Os ilustres contribuintes, os senhores votantes, os dignos cidadãos e os meus queridos leitores que, depois de tantas abstracções qualitativas, não passam de pessoas concretas, de carne, sangue, sonho e osso, que vivem o instante do tempo que passa, ainda não assumiram que quem manda em nós não é o PS, nem foi o PSD com o CDS, mas um tal Senhor Ninguém que vive em união de facto com a Dona Incompetência, permitindo que a Ti Culpa acabe por morrer solteira. Ambos os parceiros da concubinagem reinante foram educados na arte de se escreverem ofícios segundo o manual dos inquisidores, a tal que se transformou no livro de estilo dos modernizadores administrativos, esse misto de teólogos arrependidos com a sacanagem dos jotas que eles elevaram a assessores. Todos acabam de vos enganar com a habitual notícia de Setembro sobre as candidaturas ao dito ensino superior da bolonhesa, coisa que resultou desta pesada herança da Manela, ministra do sector, antecedida pelo Couto dos Santos e pelo Deus Pinheiro, seus renovados candidatos da verdade, e cujo resultado acabou por ser a mais recente versão do Roberto Carneiro que é a soma de Gago com Maria de Lurdes.
Os incautos, diante de uma lista de cerca de um milhar de cursilhos de pretenso acesso a uma ilusão de emprego, a que o Estado se comprometeria a dar um posto de vencimento, quando antigamente apenas saíam licenciados, isto é, com licença para continuarem a estudar por si mesmos, podem reparar que a mesma ditadura de perguntadores nos afunila para saídas políticas que nos obrigam a ter que escolher, como chefe do governo, o Sócrates ou a Manela, com os sacristães Jerónimo, Francisco e Paulo a darem bicadas na alternativa. O primeiro pretenso grande diz que é de esquerda e só leva porrada da esquerda. A outra, que é da não-esquerda, finge que segue a esquerda-menos ao ritmo da jardinada.
Não há meio de compreendermos que este caldo de cultura resulta de um erro de subsolos filosóficos, compreendendo-se como a nota de entrada num dos melhores cursos de filosofia no ensino público de Lisboa acabe por ser abaixo do velho dez. Porque foram estes donos do poder que não perceberam como deveriam educar para a mudança e nunca seguindo o catálogo de saídas profissionais inventado pela fantasia do positivismo tecnocrático dos construtivistas que já falharam todas as sucessivas grandes opções dos planos que engendraram. E porque não querem compreender o presente, vingam-se do passado e proíbem-nos o futuro.
Nunca deveríamos deixar que toda a nossa juventude ficasse dependente de um venerando reitor, de um profético ministro ou de um mais que douto conselho, desses que decretaram, com tanta mensurabilidade, o mercado de trabalho do próximo século, em total contraciclo, como se demonstra na presente crise global. Bolonha não tem culpa. O modelo até exigia uma urgente banda larga, em profundidade, na base, e qualquer país polido, civilizado e culto da Europa não caiu na nossa esparrela de pôr a oferta da empregomania a controlar o mercado das vocações. A única via que temos para curar a doença e voltar a ter luz está, como dizia Guerra Junqueiro, em incendiarmos os símbolos destes filhos de Veiga Simão e Roberto Carneiro.
As regras do jogo do ensino, incluindo do superior, estão totalmente viciadas pelos frustrados da educacionologia, da avaliologia e do planeamentismo. Os quadros publicados na madrugada de hoje são a melhor prova da nossa decadência humanista. O “big brother” dos tecnocratas falhados, que se apoderou da máquina decretina do ministerialismo, afastou-nos esquizofrenicamente da realidade do presente e do futuro emprego. Deixámos de ter os pés no chão e de olhar as estrelas do sonho, permitindo, em nome de uma manipulação da ilusão, que nos metam a pata na poça. A Dona Incompetência e o Senhor Ninguém já não tomam chá com a Ti Culpa. Já perceberam que o Sócrates e a Manela, a quem enredaram, já foram desta para os anjinhos. Eles passam, os educacionálogos, os avaliológos e os planeamanetistas ficam e mandam, para amanhã poderem despedir os mais competentes que resistem em liberdade e saudades de futuro. Não tarda que voltem os inquisidores, para continuarmos a ser jangada de pedra.