José Adelino Maltez
“Ferreira Leite fica feliz quando lhe chamam Cavaquista”
“O artigo do Passos Coelho é para marcar a agenda, tanto podia pedir uma maioria absoluta ao PSD, como podia pedir que Ferreira Leite descobrisse a Índia. Ela ainda nem assegurou a maioria relativa quanto mais a maioria absoluta. Isso é um bom jogo dialético para continuarmos a falar dele. Não acho que uma maioria absoluta libertasse Ferreira Leite do peso do Cavaquismo. Em primeiro lugar, parece que a coitada da dr. Manuela Ferreira Leite tem o Cavaquismo a persegui-la, quando foi ela que inventou o cavaquismo sem Cavaco – até lhe interessa. As razões dos eventuais êxitos que Ferreira Leite possa ter é precisamente porque ela se assume com um cavaquismo sem cavaco. Há, pelo contrário, uma colagem dela à imagem de Cavaco. Cavaco tem uma indiscutível confiança popular como se manifesta em todas as sondagens muito mais do que ela, não sei se o dobro se o triplo. Tudo o que seja insinuação subliminar como está patente em todos os discursos de Ferreira Leite é bom para ela. Tudo o que seja um ataque a chamar-lhe cavaquista ela fica feliz. Quem sai prejudicado no meio disto tudo é o dr. Cavaco porque fica com um espaço (reduzido) onde pode ser atacado por ver o seu nome envolvido na discussão político partidária. O artigo do Passos Coelho é uma provocação ao sistema que não é aleatória, porque aquele artigo é aquele que não se estava à espera e é aquela que mais atrapalha. Não é um artigo de impulso é um artigo político de provocação ao sistema.”
Daily Archives: 4 de Setembro de 2009
Quem semeia ventos lá vai colhendo as tempestades…
Dizem que o irmão do Primeiro-Ministro comanda uma rede de jornais e que, perante a campanha negra que, ao mano-chefe lançaram os oposicionistas, o mano-subchefe se pôs e vigilância, armazenando papéis de campanha negra contra os outros, para espetar a farpa na altura certa aos sucessivos adversários, também especialistas nas sombras da vida privada do comandador. A meio do campeonato, as cadeias de jornais e televisões da Igreja, directamente dependentes de um bispo delegado da Conferência Episcopal, entrou no combate, denunciando a falta de moralidade do chefe do governo, com editoriais de moralismo catolaico bem emocionante. A resposta foi bombástica: apanhou-se o laico director de jornais e televisões, o tal moralista de sacristia, num caso de tribunal que mete assédios e homossexualidade. O editorialista em causa demitiu-se. Os bispos lavaram as mãos como Pilatos, defendendo o demitido.
Esta onda ainda não chegou a Portugal, com todos os seus contornos de Sade. O português suave apenas apanhou Manuela Moura Guedes. E ontem logo o comentei para o DN de hoje: Mesmo quem não seja um fã de M. M. Guedes e da restrita companhia da tribo “independente” que Moniz elevou a grandes educadores do nosso proletariado intelectual não deve hesitar: a liberdade exige plenitude de acção a propagandistas da situação e da oposição! Quando a entidade capitalista se desculpa com ordens vindas da patroa espanhola, mais se lamentam as anteriores palavras usadas pos Sócrates sobre a “campanha negra”, não sendo possível justificar o corte de pio com casos anteriores, como a cena dos santanistas com Marcelo Rebelo de Sousa.
Não há evidentemente censura, mas liberdade do mercado, neste socialismo a retalho, que é interventor nos dias pares e licencioso nos dias ímpares, conforme os heterónimos convenientes dos donos do poder. Mas Sócrates, a partir de agora, deixa de ter debates, passa a ser o bombo da festa, a não ser que tenha a hipocrisia de mandar um porta-voz defender a liberdade de expressão da M. M. Guedes, para se assumir como bode expiatório. Julgo que alguns, mais papistas do que o papão, continuam a fazer golos na própria baliza, pensando que ter o poder é ter a palavra. Talvez acabem por comunicar ao país que a peça sobre o Freeport será emitida pelos tempos de antena do PS. De outra maneira, darão razão a todos os que acham que esse elemento é o calcanhar de Aquiles do ministerialismo. Por mim, gostava mais que não “desviassem a atenção” da política, nesta campanha eleitoral!
