigos que são amigos, o que não posso dizer. Logo, digo tudo, não dizendo nada. Sou um homem do meio-dia e, nos dias de chuva e frio, já fora do tempo, apenas apetece revoltar-me contra a tenaz da meia-noite que nos impõe a ideologia e a regra de ouro. Apenas apetece revolta. E vou manifestar-me na rua. Preciso de ler urgentemente um livro que aqui não tenho e de comprar um periódico da estranja que não há no quiosque da esquina.

Já agora vou comunicar-vos um pequeno segredo: quando tenho muita vontade de fazer uma manifestação em certos sítios inconvenientes, levo um pequeno pedaço de lápis e deixo um microscópico risco com um símbolo muito meu, de eterno adolescente, quase invisível, nos sítios mais solenes, mas nas paredes mais escondidas, seja numa casa de amores, seja num gabinete de estadão. E quando volto, às vezes, muitos anos depois, confiro a marca e a vontade da esperança. Há muito que os não faço, mas já fui buscar a afiadeira e o pedacinho de Viarco. Só outra pessoa pode saber o significado do risco.

Consegui. Os textos em papel que procurava. Para invejar esse escrever-se de quem consegue simplificar a alegoria de transviver. Cada palavra me trespassa e me translaça, nessa magia de friccionar a própria verdade. Vou continuar a ler quem somos, todo o santo dia.

 

 

Comments are closed.