Farpas 12 de Janeiro de 2012

O Gmail ainda não fez o adequado registo de interesses.

O Zé Povinho, de 1875, também ainda não registou os respectivos interesses. À atenção da senhora ministra da justiça.

Prova de que ele apenas está adormecido.

O grande Raul, com um gesto que diz tudo. Ou o Zé Povinho em seu eterno.

Alguns aristocráticos da nossa praça, que por aí derramam os restos de sua soberba de “inteligentíssima”, são, quase todos, da mesma geração que circulou por idênticos quintais, visitou as mesmas fontes, tabernas e alfurjas e correu pela mesma estrada de Damasco. Conservam também quase todos o merecido êxito de confundirem a Nuvem com Juno, porque não podem falar de Mafoma nem do Toucinho. Por outras palavras, com outros nomes, eles próprios são a coisa nomeada da caça aos hereges, isto é, todos aqueles que a perspectiva do seu paroquiaríamos nunca conseguiu captar.

Certos aristocretinos que julgam deter o monopólio da casta, depois de abandonarem certo provincianismo, de esquerda e de direita, aquele com que confundiam o prazer das viagens à volta da parvónia da eurolândia, ei-los que, trocando os passos com os paços da sociedade de corte, registam ao atavismo da discriminação, do preconceito e do sãobentinho do atiça a bruxa e o supliciado, só porque têm a soberba de se considerarem anjos papudos de um certo situacionismo mental, o que já não consegue disfarçar a manutenção da intolerância, do fanatismo e da ignorância, agora contra outros cristãos novos e outras gentes ditas da nação que, grão a grão, poderemos ser todos, isto é, qualquer um de nós.

Há muitos desleixos de senectude que cargas de séculos depositaram nas cabecilhas tontas dos habituais aristocretinos da empregomania e da subsidiocracia. Basta ler qualquer manual da luta contra o racismo, a discriminação ou a lista de procedimentos das associações de apoio à vítima e à violência doméstica. O reaccionário de esquerda e de direita nunca souber o que era a tradição. É antiquado, mas não tem o privilégio de ser antigo.

Homem de um só parecer,
Dum só rosto, uma só fé,
Dantes quebrar que torcer,
Ele tudo pode ser,
Mas de corte homem não é.

Tudo seu remédio tem
E que assim bem o sabeis,
E ao remédio também;
Querei-los conhecer bem,
No fruto os conhecereis.
Obras, que palavras não:
Porém, senhor, somos muitos,
E entre tanta multidão
Tresmalham-se-vos os frutos,
Que não sabeis cujos são.
Um que por outro se vende,
Lança a pedra, e a mão esconde;
O dano longe se estende;
Aquele a quem dói e entende,
Com só suspiros responde.
A vida desaparece,
E entretanto geme e jaz
O que caiu: e acontece,
Que dum mal, que se lhe faz,
Outro mor se lhe recresce.
Pena e galardão igual
O mundo a direito tem,
A uma regra geral;
Que a pena se deve ao mal,
E o galardão ao bem.

Sempre foi, sempre há de ser,
Que onde uma só parte fala,
Que a outra haja de gemer:
Se um jogo a todos iguala,
As leis que devem fazer?
Pensamentos nunca cheios,
Não têm fundo aqueles sacos;
Inda mal, porque têm meios
Para viver dos mais fracos,
E dos suores alheios.
Que eu vejo nos povoados
Muitos dos salteadores,
Com nome e rosto de honrados?
Andar quentes e forrados
Das peles dos lavradores.
E, senhor, não me creiais
Se as não acham mais finas,
Que as de lobos cervais,
Que arminhos, que zebelinas,
Custam menos, cobrem mais.
Ah senhor! que vos direi
Que acode mais vento às velas;
Nunca se descuide o rei;
Que inda não é feita a lei,
Já lhe são feitas cautelas.
Então tristes das mulheres,
Tristes dos órfãos coitados,
E a pobreza dos misteres,
Quem nem falar são ousados
Diante os mores poderes.
Os quais quem os assim quer,
Quem os negocia assim,
Que fará quando os tiver?
Nossos houveram de ser;
Tomaram-nos para si.
Ora já que as consciências
O tempo as levou consigo,
Venhamos às penitências,
Senhor, se eu vira castigo
Boas são as residências.

Todos nós revolveremos,
Os que tanto não podemos,
E aqueles que podem mais.

Do vosso nome um grão rei
Neste reino lusitano,
Se pôs esta mesma lei,
Que diz o seu pelicano:
Pola lei, e pola grei.

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