Em conlusão, a campanha tem imensas minas e armadilhas, onde chafurdam os habituais artistas das campanhas negras, não faltando o vício da espionite. Só que, de tanta autogestão de consultores e espiões, entrou-se naquilo que em estratégia se chama “out of control”, e talvez em “point of non return”. Até Louçã e Jerónimo aparecem como carneiros do pluralismo, fazendo parecer que Sócrates, Manela e Portas são animias ferozes. Por outras palavras, precisavam todos de mudar o guião e até os actores, limpando profundamente os bastidores.
A televisão em causa foi formatada por D. José Policarpo, com Roberto Carneiro e Zé Ribeiro e Castro, antes de passarem o testemunho a Carlos Monjardino, e antes da chegada de Moniz. Os espanhóis, que a compraram, não querem velinhas a este ou àquele partido, querem “share”, mas sem que conspirem contra a igreja estabelecida ou os donos do poder. Ouviram falar nos saneamentos que José Saramago, ao serviço do PCP, fez no velho Diário de Notícias, mas hoje não o reconhecem como tal. Sabem as técnicas que o PSD teve para com Marcelo. E até entendem os meandros negociais do cardeal com a comissão que afastou do canal o Daniel Proença de Carvalho, onde o dialógo da Santa Madre e da maçonaria não era pecado grave, embora houvesse risco de excomunhões, pelas duplas pertenças, de acordo com o cânon 2335 do Codex de 1917, aggiornato pelo 1374 de 1983.
O episódio da outra Manela, a que já foi deputada do Manel Monteiro, é apenas sintoma da decadência, não é causa de nada, porque eram interessantes os debates que nos traziam os ilustres colegas de trabalho do marido de Constança, como o presidente e os seus colaboradores num dos mais importantes institutos estatais de investigação universitária, com um a educar a direita, outro, o centro do cavaquismo, e o terceiro, com saudades do seu velho colaborador-tarefeiro, Paulo Portas, quando era um bom aprendiz de académico. Pelo menos, mostravam como pensa o capitaleirismo sobre o resto do país, que é etimologicamente província, isto é, terra a conquistar.
O Sócrates tinha que ser o “gajo” a denunciar, por não ser suficientemente “radical chic” para continuar “feitor dos ricos”. Desenhou casas muito feias, obteve a licenciatura numa privada, que acabou encerrada pelo Gago, e tem uns tios e primos de susto. Entre bons pastores e péssimos criados, a burguesia fidalgota, não perdoa, sobretudo quando não esquece as tácticas maoístas e trotskistas, segundo as quais um bom revolucionário nunca pode ser um humanista. Importam mais as técnicas de cortar na viracasaca das intrigas da sociedade de corte, com os seus adesivos.
É evidente que o feitiço volta-se sempre contra o feiticeiro. Sócrates apanhou em cheio as tempestades que desencadeou, especialmente quando pôs a pata na poça ao não assumir, com toda a clareza, a sua atribulada vida académica. Ele, como doutorado em vida política, não precisava dos pergaminhos da licenciatura ou do doutoramento e devia ter-nos declarado isso mesmo, olhos nos olhos, denunciando a luta de invejas. Como devia mostrar tudo o que sabe sobre os meandros do Freeport, sem cair na esparrela da campanha negra, especialmente quando, no congresso do PS declarou que o povo é quem mais ordena. Sofreu agora a tempestade que desencadeou.
Santos Silva e ele próprio, Sócrates, estiveram bem, ontem, no tempo e no tom da resposta. Mas a memória do malhador e das trapalhadas não limitaram suficientemente os estragos. Apenas espero que não surja a espiral da contra-resposta com outros elementos ainda ocultos, mas que os campanheiros guardam para as contra-ofensivas. Porque tudo foi desencadeado pela conversa de alguém da casa civil da presidência sobre os arcanos do relacionamento entre os principais órgãos de soberania. Não acrescentemos à tragédia, o ritmo da comédia e da ópera bufa. Ainda não estamos em ritmo de Berluscolini e de Boffo.